COP do Povo: Agenda Regional pelo Clima. Ilustração em colagem de Fernanda Soares

 

por COP do Povo / Cúpula dos Povos
fotos Lucas da Silva Marinho

30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, a COP30, que este ano será sediada na capital do estado do Pará, Belém, tem gerado muitas polêmicas, e a principal delas é a garantia de participação democrática e representativa dos povos que vivem na Amazônia. Levantando esse questionamento, a cidade de Marabá, no sudeste do Pará, sediou o primeiro encontro Pré-COP com o intuito de articular formas de visibilizar as dificuldades de quem de fato sente na pele os efeitos da crise climática nos seus territórios dessa parte da Amazônia.

Organizado pela Cúpula dos Povos e a COP do Povo, o evento reuniu na última sexta e sábado (dias 16 e 17) representantes indígenas, quilombolas, ribeirinhos, agroextrativistas, camponeses, movimentos populares, organizações da sociedade civil e universidade.

O primeiro dia iniciou com a Plenária de Mulheres Amazônidas por Justiça Climática e em Defesa da Vida nos Territórios, um momento marcado por união, fortalecimento, amor e esperança, no qual as próprias mulheres se referenciam e se fortalecem enquanto sujeitas políticas dessa luta.

Já o sábado foi marcado por importantes reflexões e mobilizações durante a Ciranda dos Povos: Convergências de Lutas nas Fronteiras Amazônicas, seguida de uma apresentação da COP do Povo e da Cúpula dos Povos e uma Aula Pública que convidou o público a refletir sobre a urgência de Construir uma Visão de Mundo Comum, reafirmando que a luta por justiça climática passa pela união de saberes ancestrais e populares, em diálogo com os desafios globais.

À exemplo de diversas outras organizações pelo Brasil, os dois dias foram momentos de unificação da agenda climática na região, sistematizando como os diferentes territórios têm sido impactados e a partir disso construir uma agenda comum que envolve a temática da COP 30 para a região Sul e Sudeste do Pará.

Os movimentos sociais manifestam a preocupação de que resolver os problemas climáticos não terá centralidade nos objetivos dos líderes mundiais que estarão na COP30, pois “se fosse, eles estariam organizando escutas pelos territórios e garantindo nossa participação na COP30 com capacidade de incidência nas decisões. Mas não é o que está acontecendo”, destaca a agroextrativista Claudelice Santos, do Instituto Zé Claudio e Maria (IZM) e representante da COP do Povo.

A Conferência das Partes (COP 30)

A COP30 será palco para líderes políticos e também para os gigantes do mundo empresarial, o que tem gerado grande desconfiança sobre os acordos que sairão dessa Cúpula, que deve envolver, inclusive, os interesses das atividades com os maiores impactos ambientais. A mineração, a pecuária e agricultura de larga escala são exemplos disso e a região Sul/Sudeste do Pará se destaca justamente nessas áreas, com a produção de commodities, o que gera na região um grande passivo ambiental e regulares conflitos, responsáveis por colocar o Pará em primeiro lugar no ranking (1.171 casos) de violência contra defensoras de direitos ambientais e humanos entre 2019 e 2022, de acordo com as ONGs Terra de Direitos e Justiça Global.

Nesse contexto, Polliane Soares, dirigente estadual do MST, destaca: “A gente não pode esperar que os criadores da crise climática, que são os que mais lucram com ela, tragam solução para isso, sobre o que a ação deles acarreta sobre nós. A solução está em nós, no que temos construído de resistência nos nossos territórios na Amazônia, com a produção coletiva, sem agrotóxicos e degradação da natureza”. A camponesa ainda complementa: “A Cop não é pra nós, não é sobre nós e não trará nada de bom pra nós”.

Assim como a fala de Polliane, o evento foi marcado por manifestações de preocupação com os acordos que serão fechados na COP sem a participação popular, como também destaca Cledeneuza Maria Oliveira, coordenadora executiva do Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco (MIQCB) – Regional Pará:

“Eles falam de crédito de carbono sem fazer nada pela floresta. É a gente que faz. O projeto que será definito na COP deve aprofundar ainda mais nossos desafios, pois será um projeto definido sem nossa participação”, destaca.

A Cacica Yuna Tembé faz eco à tal percepção: “Somos nós, os povos que estão nos territórios, quem cuida da floresta, enfrentando na nossa permanência no território os impactos gerados pelos grandes empreendimentos: fumaça, agrotóxicos, menos chuva, seca dos rios, poluição das águas e do ar, os efeitos do desflorestamento”, afirma.

Jota Quilombola se deslocou do seu quilombo do Alto Acará para participar do evento e destacou que “os principais alvos da crise climática são as populações vulnerabilizadas, mais pobres, marginalizadas e, logo, é motivo de grande indignação não participarem das tomadas de decisão na Cúpula.”

Pablo Neri, dirigente nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e representante da Cúpula dos Povos, explica que a organização popular tem o desafio de construir espaços em todo o país para mobilizar a população como um todo sobre o que significa esse momento.

“Nossa organização é para reivindicar o comprometimento dessas lideranças do mundo todo para uma outra forma de produção e relação com a natureza: ecológica, popular e soberana em que os territórios e sujeitos estejam no centro do debate”, pontua.

A organização do evento em Marabá afirma que outros momentos como esse se repetirão na região Sul e Sudeste do Pará, e convocam a se unirem às discussões movimentos de base, movimentos de mulheres, movimentos sociais, universidade e demais organizações da sociedade civil para aprimoramento dessa Agenda Regional pelo Clima, de enfrentamento à crise climática no campo e na cidade.

“Aqui é onde nós vivenciamos a violação dos direitos humanos e da natureza na pele, e temos muito a dizer neste debate. Estamos nos organizando para que a nossa voz e a nossa denúncia façam parte desta resistência neste momento. Rumo à COP 30, mas também em uma posição crítica a esta COP”, acrescenta Pablo Neri.

Conheça os perfis das articulações

COP do Povo – O grupo é formado por líderes de territórios tradicionais, associações e movimentos sociais ligados aos povos da floresta, que se reuniram na capital paraense pela primeira vez em 30 de agosto de 2024. Além da defesa da participação das organizações na COP30, a articulação denuncia grandes empreendimentos e as ameaças enfrentadas por defensores socioambientais, luta por uma reforma agrária justa, pela titulação dos quilombos e pela demarcação das terras indígenas, mapeando os financiadores da COP30, vislumbrando a criação de um tribunal popular para julgar as empresas que estão destruindo a Amazônia, entendendo que não há justiça climática sem a proteção e a participação das comunidades que preservam os biomas. Confira a Carta Completa da COP do Povo.

Cúpula dos Povos Rumo à COP 30 – Desde 1992, a Cúpula dos Povos é um grito de resistência e justiça, um espaço autônomo onde as comunidades mais atingidas pela crise climática, como os povos indígenas, quilombolas, comunidades tradicionais e moradores das periferias urbanas, encontram força para ecoar suas vozes e demandas. Visando a mobilização destes movimentos e comunidades, a Articulação busca denunciar desigualdades e injustiças sociais aprofundadas com a crise climática, além de fazer frente às omissões do poder público e dos setores privados.