por Dom Vital Corbellini
Bispo da Diocese de Marabá

Os santos padres, os escritores do cristianismo primitivo tiveram presente a criação, percebida como dom do Deus criador, em conformidade com o seu poder grandioso de criar obras maravilhosas dadas à realidade humana, a partir do nada. Eles enalteceram as coisas bonitas saídas das mãos fabulosas do Senhor de modo que Deus é louvado por ter criado tão bem os seres sobretudo, o ser humano, percebido à sua imagem e semelhança (cf. Gn 1,2). Eles realçaram a ação plenamente livre do Deus Criador, a extensão universal desta ação divina, aludindo a admiração, a bondade e a harmonia de todo o universo, criado e conservado pelo único Deus[1]. Eles também colocaram a nova criação proveniente do Filho de Deus Redentor. Num momento em que nós percebemos muitas queimadas da natureza em diversos lugares no Brasil e no mundo, enchentes ocorridas, mudanças climáticas, guerras entre os povos, destruições, mortes, calor acima da média, falta de chuvas, ar seco, preservação da natureza, de rios e nascentes, é importante perceber como os santos padres deram atenção à natureza, e às criaturas de um modo geral e às humanas, como obras maravilhosas do Senhor e a necessidade de preservá-las em vista de sua continuidade e amor ao Senhor.

O louvor a Deus

São Cirilo de Jerusalém, bispo no século IV afirmou a importância do louvor que deve ser dado a Deus pelas criaturas feitas. “Não é talvez digno o Criador, de ser essencialmente louvado? Se talvez a pessoa não conheça a natureza de todas as coisas, talvez o que foi criado é sem sentido”[2]. O bispo também afirmou que é impossível uma criatura conhecer as propriedades de todas coisas, de modo que existe o Criador que conhece tudo, porque tudo proveio dele. Ele também afirmou a vitalidade das obras que rastejam na terra como no caso as cobras mais venenosas se extraem antídotos para a saúde das pessoas, caso estas forem picadas[3]. A pessoa é conduzida ao louvor do Criador que fez tão bem as coisas para que o ser humano as admirasse e as preservasse, recebidas pelo Senhor.

O Senhor criou as aves do céu

São Cirilo de Jerusalém também disse que Deus criou as aves do céu. Ele levantou uma pergunta no sentido de quem indague a natureza dos pássaros dos céus?! Como é possível que alguns modulem o seu canto, outros sejam ornados sobre suas asas de cores, outros ainda, vão juntos, permanecendo imóveis no meio do ar?. Assim para São Cirilo é impossível a pessoa permanecer indiferente à obra da criação, porque o Criador está na frente de todas as coisas [4].

A descrição dos mares

O bispo de Jerusalém teve presente a descrição do mar, grande e vasto, contendo inumeráveis animais que nadam nas águas profundas. Assim quem pode descrever a beleza dos peixes que estão presentes no mar? Além do mais quem elucidaria a profundidade e a vastidão do mar, o ímpeto das suas ondas imensuráveis? Ainda que as dimensões dos mares sejam grandiosas os seus limites foram fixados pelo Criador, pela sua palavra que disse: “Até aqui chegarás, e não além; aqui dominarás a arrogância de tuas ondas!”(Jó 38,11)[5].

O Pintor divino

Santo Ambrósio de Milão, bispo no século IV afirmou que a pessoa humana foi modelada pelo Senhor Deus, bom artista, criada à sua imagem e semelhança (cf. Gn 1,26)[6]. Desta forma não pode ser eliminada uma boa pintura que brilha pela verdade e foi feita com a graça. O bispo convidava os seus fieis a buscar a pintura que Deus fez com o ser humano, Daquele que o pintou e o formou, para fazer comunhão com Ele para que assim ele viva a graça de ser sua criatura[7].

A criação nova

São Clemente de Alexandria, leigo e padre da Igreja nos séculos II e III afirmou a criação nova a partir de Jesus Cristo. Enquanto a humanidade estava envolta nas trevas (cf. Mt 4,16), as pessoas fechadas num caminho de morte, surgiu uma luz mais pura que o sol, mais doce que a vida humana proveniente da realidade humana, dada pelo Pai em Jesus Cristo. Aquela luz é vida eterna, e tudo aquilo que é tocado por ela, vive. A noite do pecado é exterminada pela luz da vida, Jesus. Isto significou a criação nova (cf. Gl 6,15), porque o sol da justiça se fez presente na humanidade e sobre todos desceu o orvalho da verdade, proveniente do Verbo de Deus Pai encarnado[8].

O Deus Uno e Trino criou as coisas, os animais e os seres humanos. Tudo foi feito na maior harmonia e amor. O ser humano é convidado a preservar as coisas e a vida humana, sem guerras, sem conflitos, sem derrubadas das florestas, sem destruições mas ajudando a continuidade da vida pelos seres criados. O Senhor abençoe a todos os seres vegetais, animais e humanos.

[1] Cfr. B. Studer. Creazione. In: Nuovo Dizionario Patristico e di Antichità Cristiane, diretto da Angelo Di Berardino. Institutum Patriscum Augustinianum. Genova-Milano, Marietti, 2006, pg. 1254.

[2] Cfr. Ogni Giorno com i Padri della Chiesa, a cura di Giovanna della Croce. Presentazione di Enzo Bianchi. Milano, Paoline, 1996, pg. 213.

[3] Cfr. Idem, Catechesi prebattesimali 9,14, pg. 213.

[4] Cfr. Ibidem, 9,12, pg. 212

[5] Cfr. Ibidem, 9,11, pg. 211

[6] Cfr. Idem, Ambrogio di Milan., Esamerone 6,9,47, pg. 215.

[7] Cfr. Idem, pg. 215.

[8] Cfr. Idem. Clemente d´Alessandria, Protreptico 11,114, pg. 214.