por Dom Paulo Andreolli, SX
Bispo auxiliar de Belém
Caros leitores, estamos no 6º Domingo da Páscoa, e convido vocês a refletirem, nesta edição, sobre a virtude da fé, especialmente neste tempo pascal, em que a Ressurreição de Cristo nos convida a dar passos significativos para uma vida nova, configurada com as coisas do alto. E para me acompanhar nesta conversa semanal, conto com a contribuição da professora Sylvia Calandrini, licenciada em Letras e paroquiana da Paróquia Santa Luzia (Jurunas).
Vamos iniciar com um breve conto, provavelmente, de origem francesa. Conta-se que um carvoeiro, trabalhador humilde e sem estudos, ao ser questionado sobre sua fé, respondeu com convicção: “Se a Igreja ensina, eu creio”. Essa breve história apresenta um homem simples sendo posto à prova por um demônio em forma humana. O inimigo tentou, porém não conseguiu desviá-lo de sua crença na Igreja de Jesus Cristo.
À primeira vista, a resposta do homem simples pode soar ingênua e alienada, porém ela expressa uma confiança total. A chamada “fé do carvoeiro” não é ignorância, e sim adesão amorosa e profunda a Deus e àquilo que a Igreja ensina em Seu nome. E, conforme a primeira leitura dos Atos dos Apóstolos, na liturgia de hoje, não se trata de fardos a serem carregados, mas sim do que realmente é indispensável para a vivência da fé cristã: fundamentar-se no mandamento do Amor do Ressuscitado.
O Catecismo da Igreja Católica afirma: a fé é a virtude teologal pela qual cremos em Deus e em tudo o que Ele nos disse e revelou e que a santa Igreja nos propõe para acreditarmos, porque Ele é a própria verdade. Pela fé, “o homem entrega-se total e livremente a Deus”. E por isso, o crente procura conhecer e fazer a vontade de Deus. “O justo viverá pela fé” (Rm 1,17). A fé viva “atua pela caridade” (Gl 5,6).
O discípulo de Cristo, não somente deve guardar a fé e viver dela, como ainda professá-la, dar firme testemunho dela e propagá-la: “Todos devem estar dispostos a confessar Cristo diante dos homens e a segui-Lo no caminho da cruz, no meio das perseguições que nunca faltam à Igreja”. O serviço e testemunho da fé são requeridos para a salvação: “A todo aquele que me tiver reconhecido diante dos homens, também Eu o reconhecerei diante do meu Pai que está nos céus. Mas aquele que me tiver negado diante dos homens, também Eu o negarei diante do meu Pai que está nos céus” (Mt 10,32-33).
No Evangelho deste 6º Domingo da Páscoa (Jo 14,23-29), Jesus consola seus discípulos antes da Ascensão. Ele promete a presença do Espírito Santo e afirma: “Se alguém me ama, guardará a minha palavra, e o Pai o amará, e viremos a ele e nele faremos morada”. A fé, nesse contexto, é mais do que crer: é amar, guardar, confiar e abrir-se à presença viva de Deus.
A fé cristã é uma virtude teologal que une o intelecto e o coração. É dom de Deus, mas também resposta humana. Não se trata apenas de entender verdades, mas de confiar em Alguém: Jesus Cristo, o Ressuscitado. Durante o tempo pascal, a Igreja celebra com alegria o triunfo da vida sobre a morte. E é justamente a fé na ressurreição que sustenta o cristão nas noites da alma, nas dúvidas, perdas e provações.
A promessa do Espírito Santo, o Defensor, reforça a certeza de que Deus caminha conosco. O Espírito é quem ensina, recorda e fortalece. Ele não apenas ilumina a inteligência, mas também consola os corações, trazendo aquela paz que “o mundo não pode dar”. Jesus nos convida a não deixar que o coração se perturbe ou se intimide: é o convite à fé confiante e perseverante.
Estamos também concluindo o mês de maio, tempo mariano por excelência. Maria, mais do que ninguém, viveu a fé em sua plenitude. Ela acreditou antes de ver, aceitou a Palavra de Deus sem entender todos os desígnios, e permaneceu firme até os pés da cruz. Por isso, é modelo perfeito da fé e mestra na escuta. Com ela aprendemos que a fé verdadeira não precisa de todas as respostas, mas exige confiança no Amor que nunca falha.
A fé do carvoeiro e a fé de Maria têm algo em comum: ambas se fundamentam na entrega total. E é isso que nos torna verdadeiramente discípulos — quando, mesmo em meio às incertezas, permanecemos firmes na Palavra de Jesus, certos de que Ele habita em nós. Que Mãe da fé, interceda por nós!