por Dom Vital Corbellini
Bispo da Diocese de Marabá

A hospitalidade é uma atitude bíblica que coloca a presença de Deus na vida da pessoa que vem de longe ou de perto para a residência humana para pedir ajuda, consolo, uma palavra de esperança e de amor. No dia do juízo é bem presente a palavra de Jesus: “Eu era peregrino e me acolhestes em casa” ( Mt 25, 35). O Senhor Jesus se fará presente nas pessoas que nós acolhermos em nossas vidas. Diante de um mundo de tantas pessoas que se deslocam por causa das mudanças climáticas, guerras, perseguições, violência, é fundamental a acolhida, a hospitalidade das pessoas, dos pobres. Veremos a seguir como esta atitude esteve presente na regra beneditina, séculos V e VI e em São Leão Magno, papa no século V.

A presença de Jesus Cristo

A regra de São Bento recomendava a todos os seus seguidores que os hóspedes que se achegassem às suas casas, fossem acolhidos como Cristo Jesus porque Ele disse: “Fui hóspede e vós me tendes acolhido” (Mt 25,35). É a honra devida para ser dada, seja aos irmãos na fé, seja aos estrangeiros, peregrinos[1]. Ao anúncio de um hóspede, o superior e os irmãos iriam ao seu encontro com todas as considerações da caridade. Haja a oração em comum e depois haja o abraço da paz[2].

A humildade

São Bento em sua regra afirmava que na saudação, aos hóspedes, quando se aproximassem ou mesmo quando partissem da sua residência, fosse dada das pessoas que acolhessem os estrangeiros, a atitude de humildade pela presença do Senhor Jesus que foi acolhido[3]. Haja a leitura divina em vista da edificação da pessoa e se ofereça toda a atenção humana. Em seguida também se faça a limpeza das mãos e dos pés e todas as pessoas digam em voz alta que acolheram o Senhor Deus, na pessoa dos estrangeiros, a sua misericórdia em meio ao seu templo (cfr. Sl 47 (48), 10)[4].

A ajuda aos pobres

O Papa Leão Magno afirmou a atitude da compaixão com os pobres. Os fiéis sejam generosos na doação da comida para eles, aqueles que desejam fazer parte da comunidade dos bem-aventurados. O fato é que um ser humano não apareça desprezado por outra pessoa, que o Criador do universo fez como sua[5]. É impossível a pessoa recusar outra que sofre alguma coisa o que é de toda a pessoa, pois é o próprio Cristo Jesus que está sendo visto, doado. É ajudada uma pessoa de serviço e é o Senhor que é presente, dando-lhe graças[6].

O preço do Reino dos céus

O Papa Leão dizia que o alimento do pobre é o preço do Reino celeste e a pessoa que doa os bens terrenos torna-se herdeiro de bens celestes. A medida das obras é valorizada sobre a balança da caridade, porque quando o ser humano ama aquilo que Deus privilegia, sobe o ser humano no Reino dos céus; É dada a honra ao Senhor que se tornou próximo das pessoas e assumiu a nossa natureza (cfr. Jo 1,14). O bispo de Roma exortava para que os fieis trouxessem de casa bens, alimentos em vista das obras de misericórdia para merecer a bem-aventurança da qual gozará para a eternidade aquele que discerne o necessitado e o pobre (cfr. Sl 40,(41), 2. Desta forma é reconhecida no necessitado e no pobre a “Pessoa do Senhor nosso Jesus Cristo, o qual de rico que era, como disse São Paulo fez-se pobre, para enriquecer-nos com a sua pobreza” (2 Cor 8,9) [7].

A natureza humana é igual para todas as pessoas

Uma vez que Deus é o Criador do ser humano, São Leão Magno afirmou que a natureza humana é igual para todas as pessoas. Desta forma a nossa natureza mortal mutável é reconhecida em todo o ser humano e por motivo desta condição humana, cada pessoa é chamada a alimentar um sentimento de solidariedade em relação a todas as pessoas de sua espécie: chorar com as pessoas que choram, unir-se com aquelas que sofrem, ajudar aquelas necessitadas, ter presente os doentes que estão em seus leitos, prover alimentos com as pessoas famintas, doar roupas para aquelas pessoas que estão na nudez ou passam frio[8].

A misericórdia dada

O Papa São Leão exortava os fieis para que as coisas poupadas através do jejum tornar-se-iam alimento para os pobres numa reta intenção de misericórdia dada com amor aos mais necessitados. Os fiéis eram chamados a empenhar-se na defesa das viúvas, dos órfãos, dos sofredores, a fazer paz com aqueles que lutam, brigam entre si[9]. Desta forma acolha-se o estrangeiro, ajuda-se o oprimido, veste-se o nu, seja dada a atenção à pessoa doente, de modo que a oferenda de tais coisas dadas com amor a Deus, autor de todo o bem, seja concedida por graça divina a sua recompensa celeste[10].

O evangelho de Jesus Cristo era bem vivido na pessoa dos santos padres, no povo de Deus e hoje é dado para nós, em vista da conversão de vida que o Senhor Jesus tanto pede de cada um de nós. As pessoas pobres, necessitadas de ajuda estão presentes na vida de todos os seguidores, seguidoras de Jesus Cristo e de sua Igreja. Nós somos chamados a viver o mandamento do amor a Deus, ao próximo como a si mesmo, para um dia participar do Reino dos céus.

[1] Cfr. Regola di Benedetto 53,1-24. In: “Non dimenticate L´ospitalità”. Antologia dai Padri della Chiesa. Milano, Paoline, 2022, pg. 198.

[2] Cfr. Idem, pg 198.

[3] Cfr. Ibidem, pgs. 198-199.

[4] Cfr. Ibidem, pg. 199.

[5] Cfr. Discorso sulle collete 9, 2-3. In: Idem, pg. 207.

[6] Cfr. Ibidem, pg. 207.

[7] Cfr. Ibidem, Discorso sulle collette, 9, 2-3, pgs. 207-209.

[8] Cfr. Ibidem, 11,1-2, pg. 209.

[9] Cfr. Ibidem, Discorso sul digiuno del decimo mese 13, pg 211.

[10] Cfr. Ibidem, pg. 211.