por Dom Antonio de Assis Ribeiro
Bispo da Diocese de Macapá
A proclamação do Ano Santo 2025 nos estimula à reflexão sobre muitos e gravíssimos fenômenos humanos fortemente presentes na era contemporânea e que estão em profundo contraste com a dignidade e a vocação humana e cristã. Um desses fenômenos é a crise de Esperança. Essa realidade foi acusada pelo Papa Francisco na carta “Spes non confundit“, a bula de proclamação do Ano Jubilar. No mundo de hoje, “muitas vezes encontramos pessoas desanimadas que olham com ceticismo e pessimismo para o futuro como se nada lhes pudesse proporcionar felicidade. Que o Jubileu seja, para todos, ocasião de reanimar a esperança!” (N. 1). Também o Papa Bento XVI, na Encíclica “Spe Salve” (2007), refletiu sobre a crise da Esperança no cristianismo observando, como causas, diversos fenômenos: o progresso tecnicista, o racionalismo, a crise da fé, o ateísmo filosófico (cf. SS, 16-28, 42).
Em seu livro “Esperança sem otimismo”, o filósofo britânico Terry Eagleton, também se coloca nessa mesma perspectiva de Bento XVI ressaltando que uma esperança fundada nas previsões profissionais não gera alegria, nem otimismo. Essa esperança não é virtude, é expectativa! A autêntica esperança cristã não é previsão!
Certa vez conversando com um grupo de moradores de rua; ouvi muitas histórias, dramas, desgostos, frustrações; apesar de verbalizarem o desejo de sair da rua, não viam perspectivas de mudança e por isso, se acomodavam. Questionados sobre a família, emprego e possibilidade de serem acolhidos por alguma instituição filantrópica, as respostas foram semelhantes: a família está perdida, emprego não vale a pena e nas instituições há muitas exigências sendo melhor a liberdade da rua. Essa situação de desesperança, ausência de tensão para o futuro, também já encontrei em muitos ex-presidiários, dependentes químicos, desempregados. O ser humano é capaz de perder o exercício de sua subjetividade e, com ela, perde a capacidade de esperançar!
Estou citando situações extremas, todavia, esses sentimentos de fracasso, derrota, aniquilamento, ausência de perspectiva de futuro está presente também em muitas categorias de pessoas que vivem em outras situações e condições de vida completamente diferentes. A falta de Esperança nos leva ao “cinismo existencial”, ou seja, descrédito em tudo, levando-nos a experimentar o sentimento de ausência de inquietude que neutraliza a nossa capacidade de lutar.
O cinismo foi uma corrente filosófica grega da antiguidade (a.C). que pregava o total desprendimento dos bens terrenos, até dos prazeres. Os cínicos tinham como ideal de vida, viver como os cães, sem preocupações sendo capazes de se adaptar a qualquer realidade. De fato, a palavra cinismo vem do grego kynismós, que significa “como um cão”. Esse animal se adapta em qualquer situação e sempre feliz ao lado do seu dono!
Quem perdeu a esperança está em estado de autoabandono, sem preocupações para com o presente e nem sonhos para o futuro. Essa situação de quietude é consequência, em geral, de graves males como a fragilidade psicológica, o pessimismo, derrotismo, o niilismo como descrença no sentido da vida (pensamento negativo). Todo esse conjunto de males, frutos da crise da fé e da Esperança, tem contribuído para o aumento do índice de suicídio nas últimas décadas.
O Ano Jubilar é oportunidade para educar para a Esperança que gera nas pessoas senso de responsabilidade, luta, visão positiva da vida, transcendência, pensamento positivo, enfrentamento das adversidades com firmeza de ânimo; somos peregrinos e, por isso, a nossa Esperança é proativa, dinâmica, criativa. O cultivo da virtude da Esperança nos estimula a preservar a nossa mente de toda forma de bloqueio. O homem é, por sua natureza, um ser voltado para o futuro onde está a sua plenitude.