
por Vívian Marler / Assessora de Comunicação do Regional Norte 2 da CNBB
fotos Luiz Estumano / Fundação Nazaré
A Igreja Católica no Brasil, através da iniciativa “Igreja Rumo à COP30”, transformou-se em um corpo sinodal de discípulos missionários para a COP30, unindo vozes de quatro continentes em um apelo por ecologia integral e justiça climática, ecoando os ensinamentos do Papa Francisco sobre a crise ser uma “profunda ferida espiritual e moral”.
Durante o ‘Simpósio Internacional – Igreja Católica na COP 30’ no Colégio Santa Catarina de Sena, nesta quarta-feira (12/11). Após a coletiva de imprensa que contou com a participação dos cardeais Dom Jaime Spengler presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e Dom Leonardo Steiner, Arcebispo de Manaus e presidente da Comissão Episcopal para a Amazônia, apresentaram a agenda da Igreja Católica no Brasil para a conferência climática, enfatizando a importância da ecologia integral, a defesa dos direitos dos povos originários e a necessidade de uma conversão ecológica global.
Dom Leonardo destacou a centralidade da ecologia integral, conceito chave da encíclica Laudato Si’ do Papa Francisco, na atuação da Igreja. “A ecologia integral nos chama a cuidar tanto do meio ambiente quanto das pessoas, especialmente os mais vulneráveis”, afirmou o Arcebispo. Dom Jaime complementou, ressaltando a criação da nova Comissão de Ecologia Integral e Mineração da CNBB, que visa articular ações pastorais em defesa do meio ambiente e dos direitos das comunidades impactadas pela mineração.
Os cardeais também abordaram a importância de dar voz aos povos originários, cujas vidas e culturas estão diretamente ameaçadas pelas mudanças climáticas e pela exploração desenfreada dos recursos naturais. Dom Jaime enfatizou o papel do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) na defesa dos direitos indígenas e criticou as tentativas de restringir esses direitos, como a discussão sobre o Marco Temporal. “É fundamental que o Congresso Nacional ouça as vozes dos povos indígenas e respeite seus direitos constitucionais”, declarou o Presidente da CNBB.
Na abertura do Simpósio foi apresentado um vídeo institucional onde a articulação ‘Igreja Rumo à COP 30’, apresenta uma resposta a um chamado profético da CNBB à conversão e unidade em torno do cuidado com a Casa Comum, que se consolidou como um movimento sinodal envolvendo mais de cem instituições católicas em todo o Brasil, coordenado por diversas comissões episcopais e redes eclesiais. O propósito central, evidenciado no vídeo institucional foi o de garantir uma presença ativa e profética na conferência climática em Belém, traduzindo a fé em ação histórica. Esse processo vivo, que rejeita o colapso ambiental e exige justiça climática, ganhou corpo através das Pré-COPs realizadas nas cinco macrorregiões do país: a Norte, em Belém, focada na escuta amazônica; a Nordeste, em Juazeiro, que fortaleceu a agenda climática popular; a Sul, em Governador Celso Ramos, que debateu falsas soluções; a Leste, em Belo Horizonte, que celebrou a resistência contra o extrativismo; e a Centro-Oeste, em Bonito, que reafirmou a memória dos mártires da terra. O ciclo de mobilização, nutrido pela oração e pela memória dos defensores da vida, culminou no apelo unificado dos conselhos episcopais da África, Ásia, América Latina e Caribe, sinalizando um compromisso global da Igreja com a transformação ecológica.
O Diagnóstico do Sul Global: Exploração, Injustiça e Vulnerabilidade
Durante o primeiro momento para a acolhida do Simpósio Dom Julio Akamine, Arcebispo de Belém, recebeu para uma interação com o público presente, o Núncio Apostólico no Brasil, Dom Giambattista Diquattro, Cardeal Dom Jaime Spengler presidente da CNBB e presidente do Conselho Episcopal para América Latina e Caribe; o Arcebispo de Goa e Damão na Índia e presidente das Conferências Episcopais da Ásia, Cardeal Felipe Neri; Arcebispo de Quinxassa e presidente da Federação das Conferências Episcopais da África e Madagascar, o cardeal Fridolin Ambongo; o Arcebispo de Belgrado, na Sérvia e vice-presidente do Conselho das Conferências Episcopais da Europa, cardeal Ladislav Nemet; e o Arcebispo de Arcebispo de Agaña, Guam na Ilha Pacífica de Gan e presidente da Conferência Episcopal do Pacífico, Dom Ryan Jimenez.
As pré-COPs regionais no Brasil (Sul, Leste, Centro-Oeste) estabeleceram a base para uma agenda enraizada nos territórios. Contudo, a articulação se expandiu para um clamor global, evidenciando que a crise climática é inseparável das injustiças estruturais.
As vozes do Sul Global ecoaram, denunciando a intrínseca ligação entre a crise ambiental e a exploração econômica. Conferências episcopais da Ásia, África e América Latina criticaram um modelo que prioriza o lucro em detrimento do cuidado com a criação. A visão integral do Papa Francisco, que une a crise da natureza à crise humana, foi central para compreender como a injustiça contra a Terra se traduz em injustiça contra os mais vulneráveis.
A Voz do Vaticano em Belém: Crise Climática é ferida espiritual e moral
Em um discurso que ressoa profundamente com a urgência da COP 30, Dom Giambatista Diquattro relembrou a visão profética do Papa Francisco, enfatizando que a mudança climática transcende a técnica e a economia, configurando-se como uma “profunda ferida espiritual e moral” na consciência da humanidade. Citando a Laudato Si’, o Núncio sublinhou que a ecologia integral exige justiça, unindo o clamor da terra ao clamor dos pobres, pois a crise da natureza e a do ser humano são um “único drama” nascido da perda da fraternidade universal. A ecologia cristã, portanto, não é uma moda, mas um ato concreto de amor e justiça. Em sintonia com o alerta de Laudato Deum sobre o ponto de ruptura do planeta, Diquattro reforçou que a conversão ecológica implica renovar o olhar interior, reconhecendo o valor sacramental do ambiente. A proteção do meio ambiente é, assim, um gesto de justiça para com os mais frágeis, os quais sofrem mais intensamente a degradação. No contexto amazônico, a visão se completa: a Igreja, como sinal de humanidade reconciliada, deve viver essa vocação de cuidar de toda a Terra e de seus povos, transformando a fé em esperança concreta e a caridade em um novo modo de habitar o mundo.
Em suas exposições, os representantes da Igreja no mundo apresentaram suas experiências, como o perfil na África representada pelo Cardeal Fridolin Ambongo “A África é vista como um continente empobrecido e saqueado de suas riquezas (minerais estratégicos), funcionando como uma “mina de ouro aberta a todos os ladrões”. O sistema econômico atual causa a expansão de desertos e eventos climáticos extremos (inundações e secas), forçando a fuga da juventude. Os minerais que causam conflitos são bem-vindos, mas as pessoas que fogem são rejeitadas”.
Na Ásia, o Cardeal Filipe Neri explanou “A Ásia, marcada pela desigualdade, enfrenta a linha de frente da crise com derretimento de geleiras, eventos extremos e migração climática. A transição energética global é criticada por promover um “capitalismo verde” que viola os direitos dos povos indígenas e aumenta a vulnerabilidade das mulheres e comunidades locais através da exploração de mineração crítica”.
Dom Ryan Jimenez, vindo das Ilhas do Pacífico relatou que “As ilhas do Pacífico, como Tuvalu, enfrentam o risco iminente de afundamento devido ao aumento do nível do mar. A crise força a migração, gerando conflitos entre a sobrevivência dos filhos e a dor de deixar a terra natal. As economias locais são fragilizadas pelo extrativismo e pela mineração de fundo do mar”.
O Papel da Europa e o Compromisso Financeiro
A representação europeia, embora reconhecendo problemas internos como a guerra na Ucrânia que elevou drasticamente os custos de energia e gerou pobreza e migração (ex: 60 mil jovens educados saindo da Sérvia anualmente), reforçou o compromisso de ser parte da solução:
Cardeal Ladislav Nemet destacou que a Europa, apesar de ter problemas em escala diferente, trabalhará em conjunto com o Sul Global. “A Igreja Europeia, grande doadora (citando a Alemanha), prometeu continuar financiando projetos de transformação ecológica no Sul Global, esperando que a Comissão Europeia não só reduza as emissões, mas também diminua o gap financeiro necessário para a adaptação”, disse.
Síntese Profética
Em uníssono, as vozes do Sul Global e da Europa ressaltaram que a resposta à crise climática não se resume a soluções técnicas. É fundamental integrar as cosmovisões locais, resistir ao consumismo e priorizar o cuidado com a vida em todas as decisões. exige que a crise climática seja tratada como uma obra única de amor e justiça — cuidando da terra e dos pobres simultaneamente, conforme a visão integral da Doutrina Social da Igreja e dos Papas Francisco e Leão XIV.A fé deve se traduzir em esperança concreta, e a caridade, em um novo modo de habitar a Terra, como um sinal de humanidade reconciliada com Deus e com a criação.
Durante a última plenária cientistas e líderes indígenas se reuniram para emitir um chamado unificado por justiça climática e integralidade da criação, consolidando propostas que devem pautar as negociações da COP30.
O encontro, que culminou em uma celebração mariana, reuniu quatro nomes importantes para o momento, que foram mediados pelo Dom Vicente de Paula Ferreira, bispo da Diocese de Livramento, na Bahia, e presidente da Comissão Especial para Mineração e da Ecologia Integral. Como explanadores estiveram presentes a bispa Marinês Rosa dos Santos Bassotto, Primaz da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, que falou sobre ‘Ecoespiritualidade, Missão Profética do Cristianismo na Amazônia’; o Cardeal Dom Leonardo Steiner, Arcebispo de Manaus e presidente da Comissão da Amazônia, da CNBB, que falou sobre ‘Caminhos da Ecologia Integral para Conversão Ecológica’; a doutora, professora, Ima Vieira, doutora em ecologia e pesquisadora titular do Museu Paraense, Emílio Goeldi, e assessora da presidência do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, que falou sobre Ciência, Economia e Política em busca da Justiça Climática’, e Cléber Caripuna, militante indígena em defesa dos povos originários e da Amazônia, coordenador executivo da articulação dos povos indígenas do Brasil, que apresentou o tema ‘A Presença dos Povos Originários da Amazônia Brasileira, com suas Lutas e Perspectivas’.
Os painelistas reforçaram a urgência das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) Indígenas, e denunciaram o “capitalismo verde” e a mentalidade exploratória, resgatando o legado da Igreja no cuidado com a Amazônia, reafirmando que a esperança reside na ação imediata e na mobilização popular.
O Legado de Conversão Ecológica na Igreja Brasileira O Cardeal Leonardo Steiner, Arcebispo de Manaus, detalhou a longa jornada da Igreja no Brasil, desde as Campanhas da Fraternidade (CPF) – iniciativas anuais que, desde 1979, já alertavam para a conservação de recursos. Este caminho histórico pavimentou o engajamento atual. Projetos práticos, como a recuperação de áreas degradadas na Ecovila Landê, em Santa Bárbara (PA), ilustram que a conversão ecológica da Igreja é uma prática de cuidado e resiliência contra o modelo focado no lucro.
Sacralidade x Mentalidade Calculista: Um Choque de Visões de Mundo “A crise é profundamente espiritual”. A Bispa Marinês destacou a sacralidade de tudo que existe segundo as cosmovisões indígenas, confrontando a “mentalidade calculista” que reduz a natureza a objetos de cálculo e lucro. Essa visão opõe-se à Doutrina Social da Igreja, que exige o cuidado com a Terra e com os pobres como uma obra única de amor e justiça.
A Evidência Científica Inegável: A Urgência de 1,5°C A Dra. Ima Vieira apresentou dados irrefutáveis “o aquecimento global já ultrapassa 1°C, e na Amazônia, a degradação florestal supera o desmatamento. O consenso científico é claro, limitar a 1,5°C é essencial, pois cada décimo de grau adicional aumenta exponencialmente os riscos. A ciência nos ensina: se esperarmos, pode ser tarde demais”, disse ao apresentar dados alarmantes.
NDCs Indígenas: A Estratégia Climática Comprovada “O movimento indígena brasileiro propõe as NDCs Indígenas, exigindo demarcação e proteção de territórios como política efetiva de enfrentamento à emergência climática”. Kleber Karipuna reforçou que quase 50% das florestas amazônicas são conservadas por esses povos, detentores de conhecimento milenar. “A Aliança de Comunidades Territoriais protege quase 979 milhões de hectares de florestas tropicais”, contou.
A Força da Mobilização Popular Apesar das frustrações nas Zonas Azul e Verde, a sensação geral é que a mobilização popular é o fator decisivo. Mariluz destacou a esperança vista na participação ativa das pessoas locais e das populações originárias, um elemento essencial para impulsionar as mudanças necessárias.
Síntese e Caminhos para o Jubileu
Ao final do encontro Dom Jaime sintetizou reiterando a máxima do Papa Francisco “Estamos todos no mesmo barco, ou nos salvamos juntos, ou não sabemos”. Ele enfatizou a interligação de todas as coisas, que conduz à obra do cuidado. Quatro pontos foram destacados, a missão conjunta de defensores das florestas; a memória de uma igreja comprometida em contraste com o mundo calculante; a clareza da ciência e a urgência de agir agora; e a aliança da Igreja com os povos indígenas para a defesa de seus territórios. O ano jubilar convida a um novo começo, buscando justiça e vida plena para todos.
O Palco da Esperança: Símbolos da Urgência e da Aliança
O simpósio não foi apenas um debate, mas um ato litúrgico e profético que era percebido não apenas nas explanações, mas na composição de todo o ambiente. No centro do palco, um tecido chamado “Rio da Esperança”, trazido pelo movimento Laudato Sí, de Roma. O tapete, simbolizou a unidade e a responsabilidade compartilhada sobre as águas. Ao lado, um ícone de madeira em formato de cruz continha água derretida de um bloco de gelo da Groenlândia, abençoada pelo Papa Francisco. A peça peregrinou por santuários brasileiros até a COP30. Estes objetos materializam a crise e a fé que move a ação.
A Esperança é uma Pessoa
Dom Jaime concluiu sua síntese lembrando que a esperança não é um conceito abstrato, mas uma pessoa, que é vida, verdade e caminho, reforçando o chamado à perseverança mesmo diante da realidade difícil.
Ao final do simpósio, o Padre Arnaldo Rodrigues, assessor de comunicação da CNBB, fez questão de agradecer formalmente às instituições que tornaram o evento possível, citando a TV Nazaré, a CNBB (organizadora), a CELAM Conselho Episcopal Latino-Americano e Caribenho, o Vaticano, a Nunciatura, as Universidades, a Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB), o Colégio Santa Catarina de Sena, pela acolhida, e todos os colaboradores que trabalharam na preparação do encontro.
O Simpósio foi selado com a ave-maria conduzida por Dom Jaime, incluindo a invocação à Virgem Maria, a bênção final, invocando a paz. O encerramento litúrgico foi seguido pelo convite para a peregrinação com a imagem de Nossa Senhora de Nazaré, até a Basílica de Nazaré, onde foi realizado uma Celebração Eucarística.
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