por Vívian Marler / Assessora de Comunicação do Regional Norte 2 da CNBB

O Papa Leão XIV enviou, esta manhã (20), uma mensagem aos participantes da ‘Segunda Conferência Anual sobre Inteligência Artificial, Ética e Governança de Empresas’, realizada em Roma. Ele destaca a necessidade urgente de reflexão sobre a dimensão ética da IA e sua governança responsável. “A Igreja deseja contribuir para uma discussão serena sobre o tema, ponderando as ramificações da IA à luz do desenvolvimento integral da pessoa humana e da sociedade, salvaguardando a dignidade de cada indivíduo e respeitando a diversidade cultural e espiritual dos povos”, disse o Pontífice.

O Papa expressou ainda preocupação com as possíveis consequências do uso da IA no desenvolvimento intelectual e neurológico de crianças e jovens, enfatizando que o acesso a dados não deve ser confundido com a inteligência, que envolve a abertura da pessoa às questões últimas da vida e uma orientação para o Verdadeiro e o Bom. Ele espera que as deliberações considerem a IA no contexto da necessária aprendizagem intergeracional, permitindo que os jovens integrem a verdade em sua vida moral e espiritual.

Leia abaixo a mensagem do Papa Leão XIV traduzida, de forma livre, do original em Inglês.

Por ocasião desta Segunda Conferência Anual de Roma sobre Inteligência Artificial, estendo meus votos de boa sorte a todos os participantes. A sua presença atesta a necessidade urgente de uma reflexão séria e de uma discussão contínua sobre a dimensão inerentemente ética da IA, bem como a sua governação responsável. A este respeito, apraz-me que o segundo dia da Conferência se realize no Palácio Apostólico, uma clara indicação do desejo da Igreja de participar nestas discussões que afetam diretamente o presente e o futuro da nossa família humana.

Juntamente com o seu extraordinário potencial para beneficiar a família humana, o rápido desenvolvimento da IA também levanta questões mais profundas sobre o uso adequado de tal tecnologia na geração de uma sociedade global mais autenticamente justa e humana. Neste sentido, embora indubitavelmente um produto excepcional do gênio humano, a IA é “acima de tudo uma ferramenta” (PAPA FRANCISCO, Discurso na Sessão do G7 sobre Inteligência Artificial, 14 de junho de 2024). Por definição, as ferramentas apontam para a inteligência humana que as criou e extraem grande parte de sua força ética das intenções dos indivíduos que as utilizam. Em alguns casos, a IA tem sido usada de maneiras positivas e, de fato, nobres para promover uma maior igualdade, mas existe igualmente a possibilidade de sua utilização indevida para ganho egoísta à custa de outros, ou pior, para fomentar conflitos e agressões.

Por sua vez, a Igreja deseja contribuir para uma discussão serena e informada sobre estas questões prementes, sublinhando acima de tudo a necessidade de ponderar as ramificações da IA à luz do “desenvolvimento integral da pessoa humana e da sociedade” (Nota Antiqua et Nova, 6). Isto implica ter em conta o bem-estar da pessoa humana não só materialmente, mas também intelectual e espiritualmente; significa salvaguardar a dignidade inviolável de cada pessoa humana e respeitar as riquezas culturais e espirituais e a diversidade dos povos do mundo. Em última análise, os benefícios ou riscos da IA devem ser avaliados precisamente de acordo com este critério ético superior.

Infelizmente, como salientou o falecido Papa Francisco, as nossas sociedades hoje estão a experimentar uma certa “perda, ou pelo menos um eclipse, do sentido do que é humano”, e isto, por sua vez, desafia-nos a todos a refletir mais profundamente sobre a verdadeira natureza e singularidade da nossa dignidade humana comum (Discurso na Sessão do G7 sobre Inteligência Artificial, 14 de junho de 2024). A IA, especialmente a IA Generativa, abriu novos horizontes em muitos níveis diferentes, incluindo o aprimoramento da pesquisa em saúde e da descoberta científica, mas também levanta questões preocupantes sobre suas possíveis repercussões na abertura da humanidade à verdade e à beleza, em nossa capacidade distintiva de compreender e processar a realidade. Reconhecer e respeitar o que é unicamente característico da pessoa humana é essencial para a discussão de qualquer estrutura ética adequada para a governação da IA.

Todos nós, tenho certeza, estamos preocupados com as crianças e os jovens, e com as possíveis consequências do uso da IA em seu desenvolvimento intelectual e neurológico. Nossos jovens devem ser ajudados, e não impedidos, em sua jornada rumo à maturidade e à verdadeira responsabilidade. Eles são a nossa esperança para o futuro, e o bem-estar da sociedade depende de que lhes seja dada a capacidade de desenvolver seus dons e capacidades dados por Deus, e de responder às exigências dos tempos e às necessidades dos outros com um espírito livre e generoso. Nenhuma geração jamais teve acesso tão rápido à quantidade de informações agora disponíveis através da IA. Mas, novamente, o acesso a dados, por mais extenso que seja, não deve ser confundido com inteligência, que necessariamente “envolve a abertura da pessoa às questões últimas da vida e reflete uma orientação para o Verdadeiro e o Bom” (Antiqua et Nova, No. 29).

No final, a sabedoria autêntica tem mais a ver com reconhecimento do verdadeiro significado da vida do que com a disponibilidade de dados.

Nesta luz, caros amigos, expresso a minha esperança de que as vossas deliberações também considerem a IA no contexto da necessária aprendizagem intergeracional que permitirá aos jovens integrar a verdade na sua vida moral e espiritual, informando assim as suas decisões amadurecidas e abrindo o caminho para um mundo de maior solidariedade”. (Papa Leão XIV)