Introdução
Na Igreja ninguém deve trabalhar sozinho e, quando isso acontece, é porque o sujeito da ação não está em sintonia com o verdadeiro dinamismo eclesial. Na Igreja vivemos e trabalhamos em colegialidade, ou seja, em colaboração, em sinergia, em espírito de corresponsabilidade. Quando cremos na importância da comunhão, refletimos e caminhamos juntos fraternalmente. Isso é sinodalidade!

As consequências da mesma fé são muitas para a Igreja Católica. De diversas formas e em diferentes níveis, todos os batizados são chamados à comunhão e tem o direito de participar dos processos decisórios e são chamados ao senso de corresponsabilidade em níveis diferentes.

Na Igreja Católica, quando falamos de colegialidade, significa a dinâmica da sinergia, convergência de esforços, de participação das lideranças e envolvimento de múltiplos sujeitos em processos de discernimento e tomadas de decisão em questões relativas à vida e missão da Igreja. Da consciência de comunhão decorre o “princípio da colegialidade”.

Na Igreja os líderes e nem qualquer outra força viva não devem trabalhar isoladamente. Mas na prática, a colegialidade não se reduz a uma questão de processos decisórios, trata-se do dinamismo da vida da Igreja porque somos uma família que vive em espírito de fraternidade.

1. A função da Colegialidade

O “princípio da colegialidade” nos apresenta o colégio, ou seja, o grupo, como sujeito responsável pela ampliação da visão e da profundidade do tratamento de uma questão, muitas vezes, em vista de uma tomada de decisão. A colegialidade é um forte remédio contra a prepotência do “eu já sei o que fazer” de um líder. Quem no serviço de liderança, em qualquer contexto, tem a presunção de saber tudo acaba incorrendo em graves males como aquela da ditadura.

O “princípio da colegialidade” favorece o aumento das possibilidades de acertos, diminuindo a margens de erros, prejuízos, desvios, omissão. Onde há um só, ou poucos que mandam, lá corre-se mais perigos de erros. O “princípio da colegialidade” tem como finalidade promover a segurança, evitando a fragilidade das decisões autocráticas. A colegialidade diminuiu a miopia na visão da realidade e, por outro lado, oportuniza uma percepção mais profunda possível da mesma.

Para a Igreja, porém, o “princípio da colegialidade”, não se identifica com a democracia. No espírito democrático a maioria tudo decide; na colegialidade eclesial todos contribuem honestamente para que a decisão seja correta e a mais sábia possível.
Na Igreja a colegialidade não é opcional, mas é uma exigência da estrutura e dinâmica de governo da mesma em todos seus níveis. A colegialidade eclesial, evidencia a corresponsabilidade para com a Igreja, a necessidade da preservação do espírito de comunhão e serviço cooperativo no enfrentamento de desafios.


  1. Diversos níveis de colegialidade

Na Igreja há diversos níveis de colegialidade: o universal que contribui para o bom serviço de animação e governo do papa contando com a ajuda dos cardeais e suas comissões; em segundo lugar temos as conferências episcopais em vários níveis, por exemplo, por continentes, nações e regiões; esses níveis de colegialidade, que também tem suas organizações internas, contribuem para a comunhão e consolida da Igreja no enfrentamento dos desafios pastorais comuns nos continentes (Europa, África, Ásia, Oceania, América) e países estabelecendo atitudes de atuação, prioridades pastorais, posicionamentos diante de determinados temas e situações concretas de cada país ou região. Isso é muito importante porque cada região do mundo tem suas características próprias que desafiam a evangelização.

Há ainda a colegialidade em nível diocesano. Em cada diocese também o bispo não governa sozinho. Dependendo de cada diocese (da sua história e tamanho) há diversos conselhos como, por exemplo: o conselho episcopal, o conselho presbiteral, o conselho de cônegos, o conselho pastoral, etc. Todos tem como função contribuir com a animação pastoral, gestão administrativa e governo da Igreja através dos conselhos ao bispo diocesano que após, ouvir deve tomar as decisões convenientes.

Outro nível de colegialidade é aquele paroquial. Esse nível de colegialidade vamos aprofundá-lo na próxima reflexão falando da importância do Conselho Pastoral Paroquial (CPP) e do Conselho para Assuntos Administrativos e Econômicos (COPAE). Visto que a paróquia, em muitos contextos, é composta por uma rede de comunidades locais, reconhecemos outro nível de colegialidade que é aquele da liderança local.  Quando numa comunidade se vive essa experiência da colegialidade, o coordenador da comunidade também não trabalha sozinho, mas vive a experiência da liderança através de uma equipe. Quando numa comunidade local há uma equipe coordenadora (por exemplo, o coordenador, vice, secretário e tesoureiro) a mesma tem mais consistência, abertura e espírito fraterno. Esse é o ideal.

Enfim, a experiência da colegialidade significa a prática da liderança cooperativa, que preserva o senso de corresponsabilidade pastoral, alimenta o sentido de pertença, provoca o envolvimento, a participação, a fraternidade e preserva-se assim o zelo para com a fidelidade à comunhão eclesial.

 

  1. Jesus Cristo e a colegialidade

A sensibilidade para com a questão o viver, pensar, trabalhar e caminhar juntos, tem sua fonte na identidade, palavras e atitudes do próprio Jesus Cristo.  Antes de tudo, recordemos que Jesus é sujeito integrante de uma comunidade, a Santíssima Trindade e por isso, nada fez isoladamente. O senso comunitário da Igreja tem a sua fonte na Santíssima Trindade, a comunidade de Jesus. A Igreja, comunidade dos discípulos de Jesus Cristo, deve ter os olhos fixos no seu Mestre: em suas palavras, atitudes, sensibilidade, modo de agir, ensinar, pregar…

No que diz respeito à liderança, Jesus não agiu sozinho, não foi centralizador, dominador, paternalista; Jesus não foi populista, autocrata e nem “herói solitário”, mas convocou pessoas em sua missão, as capacitou, as envolveu, as acompanhou, as educou para o sentido de corresponsabilidade, sentido de pertença; Jesus compartilhou com seus discípulos a sua nobre missão de Salvar a humanidade (cf. Mt 9-10; Mc 3,13-19; Lc 6,12-16; Lc 10,1-9; Jo 21,15-19). Quando Jesus envia seus discípulos “dois a dois” está dando ênfase à dimensão comunitária da missão.

Os discípulos participaram ativamente da missão de Jesus e deram continuidade a ela. Hoje somos nós os responsáveis pela promoção da missão da Igreja! A dinâmica de corresponsabilidade, comunhão e sinergia deve permanecer! Participamos da mesma missão, em variados níveis de responsabilidades… (cf. Jo 21,15-19; 1Cor 3,5-9; 1Cor 12,5).

Também os apóstolos tiveram colaboradores, não trabalharam sozinhos. Fieis às atitudes e aos ensinamentos de Jesus, também as primeiras comunidades promoveram o espírito de corresponsabilidade, colaboração, solidariedade na missão, colegialidade no serviço de liderança. Não eram somente os apóstolos os responsáveis pela vida das comunidades: havia diáconos, ministros, pregadores, colaboradores, benfeitores… etc. Os colaboradores dos apóstolos eram pessoas contagiadas pelo Espírito (cf. At 11,28; 13,2-4), movidos por grande paixão missionária. Escrevendo aos Coríntios São Paulo afirma que todos colaboram e se afadigam na mesma obra que é a edificação da Igreja em vista do Reino de Deus; somos colaboradores que juntos trabalham na obra de Deus! (cf. 1Cor 1,8-9; 1Cor 16,16: 2Cor 6,1).

PARA REFLEXÃO PESSOAL:

  1. O que significa a colegialidade eclesial?
  2. Por que é importante viver, trabalhar, pensar e decidir juntos?
  3. Quais são os males de uma liderança autocrática, herói solitário?

POR Dom ANTÔNIO DE ASSIS RIBEIRO, SDB

Bispo Auxiliar de Belém - PA e Secretário Regional da CNBB Norte 2