Tem coisas que todos sabemos, mas que custamos a reconhecer. Por exemplo: quando nos relacionamentos pessoais e familiares começa a entrar o interesse através da troca de favores ou com promessas de dinheiro, algo quebrou. Este é o testemunho de uma mãe: “Certo dia, de muito calor, na hora da merenda, preparei quatro potinhos de sorvete para os meus filhos. Chamei-os e disse que podiam comprá-los com um abraço. Formaram uma fila. Os três pequenos me deram um aperto rápido e foram embora com o seu sorvete. Voltaram a brincar. Quando chegou o meu filho adolescente, o último da fila, me deu dois abraços. – Pode ficar com o troco – me disse sorrindo. Quase chorei.”

No Domingo da Santíssima Trindade só podemos falar do amor. O Amor grande demais que é o próprio Deus, assim como ele se fez conhecer: Pai, Filho e Espírito Santo, mistério de comunhão perfeita. Mas também, o amor simples, cotidiano, quase corriqueiro, que, sustenta a nossa vida. No fundo, nenhum amor verdadeiro é pequeno ou inútil. Todo gesto de amor, de doação, de acolhida, é um sinal que o Amor existe, que ainda não foi sufocado pelo egoísmo e sobrevive apesar de tudo. Basta reconhecê-lo, admitir que nos faz falta e não ter medo de oferecê-lo. Todos somos carentes disso e todos podemos doar um pouco de amor sincero. Ser cristãos significa acreditar não somente no Amor de Deus do qual nada pode nos separar (Rm 8,35 ss), mas também na nossa possibilidade de experimentar e comunicar amor.

Na véspera deste domingo teremos algumas ordenações presbiterais em nossa Diocese. Agradeçamos ao Senhor da messe pelos operários que nos envia. Depois, na quinta-feira seguinte, celebraremos a Festa do Santíssimo Sacramento do Corpo e Sangue de Cristo. Sairemos em procissão com a Eucaristia pelas ruas das nossas cidades. Para muitos, hoje, aceitar ser padres na Igreja Católica pode parecer uma loucura e uma procissão um resquício folclórico de tempos passados. Não cabem aqui discussões. No entanto, um pouco de razão estes nossos irmãos podem ter, Papa Francisco e eu concordamos. Se um jovem pensa em ser padre para ter uma vida cômoda, se tornar importante e, quem sabe, fazer carreira na Igreja, está totalmente enganado e ficará rapidamente desiludido. Igualmente, se a procissão de Corpus Christi fosse semelhante a uma passeata qualquer e tivesse como finalidade a propaganda, também estaríamos todos muito equivocados. Espero que nada disso passe pela cabeça dos ordenandos e dos organizadores das procissões. Os padres da Igreja Católica, antes de muitas outras tarefas e missões, celebram a Missa, oferecem, para que seja distribuído aos fiéis, o Pão da Palavra e o Pão da Vida que é o próprio Jesus nos sinais que ele mesmo nos deixou para que o fizéssemos em sua memória. Além disso o padre pode dizer a quem pedir perdão: – Os teus pecados estão perdoados. Vá em paz e não peque mais. Como Jesus dizia cheio de compaixão e misericórdia.

Estou misturando tudo, é verdade, mas agora volto à Santíssima Trindade porque, junto com o mistério da Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus, este é o grande mistério de amor do nosso Deus. Quem não acredita que o amor é possível e que amar é o único caminho para a verdadeira alegria, pode continuar a pensar diferente. A fé também, como o amor, só é verdadeira se é gratuita, isto é, buscada, pedida e acolhida como um dom do próprio Deus. Ser padre não é somente a resposta consciente a um chamado, é também um presente precioso que deve ser resguardado para que se torne um dom também para todos, cristãos ou não. Esta é também a lição da Eucaristia. O Corpo dado e o Sangue derramado de Jesus andam juntos com o lava-pés e as palavras do Senhor: “Sabendo isso, sereis felizes se o praticardes” (Jo 13,17). Por isso, não tenho receio a repetir que todo amor verdadeiro é grande e vai junto com a gratuidade. Tem a doçura do afago de um pai, de uma mãe, de um irmão, tem o aperto do abraço de um filho, tem sempre a alegria do coração. Sem troco. Sem nada em troca.

POR Dom PEDRO JOSÉ CONTI

Bispo de Macapá - AP