por Dom Antonio de Assis Ribeiro, SDB
Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém
Um dos símbolos mais significativos do Círio de Nossa Senhora de Nazaré de Belém é a berlinda. Mas de onde ela vem? Qual é a sua finalidade e o seu significado? São questões simples, mas é necessário respondê-las para o processo de aprofundamento das riquezas do Círio de Nazaré. Uma vez que se trata de um elemento tão expressivo dessa imponente festividade religiosa mariana, é importante refletirmos, não somente sobre a sua utilidade, mas também sobre o seu sentido teológico. Todos os fiéis de uma religião ou de uma Igreja, são chamados a ter clareza sobre o significado dos objetos usados em suas cerimônias e do sentido dos ritos celebrados.
A palavra “berlinda” tem sua origem na Europa, por volta do século XVI e, provavelmente, faz uma direta referência à cidade de Berlim, capital da Alemanha. A berlinda era a carruagem usada para transportar pessoas de classes nobres e autoridades políticas daquele tempo e que prosseguiria ao longo dos séculos. As carruagens eram puxadas por cavalos e a sua estrutura elevada possibilitava aos cidadãos a visibilidade das pessoas que eram transportadas solenemente.
O uso da carruagem chegou ao Brasil através dos portugueses. Ainda hoje a carruagem é usada em muitos países em grandes solenidades, para dar visibilidade e realçar o caráter excepcional de quem é transportado. É desse contexto histórico que vem a expressão “estar na berlinda”, que significa estar sob o olhar de todos, ser observado, estar em evidência.
Partindo desse costume político-cultural passamos para o contexto religioso. Na nossa experiência religiosa no Círio de Nossa Senhora de Nazaré, quem está ao centro dos olhares contemplativos, não é uma autoridade política, mas um símbolo religioso, um objeto sagrado cheio de significados. O mais importante não é a berlinda, mas o objeto acolhido por ela, a imagem de Nossa Senhora de Nazaré que, por sua vez, faz referência direta à pessoa de Maria, a mãe de Jesus.
Maria, foi constituída por Deus Pai, a mulher com a máxima autoridade no universo, por ser a Mãe do Emanuel, o Deus conosco (cf. Mt 1,23), a mãe do Senhor de Isabel (cf. Lc 1,43), a mãe do Filho de Deus (cf. Gl 4,4). Por isso, a liturgia Católica refere-se à Maria como a nova “Arca da Aliança” que no Antigo Testamento era o recipiente que transportava as tábuas da Lei, a Palavra de Deus. E Maria transportou no seu ventre, a Palavra de Deus que se fez homem e habitou entre nós (cf. Jo 1,14).
O mais importante não é a berlinda, a estrutura física transportadora, mas aquilo que está no seu interior, e o que isso representa. A berlinda de Nazaré é a carruagem da fé que conduz a Senhora Rainha, porque seu filho é o Rei dos reis e Senhor dos Senhores. Hoje a carruagem da senhora da Amazônia não é mais puxada pela força de cavalos, mas levada pela energia que brota da fé e do amor dos fiéis discípulos do seu Filho, como fez João, o discípulo amado que levou Maria para a sua casa (cf. Jo 19,27). A berlinda nos lembra a casa com a presença de Maria dentro dela. Como em Caná da Galileia (cf. Jo 2,1-11), ainda hoje a mãe de Jesus intercede pelas necessidades das famílias.
A berlinda não só realça e transporta a imagem, mas também é uma estrutura protetora para ela. Isso significa para nós que, enquanto caminhamos nas estradas da vida com Maria, usando das mais variadas estruturas e bens deste mundo, somos chamados a cuidar e a proteger aquilo que é mais importante, a nossa interioridade, a nossa mente, a nossa fé. Por outro lado, a decoração da berlinda, nos alerta para a necessidade da evidência das nossas virtudes e obras que visibilizam a robustez e a autenticidade da nossa fé. Feliz Círio!
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