por Dom Antônio de Assis Ribeiro, SDB
Bispo da Diocese de Macapá

A Igreja e a Família

Por causa da relação imprescindível entre família e Igreja, na agenda da celebração do Ano Santo consta também alguns dias voltados para a família. O Jubileu das Famílias será celebrado em Roma dos dias 30, 31 de maio a 01 de junho de 2025. A partir desse convite universal, pode-se programar outros níveis de celebrações do Jubileu da família, nas Dioceses, Paróquias, Comunidades, escolas católicas etc.. Na Igreja Católica há muitos movimentos voltados para a promoção da família que, neste ano Santo, estão todos convocados a programar modalidades variadas de celebração do Jubileu da família. Por isso, a pastoral familiar deve ser chamada em causa em primeiro lugar!

Na Exortação Apostólica Amoris Laetitia, sobre a Alegria do Amor na Família, o Papa Francisco afirma que “a Alegria do amor vivido na família é também júbilo da Igreja”. Há uma íntima relação entre Família e Igreja; não existiria a Igreja sem ela. A Igreja é Comunidade de famílias que, animada pelo espírito fraterno, assume o dinamismo de uma única grande família.

Apesar das suas fragilidades internas e dos dramas socioculturais que hoje martirizam a família, ela continua sendo a principal estrutura de apoio, amparo, de intercâmbio de afeto e escola primária dos valores morais e religiosos. Eis a importância indiscutível da família para a humanidade em geral e cada sociedade concreta. A família constitui a estrutura e o núcleo fundamental que possibilita o desabrochar da dimensão social e afetiva que nos capacita para a experiência dos valores morais (obediência aos padrões de comportamento convenientes) e das mais nobres aspirações éticas como a luta pela justiça, a experiência da solidariedade, a defesa da paz, a vivência da honestidade etc.

  1. A importância do Jubileu da Família

Somos chamados a celebrar o Jubileu da família por muitas razões! Antes de tudo, porque a celebração do Jubileu significa um chamado à conversão. Não é possível admitir a vivência de um Ano Jubilar pessoal, se nas relações familiares, não estamos bem. A celebração do Ano Jubilar deve estar voltada também para transformação das relações familiares.

Grande parte dos dramas vividos pelas famílias, diz respeito à qualidade das relações interpessoais. A qualidade da família impacta a vida pastoral da Igreja! Não podemos ter comunidades saudáveis com famílias fragmentadas e nem aceitar pessoas engajadas nas atividades pastorais que vivem em estado de ódio na família. A Igreja não deve ser espaço de fuga, mas de crescimento integral.

Lamentavelmente encontramos situações dolorosas dentro das famílias, no que diz respeito à qualidade das relações internas: indiferença, frieza, vingança, intolerância, dispersão, agressividade, anonimato, isolamento, cansaço afetivo etc. É horroroso constatar que há pai ou mãe que não fala com algum dos filhos e nem filho que não fala com algum dos seus genitores; que há marido e mulher (pais) vivendo teatralmente, de aparências diante dos filhos, mas na verdade se odeiam vivenciando atitudes de indiferença e silenciosa agressividade recíproca.

É dramático constatarmos que há irmãos que não se falam, às vezes, por motivos banais; é digno de repúdio o mal da indiferença entre irmãos: há pessoas ricas que tem irmãos paupérrimos, miseráveis, doentes, mas não havendo a mínima sensibilidades e solidariedades entre eles. Que deplorável é encontrarmos pais idosos e doentes esquecidos, abandonados ou continuamente maltratados por seus filhos, e mais ainda, sendo roubados pelo desvio dos recursos da própria aposentadoria ou benefícios. Não são poucas as famílias que padecem terrivelmente por causa de vícios e vivem numa situação de total indiferença religiosa.

Outro fato muito pesaroso é constatarmos que há filhos que carregam sozinhos todo o peso administrativo e financeiro dos pais idosos ou de algum irmão deficiente, enquanto os demais não se envolvem, não se sentem corresponsáveis, não dão a própria contribuição nem com a sua presença! Muitos irmãos e parentes, entraram em graves conflitos por causa de fofocas internas, disputa de heranças, dívidas não pagas… gerando a fragmentação das relações familiares, rivalidade, hostilidade.

  1. A família em conversão

No Ano Jubilar a família é chamada à conversão! Por isso, a vivência dos compromissos do ano jubilar convoca todos os membros da família para a qualificação das relações internas, entre marido e mulher, pais e filhos, irmãos entre si e demais parentes.

A trombeta do ano santo nos recorda que a família é o primeiro espaço humano onde devemos fazer a experiência das relações interpessoais marcadas pela amizade, caridade, cuidado, respeito, sensibilidade, gratuidade, gratidão, perdão, misericórdia, escuta, comunicação. Quem não desenvolveu sentimentos de compaixão para com os próprios parentes, sobretudo, para com seus pais e irmãos, certamente não terá piedade de ninguém! Tudo fará por conveniência egoísta, mas não por espírito ético!

Todas essas situações constituem um forte convite para o relançamento do cuidado pastoral das famílias, sobretudo, neste ano jubilar. Não é bom cairmos no idealismo de pensar na resolução de todos os problemas da família, mas é oportunidade para incentivar uma mais profunda a compreensão entre fé e caridade. O Ano Jubilar é tempo para a tentativa de amenizar conflitos, restaurar a amizade familiar, promover a reconciliação, restaurar a unidade, estimular a comunicação, incentivar o perdão, sensibilizar para a misericórdia, fomentar o diálogo e a aproximação entre parentes, celebrar a alegria do amor na família.

  1. O Ano Santo da Família nas Paróquias

O que podemos fazer concretamente em nossas paróquias? Por certo, o que será possível dependerá muito de cada contexto. Mas há algumas atividades possíveis, como por exemplo:

  • Sensibilizar a pastoral familiar e todos os movimentos voltados para a família organizando uma agenda de atividades extraordinárias;
  • Promover a experiência de terapia familiar e de celebrações penitenciais;
  • Apresentar a possibilidade de retiros para casais ou famílias propondo a reflexão de temas relativos às relações intrafamiliares;
  • Promover a celebração da Palavra voltada para o tema do perdão e da reconciliação com significativos gestos simbólicos estimulando compromissos;
  • Incentivar as famílias para fazerem a experiência de peregrinações oferecendo-lhes um roteiro específico;
  • Incentivar o voluntariado de profissionais (psicólogos, terapeutas, conciliadores…) para intermediar a resolução de conflitos promovendo a reconciliação;
  • Fazer o mapeamento de situações de famílias que vivem em graves carências, dramas e sofrimentos incentivando a corresponsabilidade e a solidariedade familiar;
  • Propor momentos de leitura orante da Palavra de Deus e de adoração, no qual, se possa meditar sobre as relações familiares em confronto com a Palavra de Deus.

O cuidado pastoral da família será sempre um investimento que trará grande benefício para a Igreja e para a sociedade. Num mundo profundamente tentado pelo materialismo, é necessário cuidar do essencial. “O amor jamais passará!” (1Cor 13,8).