Introdução

A Igreja, povo de Deus, é um mistério marcado pela unidade, diversidade e comunhão. Na Encíclica Ecclesiam Suam (N.16), o Papa Paulo VI, nos convida a refletir sobre esse mistério para que possamos descer às suas consequências práticas nos mais variados contextos e níveis eclesiais. Esse mistério de unidade é um alerta e requer de nós discípulos de Jesus Cristo uma consciência de fé adulta e vivida.

Num mundo profundamente marcado por tantas divisões, somos cada vez mais interpelados pelo mistério do amor que mantém e alimenta a unidade da Igreja. Afirma o Papa Paulo VI, ”Cristo derrama nos seus membros místicos as comunicações admiráveis da sua verdade e da sua graça, e dá ao seu Corpo Místico, peregrino no tempo, a organização visível, a unidade ilustre, a funcionalidade orgânica, a variedade harmônica e a beleza espiritual” (ES,16). A Verdade une a Igreja, por isso nela não há espaço para o voluntarismo e subjetivismo.

Portanto, a unidade da Igreja não é consequência da sua política interna e nem por força da organização hierárquica, mas é dom de Deus que chama os fieis discípulos de Jesus a serem autênticos zelando pelo cumprimento daquilo que ele suplicou ao Pai: «Eu não te peço só por estes, mas também por aqueles que vão acreditar em mim por causa da palavra deles, para que todos sejam um, como tu, Pai, estás em mim e eu em ti” (Jo 17,20-21).

Somos convocados a aprofundar o sentido dessa unidade, o seu conteúdo, suas consequências e atitudes concretas que devemos cultivar e outras a evitar. Essas são importantes questões que precisam ser respondidas para que a nossa consciência de ser Igreja possa ser autêntica.

  1. A Igreja é Una por essência

O Concílio Vaticano II afirmou a unidade e a unicidade da Igreja; ela é una e única (cf. LG, 23). De fato, Jesus não fundou uma pluralidade de Igrejas, mas uma só! Isso está bem claro nas palavras dirigidas a Pedro: “você é Pedro, e sobre essa pedra construirei a minha Igreja, e o poder da morte nunca poderá vencê-la” (Mt 16,18). São Paulo afirma que “Cristo amou a Igreja e se entregou por ela” (Ef 5, 25).   

Ela, assim, é una e única, apesar da pluralidade das suas expressões e níveis organizacionais. Levando a sério esse caráter de unidade e unicidade, a Igreja é sacramento da una, única e indivisível Trindade Santa. A Igreja, portanto, não tem essas propriedades por força da sua estrutura política, mas por sua identidade natural.

“A Igreja, em Cristo, é como que o sacramento, ou sinal, o instrumento da íntima união com Deus e da unidade de todo o gênero humano, pretende ela, na sequência dos anteriores Concílios, pôr de manifesto com maior insistência, aos fiéis e a todo o mundo, a sua natureza e missão universal. E as condições do nosso tempo tornam ainda mais urgentes este dever da Igreja, para que deste modo os homens todos, hoje mais estreitamente ligados uns aos outros, pelos diversos laços sociais, técnicos e culturais, alcancem também a plena unidade em Cristo” (LG,1).

A Igreja é UNA e integrada por sua essência, porque é o resultado da ação do Espírito de Cristo que convoca. “Embora sendo muitos, formamos um só corpo em Cristo” (Rm 12,5). A Igreja é una porque “há um só corpo e um só Espírito, assim como a vocação de vocês os chamou a uma só esperança: há um só Senhor, uma só fé, um só batismo. Há um só Deus e Pai de todos, que está acima de todos, que age por meio de todos e está presente em todos” (Ef 4,4-6).

 

  1. A Igreja é Una por sua vocação

A Igreja é formada a partir de um chamado. Recordemos o que diz o evangelista Marcos falando da convocação dos discípulos: “Jesus subiu ao monte e chamou os que desejava escolher. E foram até ele. Então Jesus constituiu o grupo dos Doze, para que ficassem com ele e para enviá-los a pregar…” (Mc 3,13-15).

Por primeiro, o evangelista ressalta a questão da intimidade com Jesus Cristo. Jesus chamou os que ele quis para que ficassem com ele. A Igreja é una porque está arraigada em Cristo. Estar em Cristo, é viver inserido na Comunidade do Amor. A Igreja nasce do mistério de Amor da Santíssima Trindade, por isso nela, se inspira, dela se alimentar e com ela é chamada a se confrontar continuamente (cf. ES, 41)

A Igreja é una porque é uma realidade consequente de uma união que se formou a partir da convocação de cada fiel. É o Espírito de Deus que a mantém na unidade, que a sensibiliza à conversão e renova continuamente o senso de comunhão entre seus membros. A unidade eclesial é dom e, ao mesmo tempo, é responsabilidade de cada fiel porque respondeu ao chamado recebido. Deus reúne sujeitos dispostos a testemunharem o amor de Cristo. De fato, por isso São Paulo recomenda aos fiéis da comunidade de Éfeso: “peço que vocês se comportem de modo digno da vocação que receberam. Sejam humildes, amáveis, pacientes e suportem-se uns aos outros no amor. Mantenham entre vocês laços de paz, para conservar a unidade do Espírito” (Ef 4,1-3). 

Esse mesmo esforço pela fidelidade vocacional é também expresso na Carta aos Filipenses: “se há um conforto em Cristo, uma consolação no amor, se existe uma comunhão de espírito, se existe ternura e compaixão, completem a minha alegria: tenham uma só aspiração, um só amor, uma só alma e um só pensamento” (Fl 2,1-2).

 

  1. A Igreja é Una por missão

Ela tem uma só missão e esta lhe foi dada pelo próprio Jesus: “vão, pois, e ensinem a todas as nações; batizem-nas em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Ensinem-nas a observar tudo o que lhes prescrevi. Eis que estou convosco todos os dias, até o fim do mundo” (Mt 28,19-20). A missão da Igreja é apresentar ao mundo a pessoa de Jesus Cristo, com tudo aquilo que ele fez e ensinou e, dessa forma, é serva do Reino de Deus.

O evangelista Marcos afirma que após receberam o mandato missionário, “os discípulos então saíram e pregaram por toda parte. O Senhor os ajudava e, por meio dos sinais que os acompanhavam, provava que o ensinamento deles era verdadeiro” (Mc 16,20).

“Evangelizar constitui, de fato, a graça e a vocação própria da Igreja, a sua mais profunda identidade. Ela existe para evangelizar, ou seja, para pregar e ensinar, ser o canal do dom da graça, reconciliar os pecadores com Deus e perpetuar o sacrifício de Cristo na santa missa, que é o memorial da sua morte e gloriosa Ressurreição” (EN,14).

A alegria da Igreja é continuar a missão de Jesus Cristo como fizeram os primeiros apóstolos (cf. Lc 10,17). A Igreja vive a mesma experiência, exulta de alegria no Espírito Santo e louva o Pai, porque a sua revelação chega aos pobres e aos pequeninos (cf. Lc 10,21) e às mais variadas categorias dos marginalizados e sofredores dos nossos dias.

Promovendo o Reino de Deus Jesus foi ao encontro dos pobres, doentes e sofredores e desprezados do seu tempo: curou cegos, surdos e mudos; libertou aprisionados, saciou famintos; confortou angustiados, curou leprosos e fez paralíticos andarem; perdoou os pecadores, ensinou os pobres e libertou possuídos pelo demônio…

Uma vez que toda a vida de Jesus Cristo foi dedicada à salvação integral da pessoa humana, tocando todas as suas dimensões, a Igreja, animada pelo Espírito da Verdade, pode dizer como Cristo: “Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em abundância!” (Jo 10,10). Essa missão é una, única e indivisível! Significa que jamais deverá reduzida, desviada e nem fragmentada.

 

PARA REFLEXÃO PESSOAL:

  1. Por que a unidade é importante para a Igreja?
  2. Porque a unidade é Dom e Responsabilidade?
  3. O que significa: “Embora sendo muitos, formamos um só corpo em Cristo” (Rm 12,5)?

POR Dom ANTÔNIO DE ASSIS RIBEIRO, SDB

Bispo Auxiliar de Belém - PA e Secretário Regional da CNBB Norte 2