Dom Pedro José Conti
Bispo da Diocese de Macapá

Um irmão falou para o antigo Pai Poimen: – Quando dou um pouco de pão ou algo diferente ao meu irmão, os demônios desvalorizam a minha ação: teria sido dado para agradar o ser humano. O ancião disse: – Mesmo que isso ocorra pela vontade de agradar, não deixemos de dar o necessário ao irmão. E lhes contou a seguinte parábola: – Dois agricultores moravam na mesma cidade. Um deles só semeou poucas sementes, e essas não estavam selecionadas; já o outro desistiu de semear e não colheu absolutamente nada. Quando pois surgir o flagelo da fome, quem dos dois terá o suficiente para viver? O irmão respondeu: – Aquele que semeou pouco e sementes não selecionadas. Então lhes disse o ancião: – Deixa que semeemos pouco, mesmo que com sementes não selecionadas, para que não morramos de fome.

No evangelho de Mateus deste 16º Domingo do Tempo Comum encontramos três parábolas do “discurso” de Jesus que iniciamos a ler no domingo passado. Todas elas são importantes e seria bom poder refletir sobre todas. No entanto, a mais famosa, que ganha uma explicação ainda no próprio evangelho, é aquela do joio e do trigo. Se identificamos o bem com o trigo e o mal com o joio, o Senhor quer nos dizer, em primeiro lugar, que eles estão juntos nos acontecimentos da história pessoal e da humanidade inteira. Ou seja, devemos levar em conta a realidade do mal que também cresce, dentro e fora de nós, muitas vezes sem ser logo percebido como algo de errado. Isto significa que, em certas situações e em certos tempos, o bem e o mal podem ser confundidos. De fato as espigas do joio são bastante semelhantes às espigas do trigo. Esta é a segunda consideração que devemos fazer. Ao passo, porém, que as espigas se tornam maiores, é mais fácil distinguir o joio do trigo. Jesus disse isso também de outra forma quando ensinou que a arvore boa se reconhece pelos frutos bons e o contrário para a arvore má (Mt 7,15-20). Nesta altura não é mais possível duvidar tanto e confundir o joio com o trigo, mas o que fazer? Pela parábola a vontade dos empregados seria arrancar logo o joio para salvar o trigo. O final da parábola surpreende. A separação do joio e do trigo, do bem e do mal, não será agora, quando ainda as plantinhas estão crescendo, mas somente na hora da colheita. Naquele momento sim, haverá o julgamento e a separação definitiva. A motivação do dono da roça para não deixar cortar logo e de vez o joio deve chamar a nossa atenção: cortando às pressas o joio, pode ser que os ceifadores acabem cortando também o trigo. Esta última consideração nos lembra que o julgamento final entre o bem e o mal será tarefa do “dono” da messe, mas, sobretudo, nos ensina a paciência, ou, talvez muito mais, a própria misericórdia de Deus que, até o fim, espera para não decidir só pelas aparências. Talvez o que parecia joio na realidade era trigo ou vice-versa. Teria sido cortado e jogado fora antes do tempo e punido injustamente.

A mensagem desta parábola é sempre extraordinária. É uma lição para os intolerantes, aqueles cristãos que apontam sem piedade os pecados dos outros a partir da própria suposta perfeição. Se déssemos ouvido a eles, na Igreja só teríamos os puros e os “santos” porque os pecadores seriam expulsos ou, de alguma forma, deixados às margens. A parábola, porém, é uma lição também para aqueles e aquelas que querem desistir da luta do bem contra o mal, por desânimo, por não ver logo os frutos do bem, por ter que fazer sempre as contas com as fraquezas humanas próprias e dos demais. A parábola não é um incentivo para fechar os olhos ou fingir que está tudo bem, quando não está. É um grande impulso a continuar a fazer o bem sempre, por pequeno, mal feito, limitado que seja. Se for bem mesmo, no final aparecerá. Gastamos muitas energia para apontar e querer corrigir os defeitos dos outros quando, ao contrário, deveríamos aprimorar mais a nossa fraternidade, a nossa comunhão, praticar o bem na melhor maneira possível. Sempre abertos à surpresa da bondade dos outros que, talvez, julgávamos já condenados. Não ficamos “selecionando” o bem, nosso e dos outros, vamos praticá-lo.