A Semana Nacional da Família apresenta como tema a iluminação bíblica “Eu e minha casa serviremos ao Senhor” (Josué 24, 15). Da terra prometida, o profeta fez sua escolha em servir o Deus da vida e hoje as famílias são chamadas a vivenciarem sua vocação ao serviço. O bispo de Rio Grande (RS) e presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Vida e a Família da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Ricardo Hoepers, apresenta uma reflexão com indicações para as famílias viverem no dia-a-dia este chamado de Deus.
Dom Ricardo parte da relação profunda que as vocações na Igreja têm com o serviço. “Deus não chama ninguém para si mesmo, Deus chama sempre para uma missão. Ele tem no seu plano, no seu chamado uma proposta concreta e todo chamado exige uma resposta, um sim que não é para si mesmo, não é para dentro de si mesmo, mas é para servir”.
O bispo também fala dos diversos serviços que as famílias podem desempenhar ao assumir sua missão e vocação dentro da própria casa, na Igreja e no âmbito social. “Eu sou chamado a ser família, eu respondo a esse chamado com um ‘sim’ vivendo, primeiramente, na minha casa, me vinculo à comunidade, mas também tenho que ter um trabalho em nível social, tenho que acreditar que a sociedade pode ser mudada, pode ser transformada”.
Confira a reflexão:
Transmitir a experiência de Deus
Podemos ver que o verbo central da proposta da Semana Nacional da Família é o servir, o serviço. E exatamente essa palavra tem a ver com a vocação. Vocare, que é um chamado, Deus não chama ninguém para si mesmo, Deus chama sempre para uma missão. Ele tem no seu plano, no seu chamado uma proposta concreta e todo chamado exige uma resposta, um sim que não é para si mesmo, não é para dentro de si mesmo, mas é para servir: primeiro a Igreja, ao projeto de Deus, e, claro, por consequência esse serviço traz uma missão específica que é ir ao encontro das pessoas que estão precisando do nosso apoio, da nossa ajuda, evangelizando, colocando no coração das pessoas o sentido mais pleno, mais profundo da vida, que é a experiência de Deus.
A evangelização, nada mais nada menos, e isso o Papa Francisco tem dito muito, o querigma, é este anúncio da experiência de Deus, este convite a fazer esta experiência de Deus. E aí tudo muda na vida: a perspectiva muda, a mentalidade muda, o olhar muda, tudo se torna mais claro porque Deus ilumina e dá sentido à nossa vida.
A vocação ao serviço, e ao dizer ‘Eu e minha casa serviremos ao Senhor’, é uma resposta que a família dá à sua vocação específica, a vocação, o chamado que Deus faz para que aquela família constituída no amor verdadeiro, no amor profundo, no amor fiel, no amor aberto à vida, que esta família, através desse modo de ser, na sua relação mais profunda de amor, ela transmita aos outros essa experiência de Deus.
Famílias fiéis ao chamado, Igreja mais próxima da missão de servir
Dentro das nossas casas, dos nossos lares, dentro desse amor relacional das famílias, deve brilhar para o mundo o sentido mais profundo da vida. Esse amor é o amor de Deus que transparece no sim que a família dá para sua vocação. A família pode servir no seu lar, na Igreja doméstica, na sua casa, fortalecer esse vínculo, essa experiência de Deus dentro de casa, ela pode servir ao Senhor fortalecendo seus vínculos de amor na Igreja, na comunidade, e pode servir ao Senhor respondendo seu sim a defender e promover a família na sociedade. Quanto mais as famílias forem fiéis ao seu chamado, à sua missão de mostrar que pela família o amor de Deus transparece, o amor de Deus brilha, a Igreja se torna mais próxima da sua missão de servir. Então, com isso, nós estaremos respondendo ao sentido da vocação familiar. Ela vai fazer brilhar a toda sociedade o próprio amor de Deus que transparece no amor do esposo e da esposa, dos pais com os filhos.
Ações concretas
Este serviço à Igreja doméstica, à Igreja comunitária e à Igreja tendo seu papel na sociedade, vai se especificar através de ações concretas. Esse amor, que deve transparecer o amor de Deus e ajudar as pessoas a fazer a experiência desse amor, ele tem que se concretizar, ele tem que ter metas, ações, objetivos.
Interno da Família
Em nível familiar, se pode fortalecer momentos de oração, ter o cantinho de oração, o cantinho da família, o lugar onde as pessoas em família rezam, a família pode fazer a leitura orante da Palavra de Deus para fortalecer o seu conhecimento da vontade de Deus sobre sua vida, a família pode, nesse tempo de pandemia, de maneira especial, aprofundar temas, acompanhar as lives que a própria comunidade, a própria diocese tem feito, a família deve buscar todos os recursos necessários para viver esta experiência dentro de sua casa. E para isso tem que ter metas, tem que ter disciplina, tem que ter um momento da oração, da reunião, do diálogo, um momento em que se desliga das redes sociais, que deixa o celular de lado, que deixa a televisão de lado e se dialoga, olha um para o outro.
Tem que ter momento de lazer, momentos de distração, momentos lúdicos, isso tudo faz parte da saúde espiritual da família. Então, essas ações concretas, dentro de casa, nas relações familiares, e pelo menos com os mais próximos, é fundamental para esta saúde espiritual da família. E quanto mais nós tivermos vinculados entre nós, cuidando entre nós, mais nós vamos testemunhar ao mundo que a família é fundamental na vida espiritual e na vida de Igreja.
Na comunidade
Do ponto de vista da comunidade, a família deve também traçar metas. Por exemplo, ir juntos para a Igreja, trabalhar a questão das ações eclesiais concretas que a sua comunidade está proporcionando, um vínculo com a liturgia, um vínculo com a caridade, é um vínculo com a própria Pastoral Familiar, os grupos de família. É sair do seu lar para viver essa vida comunitária de maneira intensa, se sentir comunidade, se sentir paróquia. É uma visita ao pároco, é um convite a um casal, uma visita a um outro casal…
Na sociedade
Do ponto de vista da sociedade, tem muitas possibilidades que a família pode se vincular. Sejam aquelas associações de família que buscam defender a vida, causas pró-vida, a defesa contra o aborto, que muitas vezes está muito perto de nós e temos que trabalhar na defesa do mais vulnerável. A questão também dos idosos – temos o Setor Casos Especiais da Pastoral Familiar e ali vemos que muitos idosos são abandonados – então a família tem que criar esses suportes sociais para ajudar a fazer a caridade, que não é só um trabalho filantrópico, um trabalho de doações, mas, acima de tudo, criar espaços de escuta. Muitos jovens com depressão, muitos casais se separando. Qual o local que eles têm para falar sobre isso? Locais que a comunidade tenha para ouvir aqueles que estão em crise.
Depois pode vincular-se a grupos nas redes sociais no sentido de ajudar as pessoas na superação das suas crises. Os vínculos entre as famílias têm formado associações de médicos, advogados, psicólogos, que dão uma identidade católica ao seu trabalho e que, como pais, mães, leigos e leigas, acabam dando esse suporte maior em nível social a todos aqueles que vem buscar ajuda.
Então, o serviço não pode ser uma coisa abstrata. Eu sou chamado a ser família, eu respondo a esse chamado com um sim vivendo, primeiramente, na minha casa, me vinculo à comunidade, mas também tenho que ter um trabalho em nível social, tenho que acreditar que a sociedade pode ser mudada, pode ser transformada. E isso é o mais importante. Que as famílias respondam um sim que ecoe com muita força e chegue a todos os corações. Esse sim ao chamado de Deus, que é o transbordamento do seu amor expressado na família, e o brilho dessa família a iluminar toda a sociedade. Assim nós acreditamos numa sociedade mais justa, fraterna e solidária.
Dom Ricardo Hoepers