Introdução

Dentre os muitos temas relacionados à mariologia está aquele da relação entre Maria e o Espírito Santo. Sem a extraordinária intervenção do Espírito Santo sobre, a jovem de Nazaré noiva de José, certamente teria ficado esquecida da história sendo uma como tantas outras mulheres daquele tempo.

Há uma íntima relação entre a pessoa do Espírito Santo e Maria, a mãe de Jesus Cristo. Essa relação misteriosa e única requer de todos os discípulos do Mestre a devida meditação e aprofundamento. É na Sagrada Escritura, sobretudo nos Evangelhos, onde vamos encontrar os dados fundamentais dessa relação e suas consequências. 

Para o verdadeiro devoto de Nossa Senhora esse é um tema a ser considerado e esmiuçado. Mas infelizmente é um tanto esquecido. Seria um grave desvio devocional pensar Maria simplesmente como mulher virtuosa, sem considerar a fonte da sua santidade. Por isso o autêntico devoto de Maria não se fixa nela, mas Naquele que, pelo Espírito Santo, veio ao mundo, Jesus Cristo, Senhor Nosso.

 

  1. Virgindade fecunda

Os evangelistas Mateus e Lucas ressaltam com muita clareza o estado de virgindade da jovem Maria de Nazaré. Recordemos o que afirma Lucas a respeito da missão da pessoa para a qual o anjo Gabriel dirigiu-se: “foi a uma virgem, prometida em casamento a um homem chamado José, que era descendente de Davi. E o nome da virgem era Maria” (Lc 1,27). Por duas vezes afirma que a jovem era virgem!

O evangelista Mateus, generosamente, em diversos versículos nos apresenta a situação daquela jovem nazarena. Falando da origem de Jesus escreve: “Maria, sua mãe, estava prometida em casamento a José, e, antes de viverem juntos, ela ficou grávida pela ação do Espírito Santo” (Mt 1,18). Reconhecendo o fato extraordinário recorda a profecia de Isaías: «Vejam: a virgem conceberá, e dará à luz um filho. Ele será chamado pelo nome de Emanuel, que quer dizer: Deus está conosco» (Mt 1,22-23).

O referido evangelista vai além e ainda reforça as informações anunciadas dizendo que após a crise de José, devido saber que sua noiva estava grávida, recebendo palavras explicativas e confortadoras do mensageiro divino, decidiu fazer “conforme o Anjo do Senhor lhe havia mandado: levou Maria para casa, e, sem ter relações com ela, Maria deu à luz a um filho. E José deu a ele o nome de Jesus” (Mt 1,22-25).

Esses dados são muito importantes para melhor admirarmos o extraordinário e impactante efeito do Espírito Santo em sua existência (cf. Mt 1,20). Deus gera Deus, por isso aquele que nasceu dela se chamou Emanuel, Deus conosco (cf. Mt 1,23), Filho de Deus (cf. Lc 1,35-36), Jesus o salvador do seu povo (cf. Mt 1,21), Filho do Altíssimo (cf. Lc 1,31-32).

 

  1. O Espírito Santo, fonte de fecundidade

O Espírito Santo é a fonte da fecundidade de Maria. Dessa forma Ele está para Maria, assim como o esposo para a mulher, por isso, a Igreja não ousou em afirmar que Maria é a fiel esposa do Espírito Santo (cf. Redemptoris Mater, 43). Trata-se de uma esponsalidade que foi capaz de fecundá-la, santificá-la, preservá-la em sua integridade e elevá-la à máxima dignidade diante de Deus e da humanidade.  

A fecundidade do Espírito Santo em Maria tem muitas dimensões. É biofísica, pois, por ela ficou grávida gerando uma nova vida; isso significa que o Espírito Santo pode interferir sobre a nossa condição biológica, mas sempre para elevá-la em sua saúde. A fecundidade do Espírito Santo em Maria foi também de caráter moral: com essa intervenção, Maria foi santificada, por isso ela foi cumprimentada pelo anjo Gabriel como “cheia de graça”, plena da presença santificante de Deus, ou seja, preservada de todo pecado.

Mais ainda, a fecundidade do Espírito Santo sensibilizou a virgem estimulando-a a declarar-se a serva do Senhor; é sempre o Espírito que nos predispõe para o serviço; essa sua declaração se verificou na prática quando Maria foi ao encontro da sua prima Isabel necessitada de ajuda. Essa saída de si, também revelou-se como fecundidade missionária levando à sua prima o Salvador da Humanidade no seu ventre.

Todo esse dinamismo do Espírito Santo na vida de Maria que a fecundou, que a capacitou para a maternidade, que a santificou, que a fez serva por excelência, que a acompanhou ao encontro dos mais necessitados, deve acontecer também conosco do ponto de vista afetivo, espiritual, moral e missionário. Isso significa que o autêntico devoto de Nossa Senhora, não deve de forma alguma, fechar-se num intimismo estéril e doentio porque não foi esse o dinamismo da vida de Maria de Nazaré, muito menos do seu Filho.

Uma devoção mariana que não está plasmada pela consciência e dinamismo da vitalidade do Santo Espírito se esvazia perdendo o seu sentido correndo o perigo de transformar Maria num fetiche frio, estático e longe do dinamismo do Reino de Deus.

A contínua meditação sobre a figura de Maria e sua íntima relação com o Espírito Santo nos livra de cairmos no mal da separação entre devoção, compromisso moral (crescimento e prática das virtudes) e sensibilidade missionária. Grávida por obra do Espírito Santo, com Jesus dentro de si, ela não se conteve na autocontemplação narcisística e acomodada, mas partiu apressadamente para a região montanhosa, dirigindo-se a uma cidade da Judéia para servir a quem dela precisava (cf. Lc 1,39). É permanente a restauração e o reavivamento da íntima relação entre devoção mariana e missionariedade.   

 

  1. Maria, portadora do Espírito Santo

Muito digna de atenção é a narração de Lucas a respeito dos sentimentos de Isabel ao ser cumprimentada: “Quando Isabel ouviu a saudação de Maria, a criança se agitou no seu ventre e Isabel ficou cheia do Espírito Santo” (Lc 1,41). Não se tratava de um mero impacto emocional por causa do afeto entre as duas parentas.

O texto vai além da subjetividade; de um lado temos este primeiro dado: “a criança se agitou no meu ventre”; também o bebê João Batista percebeu a extraordinariedade da pessoa que visitava a sua mãe. De fato, com a encarnação, a divindade não se apequenou e nem se reduziu. São Paulo diz: “É em Cristo que habita, em forma corporal, toda a plenitude da divindade” (Cl 2,9) e isso vem desde o início da gravidez.  Portanto, Maria é também portadora da Santíssima trindade trazendo no seu ventre o Filho de Deus em processo de encarnação, assumindo um corpo!

É por isso que na ladainha mariana se diz que Maria é “sacrário do Deus Vivo”, “arca da Aliança”, “vaso honorífico”… Todas essas lindas expressões perdem o significado se não levarmos em conta a verdadeira e plena identidade do seu Filho.

 

  1. Maria, perseverante na oração

Por último consideremos o que São Lucas nos diz nos Atos dos Apóstolos a respeito de Maria: “Todos eles tinham os mesmos sentimentos e eram assíduos na oração, junto com algumas mulheres, entre as quais Maria, mãe de Jesus, e com os irmãos de Jesus” (Atos 1,14).

Maria é a mulher fiel à Igreja, inserida na vida fraterna, comunitária, assídua na experiência da oração… Maria é a mãe que zela pela vida e bem-estar da família do seu Filho. E quando chegou o dia de Pentecostes, todos eles estavam reunidos no mesmo lugar (cf. At 2,1). A esposa do Espírito Santo intercede continuamente pela Igreja para que sempre conserve sua fidelidade, pureza e dinamismo missionário na promoção do Reino de Deus.

 

PARA A REFLEXÃO PESSOAL:

  1. O que significa para você, hoje, cultivar uma “virgindade fecunda”? Em quais dimensões?
  2. Quais realidades mais lhe chamam a atenção da relação entre o Espírito Santo e Maria?
  3. O que Maria nos ensina com o seu dinamismo missionário?

POR Dom ANTÔNIO DE ASSIS RIBEIRO, SDB

Bispo Auxiliar de Belém - PA

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Artigos de Dom Antônio Ribeiro sobre Nossa Senhora:

1 – Maria, mulher como as outras? (1)

2- Maria, mulher como as outras? (2)

3 – Grávida por obra do Espírito Santo (3)