por Vívian Marler / Assessora de Comunicação do Regional Norte 2 da CNBB

 As Conferências e Conselhos Episcopais Católicos da África, América Latina e Caribe, e Ásia uniram suas vozes em uma mensagem contundente ao mundo, com foco na realização da COP30 no Brasil, e divulgaram na manhã desta quinta-feira (13/11), um documento que exige uma ação transformadora baseada na dignidade humana, no bem comum e na justiça intergeracional, alertando que a crise climática é existencial.

Denúncias Centrais: Inação e o Paradigma da Exploração

As Igrejas do Sul Global denunciam a resposta insuficiente dos países ricos, dez anos após a publicação da Laudato Si’ e do Acordo de Paris. O aquecimento global já atingiu 1,55°C em 2024, e a ciência é clara, o risco de colapso é iminente.

O texto critica veementemente as “falsas soluções” que mascaram a real crise sistêmica citando o ‘Capitalismo Verde e Financeirização da Natureza’, ‘Tecnocracia e Extrativismo’ e ‘Monocultura Energética’.

1. Capitalismo Verde e Financeirização da Natureza: Rejeita-se a lógica de transformar bens vitais (florestas, rios, clima) em ativos negociáveis, como créditos de carbono e mecanismos de compensação, que transferem o ônus da redução de emissões para quem menos poluiu.
2. Tecnocracia e Extrativismo: O documento condena a mineração intensiva (lítio, cobalto) em prol da “transição energética”, que devasta territórios e sacrifica comunidades do Sul Global. A “economia verde” é vista como uma modernização incremental do capitalismo, focada no lucro.
3. Monocultura Energética: Megaprojetos (hidrelétricas, eólicas, solares) impostos sem consulta local são criticados por concentrar poder econômico e destruir ecossistemas.

O documento sublinha que a mudança climática agrava desigualdades, afetando desproporcionalmente mulheres, meninas e populações empobrecidas, e exige o reconhecimento da dívida ecológica e moral do Norte Global.

Propostas: Conversão Ecológica e Resistência

Em resposta à crise, as Igrejas propõem uma transformação estrutural guiada pela ecologia integral e pela “sobriedade feliz”, inspirada em Laudato Si’ e no “Bem Viver” indígena.

Os principais apelos e compromissos apresentados são:

– Implementação Urgente do Acordo de Paris: Exige-se que os Estados apresentem NDCs (Contribuições Nacionalmente Determinadas) ambiciosas e compatíveis com a meta de 1,5°C, com cronogramas definidos e verificáveis.
– Justiça Climática e Financiamento: As nações ricas devem pagar sua dívida, providenciando financiamento climático justo, acessível e eficaz para reparação de perdas e danos, sem gerar novas dívidas para o Sul Global. O financiamento deve ser direto, sem intermediários, priorizando iniciativas lideradas por mulheres.
– Transformação do Sistema Econômico: É necessário abandonar o paradigma do crescimento ilimitado. Propõe-se um modelo econômico regenerativo e distributivo, focado no bem comum, na solidariedade e no respeito aos limites planetários, incluindo metas de decrescimento do consumo excessivo.
– Defesa Territorial e Direitos Humanos: É imperativo proteger os territórios ancestrais de povos indígenas, tradicionais e camponeses, reconhecendo a agricultura familiar como pilar da segurança alimentar. As políticas climáticas devem ser ancoradas nos direitos humanos e dar atenção especial às mulheres e às comunidades vulneráveis à migração climática.
– Governança Participativa: Exigência de mecanismos de governança climática com participação ativa e vinculante das comunidades, da sociedade civil e das organizações baseadas na fé na tomada de decisões.

A mensagem conclui com um “chamado à resistência, ao fortalecimento comunitário e à esperança”, anunciando a criação do ‘Observatório Eclesial sobre Justiça Climática pela Conferência Eclesial da Amazônia’, que terá a missão de monitorar e denunciar o descumprimento dos acordos globais.

As Igrejas reafirmam sua missão profética, buscando construir uma “coalizão histórica” entre o Norte e o Sul Global, pautada na ética e na justiça, para garantir um futuro habitável para todas as formas de vida.

Este documento, fruto do discernimento coletivo das Igrejas da África, América Latina e Caribe, e Ásia, emerge em um momento de gravidade extrema para o planeta, com a COP30 sediada em Belém (10 a 21/11). Inspirados pela Laudato Si’ do Papa Francisco e pelo chamado do Papa Leão XIV a uma ecologia integral, os bispos unem suas vozes proféticas do Sul Global para exigir uma implementação ambiciosa do Acordo de Paris e denunciar a inércia diante do colapso climático. A mensagem dirige-se aos líderes governamentais, à Igreja e ao público geral, convocando a uma profunda conversão ecológica que transcenda meros ajustes técnicos e financeiros.

“A crise climática é uma realidade urgente, com o aquecimento global atingindo 1,55°C em 2024, e não é apenas um problema técnico, mas uma questão existencial de justiça, dignidade e cuidado com a Casa Comum. A ciência é clara: o limite de 1,5°C deve ser mantido para evitar catástrofes, sofridas desproporcionalmente pelo Sul Global e pelas gerações futuras. Rejeitamos enfaticamente as “falsas soluções” – como o capitalismo “verde”, a tecnocracia e a mercantilização da natureza – que perpetuam a exploração e a injustiça.

Em seu lugar, exigimos Equidade, onde nações ricas paguem sua dívida ecológica com financiamento climático justo para reparar perdas e danos sem endividar o Sul. Exigimos Justiça, através do decrescimento econômico, o fim dos combustíveis fósseis e a taxação adequada de quem lucrou com a crise, inaugurando uma governança que priorize as comunidades mais afetadas. A Proteção deve se estender aos povos indígenas, ecossistemas e comunidades empobrecidas, reconhecendo a migração climática como um desafio de direitos humanos”, diz parte do texto no documento.

A Igreja Católica reafirma que não se limitará a palavras, mas que defendeá os vulneráveis, educará para a ecologia integral e a “sobriedade feliz”, fortalecerá a aliança intercontinental do Sul Global e irá monitorar os resultados das COPs através de um Observatório de Justiça Climática, convidando a toda a populção a uma coalizão histórica entre o Norte e o Sul Global para enfrentar as crises com solidariedade.

O Chamado à Ação é claro. Os tomadores de decisão devem cumprir o Acordo de Paris, implementar NDCs à altura da urgência climática, priorizar o bem comum acima do lucro, transformar o sistema econômico em um modelo restaurador para o bem-estar das pessoas e ancorar políticas climáticas nos direitos humanos. O documento exige o desmatamento zero até 2030 e o compartilhamento de soluções tecnológicas éticas, descentralizadas e apropriadas.

A análise do Documento Base detalha a insuficiência das soluções atuais. A meta financeira anual de 300 bilhões de dólares é conservadora e aquém dos 500 bilhões necessários apenas para adaptação. A dívida climática do Norte Global, enriquecido historicamente às custas do Sul, alcançará 192 trilhões de dólares até 2050. A falta de justiça reparadora empurra comunidades vulneráveis para o endividamento.

Além disso, o documento denuncia o negacionismo das elites do poder, que ignoram a responsabilidade humana no clima. As negociações nas últimas COPs mostram-se distantes das mudanças estruturais necessárias, com as NDCs dos países longe do que exige o rumo perigoso atual.

No que tange aos caminhos para a conversão ecológica, a sobriedade feliz, que busca limitar o consumo excessivo em favor de uma vida mais plena e integrada, alinha-se ao conceito indígena de “Bem Viver”. É proposto ações concretas, como ‘Sobriedade como resistência ao consumismo’, ‘Educação para a ecologia integral’, ‘Fortalecimento das comunidades locais em seus territórios’, ‘Diálogo permanente com a comunidade científica’ e ‘Promoção de narrativas de esperança’ que reforcem o cuidado comum entre as gerações.

A seção “Quem destrói a terra e quem oferece falsas soluções” critica a contradição de usar lucros de petróleo para financiar uma transição energética que não visa a superação dos combustíveis fósseis. Condenamos a lógica da “economia verde” como modernização incremental do capitalismo, que precifica a natureza como ativo negociável. Questionamos propostas como a financeirização da natureza, créditos de carbono – e a mineração desenfreada para tecnologias “limpas” (lítio, cobalto), que devasta territórios e sacrifica comunidades sob a ideologia de crescimento ilimitado. E informam que o foco deve ser uma economia regenerativa e distributiva, alinhada aos limites planetários, que substitua a lógica do lucro pela lógica do cuidado.

As exigências finais à COP30 enfatizam a necessidade de planos justos e participativos, com o protagonismo das comunidades mais afetadas. “Defendemos a soberania dos territórios ancestrais, a proteção da agricultura familiar como garante da segurança alimentar, a Promoção da igualdade com responsabilidades diferenciadas no pagamento da dívida ecológica, e a Centralidade da dignidade humana e dos direitos da Terra. A Migração Climática deve ser urgentemente reconhecida como um tema de direitos humanos, com financiamento específico para perdas e danos não econômicos”, enfatiza os representante das Conferências e Conselhos Episcopais Católicos da África, América Latina e Caribe, e Ásia, no documento.

O documento é concluído com um chamado à resistência, ao fortalecimento comunitário e à esperança. A COP30 deve ser um marco de articulação intercontinental e transformação real, guiada pela força das comunidades e pela sinodalidade. As Igrejas do Sul Global são sementes de um futuro novo, e através do recém-criado Observatório Eclesial sobre Justiça Climática, continuarão a vigiar e denunciar o descumprimento dos acordos. Este é um apelo final por amor e unidade para “construir um mundo novo onde reine a paz”.

Fruto do discernimento coletivo das Igrejas da África, América Latina e Caribe, e Ásia, em preparação para a COP30 no continente da esperança, invocando a inspiração do Espírito Santo e em comunhão com a missão da Igreja universal.

Leia o documento na integra, abaixo:

PT_As Igrejas do Sul Global por ocasião da COP30 (1)

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