Dom Antônio de Assis Ribeiro
Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém

Introdução

O líder tem a missão de cuidar das pessoas, estimulá-las, animá-las, promovê-las, envolvê-las, corresponsabilizá-las na missão fomentando a busca de respostas a desafios e problemas. Todavia, isso só será possível se o mesmo for portador das virtudes da sensibilidade e da inquietude. A inquietude é uma das mais significativas características de quem é líder; o seu contrário é a passividade, ausência de preocupações, saciedade, satisfação, contentamento, acomodação, permanência na zona de conforto!

Um líder, ou qualquer pessoa que tenha um cargo de responsabilidade, que viva nessa situação, não vai contribuir para o desenvolvimento de ninguém e, por consequência, se for o caso, nem de nenhuma instituição. A quietude é ausência de visão empreendedora e de ânimo para tomar providências necessárias.

Na dimensão pastoral a inquietude é a paixão pela promoção do Reino de Deus, que gera na pessoa do líder um forte dinamismo empreendedor, como atitude de preocupação, de zelo e esforço corajoso e inteligente buscando respostas para os problemas e ameaças. É justamente isso que vamos perceber nas atitudes do Bom Pastor (cf. Ez 34,1-17) que ainda iremos refletir mais adiante.

O Papa Francisco tem nos estimulado desde o início do seu pontificado a evangelizar com ousadia, criatividade, buscando novas estradas, ousando possibilidades inéditas, redimensionando o que necessita, sem jamais deixar-se vencer pelo medo. “Uma das tentações mais sérias que sufoca o fervor e a ousadia é a sensação de derrota que nos transforma em pessimistas lamurientos e desencantados com cara de vinagre. Ninguém pode empreender uma luta, se de antemão não está plenamente confiado no triunfo. Quem começa sem confiança, perdeu de antemão metade da batalha e enterra os seus talentos” (EG, 85). Se não avançarmos, corremos o perigo da estagnação (cf. EG, 129).

 

  1. Os prejuízos da Liderança de manutenção

A razão de ser do líder na Igreja é a promoção da evangelização e, esta não nos deixa tranquilos e passivos, por causa da urgência do Reino de Deus. Na Exortação Apostólica Evangelii Gaudium o sumo pontífice retoma o que já tinham afirmado os Bispos latino-americanos no Documento de Aparecida, que «não podemos ficar tranquilos, em espera passiva, em nossos templos», sendo necessário passar «de uma pastoral de mera conservação para uma pastoral decididamente missionária» (EG,15).

Uma liderança conservadora se preocupa unicamente com a manutenção daquilo que já existe. Mas quem no exercício de suas responsabilidades de liderança está preocupado unicamente em manter o que existe, está gerando prejuízo, porque a Igreja e a sociedade são dinâmicas. A liderança de manutenção não se sintoniza com o dinamismo do ser humano, naturalmente inquieto, nem com o contexto sociocultural sempre em estado de mutação.

A liderança de manutenção gera graves prejuízos para os liderados, porque inibe o progresso e o desenvolvimento das pessoas e das instituições, nega as possibilidades de novas respostas para os desafios não ousando aquilo que é possível e inédito, evita analisar questões que exigem mudanças de concepção e postura, causa a perda de oportunidades de avançar, bitola as pessoas tornando-as míopes, dormentes, alienadas, ingênuas, fundamentalistas; a liderança conservadora obcecada pela pura manutenção do existente tem uma concepção estática da Igreja e nem considera o dinamismo do Reino de Deus; nega a necessidade da formação das pessoas numa perspectiva holística e atenta à realidade mutante, evita qualquer forma de enfrentamento dos novos desafios, não se preocupa com as perdas, se enfraquece; a liderança de perfil preservacionista é autodefensiva, protecionista, acomodada, focada na estabilidade e na pura continuidade daquilo que existe. Contudo, como bem sabemos, muitas coisas perdem o valor, tornam-se caducas e perdem a significativa, gerando grave atraso para os liderados. Mas a fecundidade da Igreja deve estar sempre gerando coisas novas como ela é dinamizada pelo Espírito Santo.

 

  1. A visão empreendedora da liderança

A liderança é uma realidade profundamente dinâmica e empreendedora porque significa cuidar, animar, orientar, acompanhar, apontar rumos, estimular o discernimento de respostas para os problemas. Isso está relacionado a uma grande lista de atitudes consequente de uma série de virtudes como a sensibilidade, a percepção de oportunidades, a visão de novos horizontes, o otimismo diante dos desafios, a coragem para arriscar, a criatividade, a capacidade de diálogo e negociação, o discernimento e estudo daquilo que é possível respeitando o essencial imutável, a convicção de que a autêntica fidelidade é dinâmica e não estática.

A visão empreendedora da liderança é caracterizada pelo impulso da Esperança, da consciência de liberdade e responsabilidade, da abertura ao novo, da busca da realização de nobres ideais. A visão empreendedora da liderança é manifestação de consciência de Responsabilidade Social, por isso, não pode ser passiva, mas profundamente proativa, sugestiva, hábil, industriosa, crítica, ousada, sonhadora.

 

  1. A sensibilidade empreendedora na Bíblia

Encontramos na Bíblia muitos líderes empreendedores. Antes de tudo, Deus é aquele que tudo lidera com inteligência, ordem, sabedoria e harmonia. No relato da criação a ação divina é criadora, criativa, provocadora do novo! O ser humano (homem e mulher), sendo criado à imagem e semelhança de Deus foi chamado a crescer, a ser fecundo, dominar o resto das criaturas e a cuidar delas (cf. Gn 1,26-31).

No livro do Gênesis temos muitos exemplos de liderança empreendedora, como aquela de Noé construindo a Arca, com sua família (cf. Gn 6-7). Um bom e grande empreendimento tem como objetivo a salvação de todos. Na narração da construção da torre de Babel encontramos outra referência ao empreendedorismo, mas negativo. Essa negatividade está relacionada à postura orgulhosa e prepotente dos construtores; a liderança empreendedora, fechada em si mesma, é destrutiva. O empreendedorismo solitário é um mal; e isso de modo algum é bem-vindo na Igreja. Tem gente que só sabe liderar se for sozinho, sem senso de colegialidade. Líderes desse calibre provocam graves perdas aos liderados!

Enfim, Deus desafia Abraão a sair de sua terra, de sua pátria, do seu contexto de vida e a partir rumo ao desconhecido. Ele acredita, apesar das possibilidades remotas, faz a sua parte contribuindo com a realização desse desafio que durará séculos. Abraão nos educa para sabermos assumir empreendimentos a longo prazo. Líderes imediatistas só olham o presente. Líderes empreendedores são visionários. Também são dignos de menção outros grandes líderes empreendedores como Moisés, Josué, Neemias, Esdras, o rei Salomão.  Deus é aquele que faz coisas novas (cf. Is 43,19).

No Novo Testamento também encontramos referência à liderança inquieta e empreendedora na parábola do Bom Pastor, na parábola do Bom Samaritano, na parábola dos talentos. Jesus no deserto, diante da fome do povo, dá uma ordem aos discípulos: “Dai-lhes vós mesmos de comer!” (Mc 6,37). Diante de Pedro, cansado, com sono e faminto, lhe diz: “Avance para águas mais profundas…” e ao povo, “lancem as redes” (Lc 5,4). Jesus declara “tenho ainda outras ovelhas que não são deste curral. Também a elas eu devo conduzir” (Jo 10,16). O Papa Francisco nos fala da necessidade de “sair da própria comodidade e ter a coragem de alcançar todas as periferias que precisam da luz do Evangelho” (EG,20). “A missão é um estímulo constante para não nos acomodarmos na mediocridade, mas continuarmos a crescer” (EG, 121). O líder que não contribui para que a Igreja seja fiel à sua missão, está atrapalhando e gerando prejuízos. Avançar é preciso!

PARA A REFLEXÃO PESSOAL:

  1. Por que muitos líderes se acomodam?
  2. Quais são as consequências da falta de inquietude e de visão empreendedora de um líder?
  3. Quando a experiência empreendedora de um líder é negativa?