DOM ALBERTO TAVEIRA CORRÊA
Arcebispo Metropolitano de Belém do Pará
Os acontecimentos da vida correm quase na velocidade das notícias, quando já vivemos na chamada aldeia global prevista por alguns. Podemos, então, ter várias atitudes. Para algumas pessoas, a tendência é chorar de forma bucólica o tempo passado que, esse sim, teria sido melhor. Pode haver gente que quer viver em lugares distantes, mas não dispensa para si e para os seus os recursos de bem- estar e tecnologia. Não é raro ver pessoas que simplesmente se isolam, “esperando a morte chegar”. Existem ainda aqueles que assumem atitude de revolta, acusações de todo tipo diante do mundo atual. É claro que muitos abraçam a própria vida, com seus desafios, cuidando responsavelmente de si, de sua família e do mundo, oferecendo a própria contribuição positiva para melhorar tudo o que existe.
Nós fomos criados por Deus, através do ato de amor de nossos pais, estamos vivendo neste mundo e neste tempo, que se chama século XXI, somos responsáveis pela nossa própria vida e sabemos que um dia chegará nossa Páscoa pessoal e definitiva, na morte que não precisamos antecipar, pois chegará na melhor hora, segundo a visão de Deus, que é o Senhor do tempo. Sim, ninguém morre antes da hora, se vivermos bem, lutando pela vida pessoal e dos outros, ajudando a fazer um mundo novo, que é possível, pela graça de Deus.
Além das eventuais mortes que devemos encarar no correr do ano, a Igreja, em sua sabedoria, oferece-nos a Comemoração de todos os fiéis defuntos, celebrada no último dia 2 de novembro. Os que visitaram os cemitérios, esperamos que tenham ido para meditar com seriedade sobre o mistério da vida e da morte. Muitos levaram flores, e estas querem dizer que pensamos não apenas nas sementes, os corpos dos falecidos, ali plantados, mas também nos frutos, a vida junto de Deus. Esperamos que tenham pensado na morte do lado de quem partiu, ou melhor, que já chegou, pois de Deus nascemos, para ele vivemos e somos chamados a repousar nele. Se apenas para esta vida está nossa confiança, somos dentre todos os mais dignos de dó! Para os cristãos, a Cruz plantada nas sepulturas indica que a pessoa falecida morreu em Cristo e aceitou o valor redentor da morte e ressurreição de Cristo!
Para nossa animação diante da vida e o fortalecimento de nossa esperança, a Igreja não para na morte, mas celebra o dia de todos os santos. A morte é passagem e a vida plena se encontra no Céu junto de Deus. Santos e Santas são as pessoas que já contemplam a face de Deus. Quando beatificados e canonizados, são reconhecidas como exemplo de vida para quem está a caminho aqui nesta terra. Além de quem foi reconhecido publicamente, há no Céu uma multidão, que não sabemos contar, cujo encontro poderemos experimentar, quando chegar a nossa hora. Para chegar lá e chegar bem, somos chamados a reconhecer que somos filhos de Deus (1Jo 3,1-3) e temos um roteiro de vida, proposto por Jesus nas Bem- aventuranças (Mt 5,1-12), Evangelho que é proclamado na Solenidade de Todos os Santos. Vejamos a sabedoria da Igreja: fomos batizados, temos as orientações para viver aqui na terra na fé, esperança e caridade, preparamo-nos para a Páscoa definitiva da morte, vivendo bem cada momento presente na fé, esperança e caridade. No final de nossa vida nesta terra, levaremos a caridade vivida!
Há poucos dias, o Papa Francisco pronunciou palavras muito fortes e positivamente provocantes: “As bem-aventuranças são dirigidas aos pobres, aos aflitos, os que têm fome de justiça. É uma mensagem contracorrente. O mundo, e de fato, diz que para ter felicidade deve-se ser rico, poderoso, sempre jovem e forte, gozar de boa fama e de sucesso. Jesus inverte estes critérios e faz um anúncio profético, e esta é a dimensão profética da santidade: a verdadeira plenitude da vida só pode ser alcançada seguindo a Jesus, praticando a sua Palavra. É isso significa uma outra pobreza, ser pobre dentro, esvaziar-se de si mesmo para dar espaço a Deus. Quem se acha rico, vencedor e seguro, fundamente tudo em si mesmo e se fecha para Deus e aos irmãos, enquanto quem toma consciência de ser pobre e não se bastar a si mesmo, permanece aberto a Deus e ao próximo. E encontra a alegria. As bem-aventuranças são, pois, a profecia de uma humanidade nova, de um novo modo de vida: fazer-se pequeno e confiar em Deus, ao invés de querer passar por cima dos outros, agir com mansidão ao invés de querer impor- se; praticar a misericórdia ao invés de pensar só a si mesmo; empenhar-se pela justiça e a paz, não alimentando, também com a convivência, injustiças e desigualdades. Santidade é acolher e colocar em prática, com a ajuda de Deus, esta profecia que revoluciona o mundo. Então, podemos perguntar-nos: Eu testemunho esta profecia de Jesus? Exprimo meu espírito profético recebido no Batismo? Ou me adapto às comodidades da vida e à minha preguiça, pensando que tudo vai bem se está bem para mim? Sou capaz de levar ao mundo a alegre novidade da profecia de Jesus ou as costumeiras lamentações por aquilo que não vai bem? São perguntas que nos farão muito bem!” (Ângelus do dia 01.11.2021).
As duas comemorações são feitas pela Igreja Católica como celebrações litúrgicas, nas quais sempre tornamos presente a Morte e a Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo. “Cristo, ontem e hoje, princípio e fim, Alfa e Ômega. A Ele o Tempo e a Eternidade, a Glória e o Poder, pelos séculos sem fim. Amém” (Liturgia da Vigília Pascal). Todos os dias de nossa vida na terra serão oportunos para proclamar esta verdade!