UM ANO DEDICADO À ORAÇÃO

por Dom Alberto Taveira Correa
Arcebispo Metropolitano da Arquidiocese de Belém

A cada vinte e cinco anos a Igreja celebra um Jubileu, ano forte de peregrinações e de pregação intensa da Palavra de Deus, a partir de um tema proposto pelo Papa. E o Papa Francisco, com grande lucidez, escolheu para o Jubileu de 2025 o tema “Peregrinos da esperança”, justamente porque os fatos acontecidos nos tempos que correm põem em risco justamente a Esperança, uma
das Virtudes Teologais, essencial, por ser dada por Deus na graça de nosso Batismo, para responder aos presentes desafios.

Ao preparar-nos para o Grande Jubileu, foi-nos proposto o ano de dois mil e vinte e três, com o esforço para redescobrir o Concílio Vaticano II e suas consequências para nossa vida cristã. Nossa Igreja de Belém promoveu estudos sobre o Concílio e incentivou a leitura de seus Documentos. Para dois mil e vinte e quatro, o Papa promulgou um Ano dedicado à Oração, com um profundamento da oração do Pai Nosso. A convite do Papa, queremos dedicar o ano de dois mil e vinte e quatro a uma grande “sinfonia” de oração, em que os corações se abram para receber a abundância da graça, fazendo do “Pai Nosso”, a oração que Jesus nos ensinou, o programa de vida de todos os seus discípulos.

A Coordenação de Pastoral da Arquidiocese está elaborando propostas, a partir do Plano Arquidiocesano de Pastoral, dentre as quais desejamos antecipar iniciativas que podem ser assumidas pelas Regiões Episcopais, Paróquias, Pastorais, Comunidades, Comunidades Religiosas, Comunidades de Vida e Movimentos Apostólicos e de Espiritualidade. Desejamos que se organizem
Retiros e encontros de espiritualidade em todos os níveis, a partir do da Exortação Apostólica “Evangelii Gaudium”, um texto que será referência para a formação neste ano. Todos os momentos de espiritualidade de Pastorais, Movimentos e serviços busquem seu conteúdo neste Documento do Papa.

Solicitamos de forma especial ao Setor Juventude que ofereça tais experiências aos nossos jovens. Durante o ano dedicado à Oração, as Paróquias organizem visitas de oração de porta em porta, assim como a Bênção das casas e das famílias, especialmente no Tempo Pascal. Pensamos num grande mutirão de presença nas casas! E unidos a isso, a organização de grupos permanentes de Evangelização nas famílias, no estilo dos grupos de peregrinação do Círio, valorizando a dinâmica do Ano Litúrgico. E os Movimentos que têm Grupos de Oração saibam redescobrilos e valorizá-los, dando-lhes um novo e corajoso impulso.

Nossas Paróquias se empenhem em valorizar os cristãos católicos que frequentam habitualmente cada uma delas. São preciosas sua participação na Liturgia e sua capacidade de envolver capilarmente os mais distantes, com um convite à participação na Santa Missa Dominical. Além disso, sendo a Eucaristia a oração por excelência, multipliquem-se as celebrações das Missas nos Setores ou outras formas de organização do território paroquial. São impressionantes os frutos das celebrações nas ruas, bem preparadas e participadas, nas Paróquias que já utilizam este método apostólico!

E aqui chegamos a uma das Pastorais que se desenvolvem com maior articulação em nossa Arquidiocese, a Pascom, Pastoral da Comunicação. Deus seja louvado especialmente pela juventude que se envolve na transmissão de celebrações litúrgicas e outras atividades, utilizando as plataformas digitais disponíveis. Para o Ano da Oração, podem pensar em programas especiais com tempos de oração, como o Rosário Meditado, a serviço das Paróquias e da Arquidiocese!

Ampliando nosso horizonte, os Meios de Comunicação da Arquidiocese, com a Fundação Nazaré de Comunicação, realizarão programas e eventos especiais, além daqueles já existentes, inclusive com colunas específicas em vista da preparação do Ano Jubilar. Nossa Comissão Arquidiocesana de Formação, que está empenhada em oferecer um programa de Formação de Lideranças para as Comunidades, receba agora mais um tarefa, entrando em contato com grupos muito experimentados neste campo, como as Oficinas de Oração e Vida, para disponibilizar uma verdadeira Escola de Oração, nas dimensões bíblica, litúrgica e catequética, a serviço do Povo de Deus, em atividades presenciais ou pelos meios de comunicação e Redes Sociais.

Nossa Faculdade Católica de Belém pode oferecer estudos específicos, a modo de Seminários ou Simpósios sobre a vida de oração na Igreja, assim como oferecer celebrações litúrgicas abertas ao Povo de Deus nos tempos fortes da Liturgia, com a competência que lhe é própria. Por graça de Deus, começa a se instalar em nossa Arquidiocese o Mosteiro de São Bento de Belém, com doze monges beneditinos, cujo louvor perene se abre nesta semana, em sua sede provisória, na parte antiga do Colégio Santo Antônio, com a oportunidade. No dia 31 de dezembro, às 8 horas, haverá também uma Missa Solene presidida pelo Arcebispo. Trata-se de um Centro de oração contemplativa que enriquece a vida espiritual de nossa Arquidiocese!

Para a formação pessoal sobre a oração, propomos que todos os fiéis conheçam textos preciosos do magistério, como a Catequese do Papa Bento XVI, “O homem em oração”, do dia quatro de maio de dois mil e onze, assim como a excelente série de dezesseis catequeses do Papa Francisco sobre a Oração, de cinco de dezembro de dois mil e vinte e dois até vinte e dois de setembro de dois mil e vinte e dois, disponíveis em português no site do Vaticano.

Oportunamente o tema da oração retornará em nossos meios de Comunicação, para que ponhamos em prática a recomendação de São Paulo: “Orai continuamente. Dai graças, em toda e qualquer situação, porque esta é a vontade de Deus, no Cristo Jesus, a vosso respeito” (1 Ts 6,17-18)

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As celebrações litúrgicas da Igreja trazem para dentro dela e envolvem os corações dos fiéis, como memorial que torna presentes os mistérios de nossa salvação. Ao mesmo tempo, fazem acontecer, aqui e agora, aquilo que significam. Além disso, antecipam a plenitude da vida em Deus que todos buscamos. É por isso que muitas vezes experimentamos verdadeiro paraíso numa liturgia bem celebrada. Mas sabemos que, de fato, “o que Deus preparou para os que o amam é algo que os olhos jamais viram, nem os ouvidos ouviram, nem coração algum jamais pressentiu” (1 Cor 2,9). A experiência do amor de Deus nos remete sempre ao infinito, onde tudo será dom gratuito, na liberdade para a qual fomos por ele criados, para sermos santos como ele é santo. Também os outros atos da vida da Igreja, que desembocam na liturgia ou dela nascem, podem e devem levar as pessoas e as comunidades à experiência da gratuidade, da alegria plena, do infinito. Eis porque o Círio de Nazaré nos conduz a grandes e frutuosos arroubos de sincera e autêntica liberdade.

Entretanto, sabemos que a liturgia e a devoção popular, como o Círio de Nazaré, se realizam através de gestos e atos bem humanos, passando pelos sentidos: audição, visão, olfato, paladar e tato. Durante os dias do Círio, estes sentidos, com os quais nos comunicamos uns com os outros e com o mundo, suscitaram em mim reflexões sobre a profundidade do amor de Deus, que vem ao nosso encontro, na beleza do mistério da Encarnação do Verbo, cujos desdobramentos nos alcançam através de elementos da natureza e, ao mesmo tempo, nos superam infinitamente.

Sabemos que a fé vem pelo ouvido. “Todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo. Ora, como invocarão aquele em quem não creram? E como crerão naquele que não ouviram? E como o ouvirão, se ninguém o proclamar? E como o proclamarão, se não houver enviados? Assim é que está escrito: ‘Felizes os pés dos que anunciam boas novas!’ Mas nem todos obedeceram à Boa Nova, pois Isaías diz: ‘Senhor, quem acreditou em nossa pregação?’ Logo, a fé vem pela pregação e a pregação, pela palavra de Cristo” (Rm 10,13-17). A pregação da Palavra de Deus é abundante na preparação e realização do Círio, desde os livros de peregrinação, passando pelos retiros da Diretoria, refletindo na escolha do tema de cada ano. E durante a quadra nazarena, duas semanas de intensa pregação da Palavra, quando a Arquidiocese convida Bispos de nossa região e de outras partes do Brasil. Por sua vez, a pregação da Palavra suscita a resposta da fé, o louvor, a ação de graças, o pedido de perdão e a súplica. Na única das grandes procissões que pudemos fazer neste ano, por causa dos limites estabelecidos pelas autoridades, pude arriscar-me a perguntar a quem estava comigo no veículo que levava a berlinda, quantas vezes daquele dia as pessoas fizeram o sinal da Cruz, rezaram o Pai Nosso e a Ave Maria. Foram milhões de vezes e milhões de vozes que subiam ao Céu!
Tivemos a graça de ver as multidões, contemplar a beleza da Berlinda principal, a criatividade nas muitas berlindas, oratórios e enfeites das residências e casas de comércio. Passamos por lugares diferentes daqueles usuais do translado para Ananindeua e Marituba, casas novas ou velhas, ruas bem cuidadas ou não, mas todas as vias engalanadas pela visita da Imagem Peregrina. Mais ainda na beleza inigualável estavam as pessoas. Belas eram as mãos postas, formosos os pés e joelhos que anunciavam a paz ao prestar sua devoção a Maria. Brilhos maravilhosos de suor enfeitavam as faces de homens e mulheres. A criançada era semelhante a uma revoada de pássaros, tamanha a alegria retratada. Ao contemplar a Imagem de Nossa Senhora de Nazaré, vendo-a passar perto, acontecia um misto de sorrisos, lágrimas e aclamações, como um eco que parecia infinito: Viva Nossa Senhora de Nazaré!
O olfato não nos conduziu, desta vez, ao cheiro de suor e cansaço de um Círio tradicional. Entretanto, faz parte do Círio o paladar paraense, a grande força da família que se reúne para o almoço do domingo, e este chama também pessoas de outras profissões religiosas. E pela também mesa e pelos temperos o Círio gera fraternidade. E os restaurantes e lanchonetes fizeram a festa, especialmente na acolhida de turistas.
Entretanto, pensei em referir-me mais a outro paladar.

A Igreja reza e canta assim: “Do Céu lhes destes o Pão, que contém todo sabor! Senhor Jesus Cristo, que neste admirável Sacramento nos deixastes o memorial de vossa Paixão, concedei-nos tal veneração pelos Sagrados Mistérios do vosso Corpo e do vosso Sangue, que experimentemos sempre em nós a sua eficácia redentora”. Jesus é quem nos dá de verdade o Pão do Céu, e ele contém todo sabor. Todos os frutos na vida cristã podem florescer a partir de nossa participação e comunhão do Pão da Vida. Receber o Corpo e Sangue de Cristo é transformar-nos naquele que recebemos, para que sejamos comunhão de vida e amor para os irmãos. Quem comunga na mesa sagrada há de tornar-se comunhão, no serviço e na caridade com o próximo fazendo de sua vida um contínuo e criativo lava-pés. Aliás o Círio de Nazaré, não só no lava-pés da Casa de Plácido, para o qual tantas pessoas se candidatam e experimentam de verdade os apelos do serviço humilde e silencioso, mas em tantos outros gestos e serviços, como as Paróquias outras instituições que se organizam para atender os peregrinos que chegam a Belém.

Que dizer da alegria no rosto dos membros da Diretoria da Festa, ou os Guardas de Nazaré e outras guardas que ajudam? E como calcular milhares de voluntários, homens e mulheres, militares, funcionários públicos, autoridades? E o Círio acontece na desembocadura de um verdadeiro rio de iniciativas, visitas da Imagem Peregrina e outros acontecimentos suscitados pelo Espírito Santo nas pessoas e instituições!
Podemos concluir nossa percepção do conjunto retomando o tema escolhido para o Círio de 2021, antes mesmo de saber que o Papa proclamaria o ano de São José e um ano para valorizar e aprofundar a “Amoris Laetitia”, Deus nos deu a graça de estar em sintonia com a Igreja: “O Evangelho da Família na Casa de Maria”.