Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo Metropolitano de Belém

“Corações ardentes, pés a caminho” (Cf. Lc 24,32-33). A experiência do encontro com o Senhor Ressuscitado, feita pelos discípulos de Emaús, tem iluminado nossa reflexão e as celebrações litúrgicas na Grande Páscoa que estamos vivendo, para chegar ao dom precioso de Cristo, que é o Espírito Santo, no Pentecostes, além de vivermos o Ano Vocacional, com este tema positivamente provocante. Em nossa Arquidiocese de Belém, este é também o lema escolhido por Dom Paulo Andreolli, ordenado Bispo há poucos dias, um missionário apaixonado pela proclamação do Evangelho a todos e empenhado em suscitar o espírito missionário em nossa Igreja.

Os Discípulos de Emaús tornam-se para nós uma referência, a fim de que todos descubram seu lugar e missão na Igreja. De fato, as estradas são diversas, mas a todos o Senhor se dirige. A leitura e a meditação do texto de São Lucas me fizeram recordar Abbé Pierre, um sacerdote fundador dos “Trapeiros de Emaús”, cuja atividade conheci há muitos anos. Ele foi chamado para atender um homem que tinha tentado contra a própria vida. Ouvindo sua história, não o julgou, mas apenas pediu-lhe que, antes de morrer, ajudasse a construir algumas casas. Disse que outros precisavam dele, o que o fez reencontrar o sentido de viver, que é amar e sofrer para que os outros sofram menos. Este homem foi viver com o sacerdote, constituindo a primeira Comunidade de um Movimento que se espalhou por todo o mundo. Aqui também, entre nós, todos recordamos a experiência iniciada com Padre Bruno Sechi, inclusive com o mesmo nome de Movimento de Emaús, influenciada por este modo de trabalhar. Que tal sair de nós mesmos para ajudar os outros?

Um andarilho, uma pessoa que está ao lado num coletivo, um jovem drogado, o doente no hospital, as inúmeras necessidades das pessoas, são os instrumentos que Deus pode transformar em canais da graça do chamado, para que iluminar os passos a serem dados. Pode ser o testemunho ou o conselho de um sacerdote, de uma pessoa bem realizada no Matrimônio, o grito de socorro daquele que está deprimido, o exemplo de missionários e missionárias, tudo pode ser início de um processo vocacional. Os fatos da vida e o encontro com os sofredores são caminhos para o chamado de Deus!

Deus entra na vida das pessoas através do anúncio da Boa Nova, como os peregrinos de Emaús acolheram a palavra de Jesus. Conheço gente que se deixou tocar para uma missão na Igreja através da pregação, o anúncio explícito de Jesus Cristo como Senhor e Salvador, semelhante ao que Simão Pedro pregou após a Descida do Espírito Santo: “Homens da Judéia e todos vós. Escutai-me com toda a atenção. Estes aqui não estão embriagados, como podeis pensar, pois estamos ainda em plena manhã. Está acontecendo o que foi anunciado pelo profeta Joel: Derramarei do meu Espírito sobre toda carne, e vossos filhos e filhas profetizarão, os vossos jovens terão visões e os vossos anciãos terão sonhos; mesmo sobre os meus escravos e escravas derramarei do meu Espírito, naqueles dias, e profetizarão. E todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo’. Escutai estas palavras: Jesus de Nazaré foi um homem credenciado por Deus junto de vós, pelos milagres, prodígios e sinais que Deus realizou entre vós por meio dele, como bem o sabeis. Deus, em seu desígnio e previsão, determinou que Jesus fosse entregue pelas mãos dos ímpios, e vós o matastes, pregando-o numa cruz. Mas Deus o ressuscitou, libertando-o das angústias da morte, porque não era possível que ela o dominasse. Assim, ele previu a ressurreição do Cristo e é dela que disse: não foi abandonado no mundo dos mortos, e sua carne não conheceu a decomposição. De fato, Deus ressuscitou este mesmo Jesus, e disso todos nós somos testemunhas. E agora,
exaltado pela direita de Deus, ele recebeu o Espírito Santo que fora prometido pelo Pai e o derramou, como estais vendo e ouvindo” (Cf. At 2,14-33). O vigor da pregação suscitou as primeiras conversões! O anúncio do Querigma suscita a resposta ao chamado!

Quando os Discípulos de Emaús chegaram ao seu destino, o viandante fez de conta que ia mais adiante, mas acolheu o convite que ressoa até hoje: “Fica conosco, pois é tarde e a noite vem chegando”. Trata-se do convívio, a partilha de vida, a fraternidade vivida. Logo o Senhor desapareceu, mas devem ter se lembrado de suas palavras: “Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, eu estou ali, no meio deles” (Mt 18,20). Quantas vezes tive a alegria do diálogo com pessoas que experimentaram a graça de verem quase dissolvidas suas dúvidas e resolvido seus problemas quando experimentaram o amor mútuo, que “atrai” a presença de Jesus ao nosso meio! Graça de vocação, pois um terceiro, de nome Jesus, está presente!

Ali mesmo em Emaús, tudo indica que o texto, ao ser escrito, refletia a experiência eucarística das primeiras comunidades cristãs: “Depois que se sentou à mesa com eles, tomou o pão, pronunciou a bênção, partiu-o e deu a eles. Neste momento, seus olhos se abriram, e eles o reconheceram” (Lc 24,30-31). Até hoje e até a volta do Senhor, o Pai não deixa de reunir seu povo, para que lhe ofereça em toda parte, do nascer ao pôr-do-sol, um sacrifício perfeito (Cf. Oração Eucarística III). Quantas e muitas vezes acolhi jovens que, tendo participado intensamente da Eucaristia, ali mesmo foram tocados e chamados a uma vocação de serviço na Igreja. Missa e vocação!

Quando não veem mais Jesus, partilham que seus corações ardiam interiormente! Atrevo-me a dizer que uma imensa quantidade de jovens já sentiu este fogo queimando por dentro. Tenho testemunhado o chamado ao serviço de Deus brotar inclusive em alguns que foram feridos de amor por dentro por carismas, como aquele da Fazenda da Esperança. Nos últimos anos, temos “colhido vocações” justamente nos prados fecundados por tanto sofrimento da vida de homens e mulheres, jovens e adultos, saídos da lama do vício, pois Deus sabe chamar, converter e enviar!
Todas estradas de Emaús convergem para Jerusalém, a Igreja reunida, Mãe e Matriz de todas as vocações. Quantas são as pessoas, especialmente jovens, que percorrem muito mais do que os onze quilômetros dos peregrinos da alegria da Emaús daquele tempo, para redescobrirem a Igreja, Comunidade de Fé, onde o Senhor se manifesta mesmo aos discípulos inseguros, parecidos conosco, aos quais é dada a missão que resume todas as vocações: “Assim está escrito: o Cristo sofrerá e ressuscitará dos mortos ao terceiro dia, e no seu nome será anunciada a conversão, para o perdão dos pecados, a todas as nações, começando por Jerusalém. Vós sois as testemunhas destas coisas”. (Lc 24,37-48). Todas as vocações conduzem à Igreja e dela partem para chegar aos confins da terra!