Introdução:

Falamos no artigo anterior sobre a inseparabilidade entre evangelização e promoção humana. Bem como, apresentamos quatro fontes inspiradoras e condicionadoras do agir da Igreja na esfera social.

No amplo contexto Amazônico, a relação entre evangelização e promoção humana é desafiadora por causa das suas muitas e complexas demandas. Por isso, é preciso muita clareza e transparência, para que a Igreja seja fiel à sua missão, sem se confundir com as atitudes e reivindicações de uma Organização Não Governamental.

  1. A contribuição ética da Igreja:

Quando Jesus disse a seus discípulos: “pobres sempre tereis, mas a mim nem sempre” (Jo 12,8) deixou a seus discípulos um profundo alerta. A centralidade da missão da Igreja é a promoção do Reino de Deus. O resto é consequência! O acento na missão da Igreja não deve estar sobre os problemas e nem sobre as carências humanas. Mas sobre o próprio Cristo.   

Para a Igreja, fora da motivação teológica, tudo se esvazia e desvia. Isso aconteceu com Judas Iscariotes que falava dos pobres, mas suas motivações erram errôneas e não estavam centradas na pessoa de Jesus (cf. Jo 12,4-8), no Reino de Deus.

O Papa Francisco, fiel aos fundamentos teológicos da missão da Igreja em relação às questões sociais nos também nos alerta afirmando: “No diálogo com o Estado e com a so­ciedade, a Igreja não tem soluções para todas as questões específicas. Mas, juntamente com as vá­rias forças sociais, acompanha as propostas que melhor correspondam à dignidade da pessoa hu­mana e ao bem comum. Ao fazê-lo, propõe sem­pre com clareza os valores fundamentais da exis­tência humana, para transmitir convicções que possam depois traduzir-se em ações políticas” (EG, 241).

A Igreja não tem respostas técnicas para os problemas da sociedade, não é sua missão; mas contribui com sua reflexão, aponta princípios, sugere caminhos à luz da Fé (cf. C.A, 55).

  1. Amazônia: Galileia da Igreja:

Em relação ao Sínodo da Pan-Amazônia, seria míope por parte da Igreja uma preocupação meramente socio-ambientalista. Quem está meramente preocupado com essa questão desconhece a sensibilidade da Igreja. Todavia, o justo equilíbrio deverá sempre ser mantido.

E quais situações dos diversos contextos amazônicos requerem da parte da Igreja uma especial atenção? A Amazônia é a Galileia da Igreja no continente americano. Por ser um território profundamente marcado pela pobreza e pela desatenção política, violência, opressão e injustiça de muitas formas, Jesus deu especial atenção aos galileus e se fez um deles vivendo em Nazaré.

A Igreja, “perita em humanidade” (cf. Paulo VI, Populorum progressio, 13), é partícipe “das alegrias e esperanças, das angústias e das tristezas dos homens”  (GS, 1), por isso, é solidária com todo homem e a toda a mulher, de todo lugar, tempo, cultura e religião testemunhando-lhes os valores do Reino de Deus. Assim a Igreja não só crê em «novos céus», mas está comprometida com a transformação deste mundo (cf. Rm 12,1-3; 2Pd 3,13).

Para a Igreja a dimensão antropológica abraça inevitavelmente a questão socio-ambiental com todas as suas exigências. Não podemos falar de evangelização na Amazônia sem tocar naquilo que é característica fundante da identidade da Amazônia: a beleza e a abundância da biodiversidade e suas ameaças. A questão da promoção humana abraça a totalidade das dimensões da existência do ser humano, independente do seu contexto. 

  1. A Amazônia e suas necessidades específicas:

As necessidades da promoção humana são sempre as mesmas em qualquer lugar do mundo, todavia, é necessário, considerarmos o contexto existencial das pessoas presentes em cada realidade. Cada contexto é rico de demandas específicas!

Há uma variedade de fatores (socioculturais, ambientais, políticos, econômicos, religiosos…), que condicionam o dinamismo da promoção humana e da evangelização em cada contexto. O mesmo acontece na Amazônia.

A promoção humana, abraçando a totalidade das dimensões da pessoa, em todos os contextos e situações, exige ação conjunta: nenhum ator social é, isoladamente, o responsável pela acolhida, tutela, defesa e promoção da pessoa humana. A Amazônia, por sua própria, natureza, exige interação, senso de corresponsabilidade, ação conjunta, parcerias.

Infelizmente, ainda na gestão da promoção humana na Amazônia, nem sempre os diversos atores sociais convergem e se esforçam para serem bons parceiros, colaboradores uns dos outros; onde há modos variados de compreensão da dignidade humana (e do valor da vida humana), há conflitos, inimizade, antagonismo, sangue derramado. Por isso, urge a promoção da profecia do diálogo em vista da promoção de processos de convergência.

  1. Anúncio, diálogo e denúncia:

A promoção humana estimulada pela Igreja propõe intervenção em todos os contextos socioculturais e situações: indígena, negro, rural, ribeirinho, urbano (centro e periferia). Lamentavelmente a Amazônia é palco de conflitos e mortes! Por parte da Igreja não é suficiente a denúncia dos males. Talvez precisemos crescer mais em atitudes pedagógicas capazes de estimular o discernimento, a convergência, o diálogo e a resolução serena dos conflitos. Foi o que Jesus fez com Zaqueu!

Graves situações humanas vão perdurar enquanto houver a fragmentação das instituições e o oposicionismo entre elas, que criam barreiras entre si, gerando antipatias entre governos, empresas, fazendeiros, militares, ONGs, movimentos, Igreja, instituições de controle social. Por outro lado, muitas vezes, a surdez das instituições de controle social favorece a violência.

Cada ator social tem uma profunda responsabilidade que deve ser resgatada por sua dignidade vocacional. Todavia, onde cresce o antagonismo, todos perdem, se enfraquecem, e se instaura a “guerra fria”.

 

PARA REFLEXÃO:

  • O que significa que a Igreja não tem soluções técnicas para os problemas da sociedade?
  • O que você entende pela afirmação: a Igreja é partícipe das alegrias e esperanças, das angústias e das tristezas dos homens?
  • Quais antagonismos, entre instituições ou categorias de pessoas, você percebe na Amazônia? Como a Igreja pode ajudar?

POR Dom ANTÔNIO DE ASSIS RIBEIRO, SDB

Bispo Auxiliar de Belém - PA