
por Dom Vital Corbellini
Bispo da Diocese de Marabá
Santo Agostinho, bispo de Hipona, séculos IV e V fez a interpretação da Palavra de Deus do evangelista São Lucas na qual Jesus disse aos seus discípulos que é preciso pedir ao dono da messe para que envie mais pessoas para a messe, pois a messe é grande e as pessoas trabalhadoras são poucas (cfr. Lc 10, 2). Vejamos como foi a análise do Bispo de Hipona, Santo Agostinho em vista da atuação e oração pelas vocações.
Os setenta e dois discípulos
O evangelista São Lucas acrescentou aos doze discípulos, outros setenta e dois discípulos onde Jesus os enviou dois a dois na messe já pronta, e, necessitada de pessoas na evangelização. A messe na qual é falada pelo Senhor, segundo Santo Agostinho seria o povo dos judeus[1]. O Senhor da messe enviou para ele os ceifeiros, enquanto para as gentes, para outros povos, Ele enviou os semeadores[2]. Como é que foi justificada a diferença? O fato era que a messe cresceu no povo dos judeus, dos quais dentre estes o Senhor escolheu os apóstolos. Nestes locais e terras já era madura a colheita na qual fora semeada, porque também os profetas haviam semeado e no tempo de Jesus pediu que se rezasse para o aumento de pessoas na messe[3]
O cultivo de Deus
Santo Agostinho afirmou que é bom contemplar o cultivo de Deus, alegrar-se pelos seus dons e trabalhar no seu campo[4]. Ele disse ainda que neste cultivo trabalhou o Apóstolo São Paulo que afirmou que ele tinha doado mais que todos os outros apóstolos, das quais as forças vinham do Dono da messe: o Senhor Jesus. Desta forma o apóstolo disse que não era ele, mas a graça de Deus que atuava nele (cfr. 1 Cor 15,10)[5]. O Bispo dizia que a diferença de Paulo e de Pedro era que o apóstolo Paulo fora enviado para os pagãos, sendo semeador, enquanto para o apóstolo Pedro seria enviado entre os judeus, circuncisos (cfr. At 15,7), sendo ceifador[6].
A messe entre dois povos
A messe, o cultivo de Deus deu-se em dois momentos: uma já passada, e a outra futura. Se a passada foi com o povo dos judeus, a futura será dada entre os povos pagãos[7]. Na atualidade é preciso anunciar e viver a dimensão do Reino de Deus com pessoas disponíveis, vocacionadas, de modo que é preciso pedir mais pessoas à messe.
Jesus enviou os seus discípulos afirmando a eles que não estariam isentos de perseguições ao afirmar que eles iriam como ovelhas em meio aos lobos (cfr. Lc 10,3). Santo Agostinho afirmou também o encontro de Jesus com a mulher samaritana, quando Ele disse para ela ser o Messias esperado por todas as pessoas. Ela disse que o Messias, o Cristo deveria chegar pois foi anunciado por Moisés e pelos profetas (cfr. Jo 4, 25-26). A messe estava bem presente em Moisés e os profetas como semeadores enquanto os apóstolos seriam os ceifadores[8]. A mulher acreditou nas palavras do Senhor de que Ele era o Messias e por isso ela deixou o balde perto do poço e foi anunciar ao seu povo que encontrou o Senhor. Se ela tinha a idéia da vinda de Cristo, no entanto ela acreditou na sua vinda porque ela o viu de modo que acreditou porque outras pessoas semearam antes pela vinda de Jesus Cristo[9]. Na verdade, trabalharam Abraão, Isaac, Jacó e os profetas semeando palavras e ações à vinda do Senhor, de modo que quando chegou o Senhor, a messe já estava madura, sendo necessitados de ceifeiros[10]
O semeador é o Senhor
Jesus é o semeador, porque sem ele não é possível fazer nada (cfr. Jo 15,5). As sementes caíram em diversos terrenos como aquele ao longo do caminho, em meio às pedras, entre os espinhos e por fim na terra boa, de modo que é preciso acolher a Palavra de Deus para produzir ações boas que enalteçam o Senhor e o Reino de Deus (cfr. Mt 13,23)[11]. Todo o povo de Deus é chamado a semear, plantar, acolhendo docilmente a presença do Senhor para que de fato a messe tenha as pessoas operárias que trabalhem e fazem frutificar a vida pelo Reino de Deus[12].
O desprendimento das coisas
Jesus recomendou aos discípulos o desprendimento de muitos bens para não levar sacola e outras coisas (cfr. Lc 10,4-6). A pessoa que anuncia o Senhor para outras pessoas é chamada a ser uma pessoa de paz para aquela casa, seus moradores (cfr. Lc 10,5). Se Jesus pede de seus discípulos o desprendimento é porque Ele quer que eles não caíam no orgulho, na soberba, na vaidade de que façam as coisas por atitudes individuais, mas sim por vida comunitária[13]. As pessoas missionárias eram chamadas à abertura do espírito, para que todos amem a missão e tenham vez e voz na vida comunitária, familiar e no Reino. Se o Senhor pediu fidelidade também no desprendimento para não saudar nenhuma pessoa ao longo do caminho, era porque a saudação comprometia um tempo precioso que deveria ser dado ao Evangelho, a boa nova da salvação, ao anuncio do Reino de Deus, da pessoa de Jesus Cristo (cfr. Lc 10,4)[14].
Os pregadores do Senhor
O Senhor desejou que os seus discípulos fossem os seus pregadores, anunciando a boa nova do Reino, a salvação. Eles eram chamados a pregar a paz e possuí-la pela presença do Senhor, não ficando apenas no discurso, mas porque a possuía em si, deveriam transmiti-la pelo contato com Jesus[15]. A paz na terra é amor, caridade entre as pessoas e os povos através da ação evangelizadora que cada pessoa cristã é chamada a fazer com alegria e com amor porque Jesus está com os seus discípulos, que os enviou, envia hoje em missão porque a messe é grande e os operários são poucos. Para isso o Senhor pede de toda a pessoa seguidora dele, a oração para que mais pessoas trabalhem na missão, no anúncio da paz, do Reino de Deus aqui e agora e um dia na eternidade.
[1] Cfr. Discorso 101, 1. In: Sant´Agostino. Sul Sacerdozio. Città Nuova Editrice: Roma, 1985, pg. 232.
[2] Cfr. Idem, pg. 232.
[3] Cfr. Ibidem.
[4] Cfr. Ibidem.
[5] Cfr. Ibidem, pg. 233.
[6] Cfr. Ibidem.
[7] Cfr. Ibidem, 2, pg. 234.
[8] Cfr. Ibidem, pg 234.
[9] Cfr. Ibidem, pgs. 234-235.
[10] Cfr. Ibidem, pg 235.
[11] Cfr. Ibidem, 3, pg. 236.
[12] Cfr. Ibidem, 4, pg. 237.
[13] Cfr. Ibidem, 5, pg 239.
[14] Cfr. Ibidem, 8, pgs. 241-242.
[15] Cfr. Ibidem, 11, pg 244.