Dom Antônio de Assis Ribeiro
Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém

Na Bíblia a Páscoa aparece pela primeira vez no capítulo doze do livro do Êxodo, dentro do contexto de vida nova, como memória da libertação da escravidão no Egito (cf. Êxodo 1-3). A Páscoa judaica acontecia como celebração familiar, de ação de graças a Deus pela passagem da escravidão (cf. Êxodo 12). Considerando esses fatos, podemos dizer que não há verdadeira celebração da Páscoa sem a memória do passado, sem superação daquilo que nos oprime, sem espírito de família, sem esperança para o futuro!

A Páscoa é a restauração plena da dignidade humana. No Egito aconteceu a ruptura com o sistema opressor que degradava a dignidade humana. Onde não há respeito para com a dignidade da pessoa humana, lá não reina o dinamismo da Páscoa. Em Jerusalém Jesus abandonou o sepulcro e apareceu vivo e glorioso dando a mais eloquente resposta divina aos promotores da cultura de morte marcada pela violência, vaidade, idolatria política, ignorância, negligência, negação do ser humano.

A Páscoa é resposta divina à toda forma de violência humana. Mas a Páscoa não é só espetáculo da Misericórdia divina diante da vulnerabilidade humana. A Páscoa é também compromisso, responsabilidade e dever de quem é beneficiário da proativa ternura divina. No Egito a experiência da Páscoa abriu um caminho no deserto! Em Jerusalém, as mulheres foram enviadas em missão para anunciar aos discípulos a alegria da Ressurreição do Mestre e Senhor (cf. Mc 16,1-8).

Em nível eclesial, a celebração da Páscoa é a mais nobre ocasião para a renovação da nossa caridade pastoral em vista da promoção do Reino de Deus. Do Coração da Páscoa brota a sensibilidade biófila da Igreja, ela é amante da Vida. Dessa convicção deveria, por toda parte, haver a cada ano e em todos os contextos um forte reavivamento das pastorais que são instrumentos eclesiais promotores da vida e da dignidade humana. A celebração da Páscoa não combina com a ausência de paixão pastoral, sem cuidado para com os mais pobres e sofredores. Deus nos livre de uma “liturgia pascal” sem os pés no chão, sem caridade, sem coração.

A celebração da Páscoa é renovação dos nossos compromissos com a não violência e com a promoção da cultura da solidariedade e da paz. Sem compromissos com o processo de melhoria pessoal não evidenciamos os efeitos da Páscoa em nós. Algo de negativo deve então passar, ser abandonado, rejeitado, renunciado!

Deus nos liberta para sermos verdadeiramente livres (cf. Gálatas 5,1) e a mais significativa manifestação de liberdade é o exercício do amor, da bondade, da solidariedade, da partilha, do respeito para com os outros. De nada adianta alguém gritar “Viva Cristo Ressuscitado!” Aleluia! Viva Jesus nossa Páscoa!” Se, na prática, continuar num Egito de opressões e num túmulo de podridão moral, azedume psicológico, frieza afetiva, falsidade, vazio de culto. Certo é que da experiência de páscoa pessoal (superação) e da Fé no Ressuscitado brotam uma profunda responsabilidade social.

Tanto na experiência da Páscoa no Egito, quanto na Páscoa de Jesus encontramos o fenômeno do deslocamento! A celebração da Páscoa em nível pessoal e comunitário nos pede um deslocamento interior que, muitas vezes, vai se manifestar em atitudes.

A celebração da Páscoa traz consigo um duplo movimento, um de afastamento do mal e outro de aproximação ao bem. Para os discípulos de Jesus esse movimento de deslocamento pode ser visto como o compromisso missionário. Não há experiência de missionariedade sem saída! Quantas pessoas poderiam estar melhor se nos tornássemos mensageiros e missionários do Bem indo ao encontro daqueles que passam necessidades! Uma pedra foi rolada do túmulo de Jesus e ele saiu! Cada um de nós, pela fé no Ressuscitado, é chamado a pensar nas pedras que fecham a porta do próprio coração!

Para a Comunidade Cristã Primitiva a celebração da festa da Páscoa de Jesus, era a fonte do dinamismo de vida nova. Hoje em nossa cultura tentada pelo materialismo, são fortes as manifestações de uma suposta páscoa sem fé: páscoa sem religião, sem oração, sem sepulcro vazio, sem renovação espiritual. Mas, na verdade, não há Páscoa sem sacrifício, sem cruz, nem Páscoa sem morte; não há Páscoa sem esperança, sem comunidade, sem Jesus Ressuscitado!

Quem crê em Jesus Cristo é convidado a evitar a páscoa pagã: aquela que se reduz a ovos de chocolate, coelhos sorridentes, tortas industriais, comidas, bebidas, músicas, danças, viagens! Em famílias e escolas, onde há frágil fé e confusa informação cristã, as crianças estão sendo profundamente bombardeadas por falsas ideias sobre a Páscoa. Fiquemos atentos! Desejo-lhe uma autêntica e FELIZ PÁSCOA!