Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo Metropolitano de Belém

 

O Bom Pastor vai à frente das ovelhas, muitas vezes caminha ao lado delas e entre elas, assim como deve ir atrás das ovelhas para estimulá-las a andar para frente. Desejamos seguir Jesus e descobrir seu modo de pastorear, deixar-nos conduzir e abraçar seus métodos e atitudes no trato com irmãos e irmãs, ousando afirmar que nos cabe “pastorear”, cuidar com responsabilidade de todos os que nos são confiados, responsáveis por aqueles que cativamos, em nome do Bom Pastor.

O coração de cada pessoa é o espaço privilegiado, por onde passeia com amor o Senhor de nossas vidas. Trata-se de reconhecer o amor de Deus, que cuida de nós com amor sério e profundo, conhecendo-nos pelo nome e em cada detalhe de nossa história. Há um ato pessoal de Deus, quando fomos gerados, criando uma alma imortal, com o compromisso direto de acompanhar-nos nesta terra e na eternidade. No belíssimo texto evangélico proclamado no Domingo do Bom Pastor (Jo 10,1-10), ele conhece cada pessoa pelo nome e conduz pelas estradas da vida. Ele sabe o que existe de mais íntimo em nós, qualidades e defeitos. Deus é capaz de aproveitar até os nossos pecados, queimados que são na fornalha de sua misericórdia, chamando-nos a reconhecê-los e acolher o seu perdão.

Há uma preferência da parte do Senhor! “Jesus contou-lhes esta parábola: “Quem de vós que tem cem ovelhas e perde uma, não deixa as noventa e nove no deserto e vai atrás daquela que se perdeu, até encontrá-la? E quando a encontra, alegre a põe nos ombros e, chegando em casa, reúne os amigos e vizinhos, e diz: ‘Alegrai-vos comigo! Encontrei a minha ovelha que estava perdida!’ Eu vos digo: assim haverá no céu alegria por um só pecador que se converte, mais do que por noventa e nove justos que não precisam de conversão” (Lc 15,3-7). Deus é apaixonado pelos que estão mais distantes, frágeis e pecadores. Seguir Jesus exigirá olhar para o horizonte, descobrindo quem precisa mais, escolhendo primeiro as trilhas mais exigentes e complicadas. Consequência natural será modificar o eixo de nossa alegria, deixando que as exigências e dores não nos tirem justamente este fruto do Espírito, a alegria (Cf. Gl 5,22). Certamente o caminho a ser percorrido às situações mais difíceis trará consigo inclusive o “sorriso heroico”!

Alguns artistas fizeram ver Jesus Menino como Pastor, ainda que tenha sido carpinteiro! Descido a esta terra para se entregar por nós em sua Morte e Ressurreição, o Senhor passou pelas veredas simples e aparentemente despretensiosas da família. Igual a nós em tudo, menos no pecado, teve que aprender as práticas do cotidiano, num ambiente cultural muito bem definido, com língua própria, convivência com a vizinhança, trabalho, amizade, saúde e enfermidade e o grande afeto que caracteriza o ambiente do lar. Ainda que diferentes os ambientes, a casa, o edifício, o apartamento, a tenda ou barraca, a tribo, a oca, chamemos do jeito que quisermos, da casa de Nazaré nasça o jeito do Bom Pastor ter vivido em família!

Ao passar pelas veredas de nossa vida, o Bom Pastor, não anda distraído, mas olha em torno de si, prestando atenção a todas as situações humanas. Com o seu olhar, pode nascer em nós uma palavra e a atitude correspondente, na expressão hoje corrente e de grande importância, o “cuidado”, que exige criatividade e dedicação, especialmente na partilha dos diversos dons, com os quais a presença misteriosa do Pastor se expressa nas diferentes pastorais, com as quais a Igreja se desdobra com espírito de serviço, abrindo um leque significativo destinado a acolher todas as situações humanas, para que ninguém passe em vão ao nosso lado. Isso significa “Missão”, opção clara e determinada de nossa Igreja!

Jesus Bom Pastor é a porta por onde hão de passar as ovelhas do rebanho. Assim, ele é ponto de partida, é ponto de chegada, Verdade e Vida, é Caminho. Entretanto, há que ser realistas, com a lucidez da fé, acolhendo o ensinamento da Primeira Carta de São Pedro (Cf. 1 Pd 2,20-25): “Cristo sofreu por vós deixando-vos um exemplo, para que sigais os seus passos. Ele não cometeu pecado algum, mentira nenhuma foi encontrada em sua boca. Quando injuriado, não retribuía as injúrias; atormentado, não ameaçava; antes, colocava a sua causa nas mãos daquele que julga com justiça. Carregou nossos pecados em seu próprio corpo, sobre a cruz, a fim de que, mortos para os pecados, vivamos para a justiça. Por suas feridas fostes curados. Andáveis desgarrados como ovelhas, mas agora voltastes ao pastor e protetor de vossas vidas”. O caminho do Bom Pastor passa pela Cruz, e não haverá Pastoral e Evangelização na Igreja, a serviço do Reino de Deus, sem o Mistério da Cruz, estrada da Ressurreição! Assim a Igreja reza na Festa do Bom Pastor: “Ressuscitou o Bom Pastor, que deu a vida por suas ovelhas, e quis morrer pelo rebanho, aleluia!” (Antífona da Comunhão).

O redil do Bom Pastor, com suas ovelhas, é a Igreja, com suas portas abertas, pronta a acolher as pessoas. Sabemos que ele é Pastor e ao mesmo tempo o Cordeiro, que tira o pecado do mundo. “O Cordeiro será o seu pastor e os conduzirá até às fontes da água viva (Ap 7,17). É sua estrada de Cordeiro e Pastor!

Assim a Igreja reza o Salmo 22: “O Senhor é o pastor que me conduz; não me falta coisa alguma. Pelos prados e campinas verdejantes ele me leva a descansar. Para as águas repousantes me encaminha, e restaura as minhas forças. Ele me guia no caminho mais seguro, pela honra do seu nome. Mesmo que eu passe pelo vale tenebroso, nenhum mal eu temerei; estais comigo com bastão e com cajado; eles me dão a segurança! Preparais à minha frente uma mesa, bem à vista do inimigo, e com óleo vós ungis minha cabeça; o meu cálice transborda. Felicidade e todo bem hão de seguir-me por toda a minha vida e, na casa do Senhor, habitarei pelos tempos infinitos”.

De modo especial nos Sacramentos da iniciação cristã, ele cuida de nós! De fato, nas águas repousantes do Batismo fomos lavados e restaurados! Conduz para o bem a nossa vida e nos fortalece na caminhada. Mesmo que passemos por veredas escuras de um vale tenebroso, vencemos o medo com a força do Senhor. Ungiu nossa cabeça com o óleo perfumado do Espírito na Crisma, preparou-nos a mesa da Eucaristia e nos aponta para a eternidade feliz! Por isso dizemos: “Conduzi-nos ó Pai, à comunhão das alegrias celestes, para que o rebanho possa atingir, apesar de sua fraqueza, a fortaleza do Pastor!” (Cf. Oração do dia na Festa do Bom Pastor).