Por Dom Vital Corbellini, Bispo de Marabá – PA.
Aludindo a Jesus como o profeta verdadeiro, o quarto domingo do tempo comum coloca Jesus em sua terra natal, Nazaré onde ele manifestou o seu programa de vida junto à realidade humana. Se as palavras da Escritura se realizaram nele, ele recebeu a contestação pelos seus concidadãos, não vendo nele o Filho de Deus na carne. Ele disse que nenhum profeta é bem recebido em sua pátria (Lc 4,24). No entanto, ele foi o profeta, o enviando do Altíssimo que veio a este mundo revelar a misericórdia e o amor de Deus Pai no Espírito Santo. Pelo batismo somos profetas no mundo de hoje. Veremos a seguir a importância da profecia e a forma como os padres da Igreja, os primeiros escritores abordaram a questão do ser profeta em Jesus de Nazaré.
O valor do profeta.
O profeta vem da palavra grega profétes, cujo significado é: preanunciar, prever. É uma pessoa que fala em nome de Deus, do Altíssimo, manifestando o seu desejo e preanunciando em seu nome, o futuro[1].
Na Igreja primitiva e também em todos os tempos, o profeta é o homem da palavra, porque fala sob a inspiração do Espírito Santo (cfr. At 21,11) com uma missão importante na comunidade de fé para edificá-la, encorajá-la, testemunhar a ação permanente do Ressuscitado. As suas mensagens são aceitas como expressão da vontade de Deus[2]. São Paulo fala da diversidade de dons que o Espírito Santo dá para as pessoas e um desses é a profecia, o dom da palavra (cfr. 1 Cor 12, 4-8).
Os apóstolos e os profetas
O livro da Didaqué, século I, teve presentes os apóstolos e os profetas, dois ministérios que serviam a comunidade primitiva. Eles procederiam conforme o princípio do Evangelho, nas suas ações testemunhando o amor do Senhor junto ao povo de Deus, de modo que eles seriam bem acolhidos. Na sua partida, o apóstolo não levaria nada consigo, a não ser o pão necessário até o lugar em que for parar. O autor também afirmou é preciso distinguir que tipo de profeta é na comunidade. Desta forma nem todo aquele que fala sob inspiração é profeta, a não ser que viva como o Senhor, de modo que a comunidade distinguirá o falso e o verdadeiro profeta. O verdadeiro profeta deve ensinar a verdade em Cristo, na Igreja e a pratica[3].
Jesus, o cumpridor das promessas
Santo Agostinho, bispo de Hipona, séculos IV e V, afirmou que Cristo cumpriu todas as profecias do AT. Com a vinda de Jesus, o seu nascimento, a sua vida, as suas palavras, as suas ações, sofrimentos, morte e ressurreição e ascensão cumpriram-se todos os acontecimentos dos profetas. O Espírito Santo veio sobre os apóstolos para que anunciassem ao mundo a palavra do Senhor e o evangelho da Boa-nova. As diversas previsões se realizaram no Senhor[4].
Santo Agostinho também afirmou que o rei verdadeiro da cidade terrestre, Jerusalém foi o Cristo Jesus. Como prefiguração desse Rei, sobressaiu-se no reino terreno do povo de Israel, o rei Davi, na qual devia vir, segundo a carne, o nosso verdadeiro rei, o Senhor Jesus Cristo, “Deus bendito sobre todas as coisas para sempre” (Rm 9,5)[5]. O bispo de Hipona disse que Jesus Cristo manifestou o Novo Testamento da herança eterna, no qual, renovado pela graça, o ser humano teria vida nova[6].
A relação do Antigo Testamento com o Novo Testamento.
Santo Ireneu, bispo de Lião afirmou que houve dois testamentos supondo que tivessem dois povos, mas na realidade há um só e único Deus que os deu para a utilidade dos seres humanos levando as pessoas a acreditarem em Deus. O primeiro Testamento fora dado ao serviço de Deus, sendo um símbolo das coisas celestes, pois o ser humano não via ainda as coisas de Deus, contendo a profecia do futuro, para demonstrar à humanidade que Deus conhece todo o futuro[7].
A economia da encarnação.
Santo Ireneu via também na palavra escrita por Moises que um astro procedente de Jacó tornar-se-ia chefe, precedente de Israel (Nm 24,17), anunciando desta forma a economia de sua encarnação que se realizaria entre os hebreus, descendo dos céus, nasceria de Jacó e da estirpe judaica, submetendo-se a essa economia. Esta estrela apareceu no céu, e sendo chefe de um rei, falava a eles do seu nascimento e por seu intermédio tiveram conhecimento do nascimento de Cristo[8].
As profecias referentes ao Senhor Jesus
São Justino de Roma, século II, afirmou que nos livros proféticos já se encontravam dados que Jesus, nosso Cristo, nasceria de uma virgem, curaria toda doença, toda fraqueza e ressuscitaria dos mortos, seria crucificado, morreria, ressuscitaria e subiria aos céus e o seu nome, seria Filho de Deus e que também enviaria pessoas para proclamar essas coisas a todo gênero humano e as pessoas das nações creriam nele[9],
A fé em Cristo Jesus dos justos do AT.
São Gregório de Nazianzo, bispo de Constantinopla, século IV, disse que os justos, e dentre eles, também os Macabeus, deram a vida em vista de Cristo. Para São Gregório nenhum deles alcançou a perfeição, sem a fé em Cristo. Eles receberam o louvor porque viveram conforme a cruz do Senhor, manifestando a sua fé naquele momento de seu martírio em unidade com as realidades futuras pela paixão, morte e ressurreição de Cristo[10].
Jesus realizou as profecias do AT. Ele é o Salvador e o Redentor da humanidade. Ele como o profeta verdadeiro, enviado do Pai, com a presença do Espírito Santo, anunciou a todas as pessoas a boa-nova, curou os doentes, expulsou demônios das pessoas, ressuscitou os mortos. Como todo o profeta foi contestado, perseguido, e passando pela morte, ressurgiu dos mortos. Ele caminha conosco e nos encoraja pela presença do Espírito Santo e em unidade com o Pai, a sermos profetas na realidade atual.
[1] Cfr. Profèta. In: Il vocabolario treccani, Il Conciso. Milano, Trento, 1998, pg. 1276.
[2] Cfr. M. Marinone. Profeta. In: Nuovo Dizionario Patristico e di Antichità Cristiane, diretto da Angelo Di Berardino, P-Z. Marietti, Genova – Milano, 2008, pg. 4349-4350.
[3] Cfr. Didaqué, 11, 3-10. In: Padres Apostólicos. Paulus, 1995, SP, pgs 355-356.
[4] Cfr. Agostino. Le Lettere, II, 137,4.15-16 (A Volusiano). In: La teologia dei padri, v. 2. Città Nuova Editrice, Roma, 1982, pgs. 86-87.
[5] Cfr. Santo Agostinho. Primeira Catequese aos não cristãos, XX, 36. Paulus, SP, 2013, pg. 121.
[6] Cfr. Idem, XXII, 40, pg. 126.
[7] Cfr. Ireneu de Lião. IV,32,2. Paulus, SP, 1995, pg. 470.
[8] Cfr. Irineu de Lyon. Demonstração da pregação apostólica, 58. Paulus, SP, 2014, pg. 114.
[9] Cfr. Justino de Roma. I Apol 31,7. Paulus, SP, 1995, pg. 47.
[10] Cfr. Gregorio di Nazianzo. Discorso in lode dei Maccabei, 15, 1-2. In: La teologia dei padri, v. 4. Città Nuova Editrice, Roma, 1982, pg. 197.