Dom Antônio de Assis Ribeiro
Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém
Introdução
Um dos grandes temas pastorais que precisamos estar continuamente refletindo, aprofundando e ressignificando é aquele da “liderança”. Esse assunto não é importante somente para a Igreja, mas também para a toda a sociedade com sua variedade de formas de organizações, instituições, povos e nações.
Podemos afirmar com toda certeza que o desenvolvimento dos povos passa, inevitavelmente, pelo perfil dos seus líderes; da mesma forma podemos afirmar no que diz respeito à muitos males sociais e múltiplas formas de violências e opressão.
Na Igreja há muitos níveis de liderança, bem como a diversidade de vocações, carismas e serviços. Todavia, tudo deve ser conduzido num clima de harmonia, comunhão e tendo a mesma finalidade que é a promoção do Reino de Deus. Jesus é o modelo do líder! Mas no concreto da gestão da liderança isso não é pacífico e nem automático.
Há muitas condições concretas das quais dependem o perfil do serviço de um líder, como por exemplo, a sua formação humana, habilidades relacionais, conhecimento da área de atuação, capacidade de percepção da realidade, inquietude, paixão pelo desenvolvimento das pessoas, senso de zelo e cuidado, ternura e firmeza, visão aberta, senso de trabalho em equipe, firmeza psicológica, sensibilidade estratégica, desenvolvimento espiritual etc. Por isso é um tema que precisamos refletir em muitas perspectivas.
1. A base antropológica da liderança
Desde o nosso nascimento e, por toda a nossa infância, fomos liderados, cuidados, protegidos, estimulados, animados, acompanhados, educados! Talvez nesse fato existencial tenhamos a mais remota forma de experiência do serviço dos nossos naturais líderes: os nossos pais, responsáveis e educadores! Sem o serviço da liderança deles, que se manifestou através de iniciativas de múltiplos cuidados para conosco, não teríamos sobrevivido. O líder é sobretudo um cuidador! Nossos pais cuidaram de nós nos acompanhando, inspirando, educando, fomentando o nosso desenvolvimento humano integral.
Essa natural experiência de liderança em família que começa com nossos pais, envolve também o sentido do cuidado entre os irmãos. Dessa forma os irmãos mais velhos naturalmente cuidam e contribuem no processo de educação dos mais novos. Esse é um fato comum nas famílias de muitos membros. Aprendemos com nossos pais a cuidar dos outros! É corresponsabilidade!
Saindo âmbito familiar nos deparamos que a sociedade é organizada. Significa reconhecer que ela tem líderes nos mais variados contextos e atividades. A harmonia da sociedade organizada denuncia a existência de uma complexa hierarquia de liderança em todas as áreas a vida social: na política, na economia, na cultura, na religião etc. Não vivemos sem líderes! A sociedade seria um caos sem o reconhecimento do serviço de liderança e autoridade.
Outro aspecto que nos fala da necessidade e da importância da liderança, é o fato de sermos todos diferentes; isso quer dizer que temos desejos diferentes, gostos diversos, interesses variados; consequentemente temos a facilidade da experiência do conflito. E, porque somos seres inteligentes, precisamos chegar a acordos e a combinar tudo aquilo que convém ou é inconveniente; aquilo que é certo e aquilo que é errado, que ajuda ou atrapalha a convivência. Dessa necessidade surgem as leis. E a partir delas adquirimos direitos e deveres em vista da harmonia social, disciplinando os interesses individuais. A autoridade, portanto, é exercida por aquela pessoa escolhida para ser o guardião dos direitos da comunidade em vista da paz social e da vida de todos. Por isso não deve fazer somente aquilo que lhe apraz!
2. A liderança na Igreja
Na Igreja também acontece isso. A fé nos exige uma série de atitudes e valores, nos assegura um ideal de vida e nos projeta na esperança exigindo de cada um de nós um maior comprometimento na luta pela promoção da comunidade. Para que isso seja estimulado precisamos de bons líderes!
Na perspectiva cristã, ser líder quer dizer ser servidor, pois autoridade é serviço. Esse compromisso se fundamenta no exemplo de Jesus Cristo que não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida por todos os seres humanos (cf. Mt 20,28). Portanto, o bom líder na Igreja não subsistirá sem fixar seus olhos em Jesus, o mestre dos líderes e Bom Pastor da humanidade.
Na Igreja o serviço de liderança não só exige aptidão humana específica, mas também espírito de fé, clareza de missão, senso de comunhão, fidelidade doutrinal, capacidade de obediência, espírito de sacrifício, generosidade, senso ético, espírito de iniciativa em comunhão, mentalidade sinodal etc.
A quem interessa o tema da liderança na Igreja? Certamente a todos aqueles que assumem responsabilidades de nortear outras pessoas e isso acontece nos mais variados níveis: mundial, continental, nacional, regional, provincial, arquidiocesano, diocesano, paroquial, comunitário, pastoral etc. Há uma variedade de serviços eclesiais e todos somos responsáveis pela animação da Igreja, cada um no seu nível de responsabilidade concreta.
Para que o serviço de cada líder seja positivo e edificante para a Igreja, é necessário a assimilação das exigências fundamentais do serviço de liderança eclesial para que possa servir em comunhão com a Igreja. Por falta disso, lamentavelmente há líderes prestadores de graves formas de desserviços.
3. Grandes desafios
A Igreja não está parada no tempo e, por outro lado, o aprofundamento do dinamismo do Evangelho a leva sempre mais a estar numa atitude de contínua conversão, de redimensionamento interno, de aprimoramento das próprias atitudes, de ampliação dos horizontes da missão de promoção do Reino de Deus.
Muitos são os desafios relativos ao perfil dos líderes na Igreja. Por isso observamos problemas como prepotência, autoritarismo, frieza, isolamento, negligência, falta de transparência administrativa, comodismo, medo, democratismo, populismo, heroísmo solitário, carreirismo, vaidade, indiferença diante das orientações e diretrizes, instabilidade, falta de motivação dos liderados, estacionamento no status, desobediência, ciúme, centralização dos serviços, miopia diante das necessidades etc.
O contínuo processo de renovação da Igreja exige de todos os seus líderes um permanente senso de comunhão e sem ela não há autêntico serviço eclesial. Muitas são as consequências da consciência de comunhão no serviço de liderança. Lá onde ela não se faz presente há dispersão, erros, desvios, dissidência, discórdia, disputas, enfraquecimento eclesial.
Quando um líder na Igreja, sejam em qual nível for, assume uma postura vaidosa e personalista, desinteressando-se das orientações estabelecidas e ou selecionando somente aquilo que lhe apraz está promovendo sério prejuízo pastoral. Portanto, precisamos estimular esforços em vista de promover o desenvolvimento de um trabalho pastoral mais homogêneo orientados por líderes que falem a mesma linguagem, tenham senso de comunhão com o magistério da Igreja, diretrizes pastorais, planos de institucionais, orientações específicas.
Nesta série de reflexões iremos fazer o esforço para tocar em questões bem concretas do nosso cotidiano pastoral. Uma convicção deve ser cristalina em todos os níveis: quem por orgulho não quer servir em comunhão não deve assumir a responsabilidade de liderança na Igreja. Esforcemo-nos para bem servir agradando ao Senhor, como “bons pastores”, pois a seu tempo a cada um será dado a recompensa daquilo que tiver feito de bem durante a sua vida (cf. 2Cor 5,9-10).
PARA REFLEXÃO PESSOAL:
- Você acha importante aprofundarmos o sentido de liderança na vida pastoral da Igreja?
- Por que a base antropológica da liderança é tão importante?
- Quais grandes desafios temos em relação ao serviço de liderança você percebe na Igreja atualmente?