Dom Pedro José Conti
Bispo da Diocese de Macapá

Num velho filme, daqueles ainda em preto e branco, o padre Camilo conversa abertamente com o seu amigo, o Senhor Jesus, pendurado no grande crucifixo da Igreja paroquial. É bonito, porque entre eles tem muita familiaridade. Pe. Camilo reclama da situação. A humanidade está enlouquecendo, está indo de mal para pior. Jesus responde que se, ao final, a maldade dos homens fosse mais forte que a bondade de Deus, a sua missão no mundo teria sido um grande fracasso. Pe. Camilo concorda, claro, mas rebate que, apesar de tanto progresso, o ser humano se parece ainda com aquele das cavernas. Então, ele pergunta a Jesus o que pode fazer. O Crucifixo responde com um suspiro e diz: – Pe. Camilo o que tem que fazer é aquilo que os camponeses sempre fazem quando acontecem as enchentes dos rios. Eles guardam as sementes. Eles sabem que, quando as águas baixarão, poderão plantar novamente e tudo florescerá e dará os seus frutos no tempo certo. Conclui Jesus: – Precisa salvar a semente! E a semente é a fé!

O evangelho de Mateus do 15º Domingo do Tempo Comum nos apresenta a primeira parte do discurso de Jesus em parábolas. Continuaremos com ele também nos próximos domingos, mas, por enquanto, precisamos entender a novidade desta forma tão particular que Jesus usou e que os evangelistas “sinóticos” conservaram. De imediato podemos dizer que as parábolas são um jeito popular de explicar as coisas. Neste caso, “popular” não significa banal ou superficial. Ao contrário, por não precisar de grandes conhecimentos, mas aproveitando simplesmente da experiência da vida comum das pessoas, as parábolas conseguem alcançar a todos, a começar pelos “pequeninos” sem excluir os “sábios e entendidos” dispostos a lhes prestar atenção. Já sabemos que o assunto principal das parábolas é nada menos que o “Reino dos Céus” do qual Jesus repete que “é semelhante a…”e apresenta um fato, uma situação, um acontecimento. Em lugar de dar alguma definição do Reino, Jesus prefere as comparações. Não é que assim o Reino se torne indefinito ou indescritível, não. Ele é apresentado de maneira dinâmica, como justamente deve ser porque é algo que já está acontecendo e sempre vai acontecer, também em situações impensadas ou imprevisíveis. O Reino “surpreende” quem se deixa envolver, pelo bem ou, às vezes, pelas conclusões desastrosas. As parábolas não respondem a perguntas específicas, mas abrem à participação dos ouvintes, convidam a buscar as respostas, abrem novos horizontes.

A primeira parábola é aquela que dá o tom e a direção às demais. É aquela do semeador. Este agricultor não é alguém que desperdiça a semente, mas alguém que confia na força da própria semente. O resultado, portanto, não dependerá da má qualidade do que foi semeado, mas dos terrenos dispostos a acolhê-la. Quando o terreno é bom a colheita é extraordinária, para aquele tempo e ainda para os dias de hoje. O próprio evangelho explica o sentido da parábola do semeador e a semente é identificada com a palavra do Reino que pode ser acolhida ou não. As causas da falta de frutos também são bem exemplificadas. Pouco mudou. Sempre encontramos inúmeras dificuldades e desculpas para jogar de lado ou, até manipular, a Palavra e assim não deixá-la produzir os frutos abundantes que poderia oferecer. Talvez sejamos tentados de dizer que hoje ficou pior, que a surdez e a indiferença humana ou o barulho das nossas confusões abafaram a mensagem. Seria muita falta de fé. A própria parábola ensina que a Palavra continua a ser semeada e que uma parte sempre cai em terra boa e produz fruto. O que cabe a nós é ser o melhor terreno possível e reconhecer que nada nos garante que não exista terra boa além dos limites dos nossos julgamentos. Nos faz bem olhar ao nosso redor e ver não só o mal e os erros. Tem também muita bondade e amor que crescem por causa daquela semente boa que só Deus sabe como chegou lá. Em qualquer situação devemos conservar a fé porque o Semeador continua a semear, até onde nós menos pensamos. Graças a Deus.