Dom Pedro José Conti
Bispo da Diocese de Macapá

Neste domingo realizaremos mais um Círio em honra de Nossa Senhora de Nazaré. De novo Maria nos convoca para rezarmos e cantarmos juntos os louvores a Deus, Pai de bondade, que olhou com especial predileção aquela jovem e viu a pureza do seu coração. O “sim” dela, livre e generoso, colaborou com a obra do Divino Espírito Santo e ela se tornou a mãe do Filho de Deus que assumiu em tudo, menos no pecado, a nossa natureza humana. A obediência humilde e feliz de Maria contrasta com a página do evangelho que proclamaremos neste 27º Domingo do Tempo Comum. A parábola que Jesus contou aos sumos sacerdotes e anciãos do povo foi mais uma denúncia clara e inequívoca da recusa que ele mesmo estava sofrendo. Jesus retoma a imagem da vinha cara aos profetas para representar o zelo e a preocupação de Deus com o povo de Israel.  Como nos lembra a primeira leitura do profeta Isaias deste domingo, Deus desejava que a vinha por ele cuidada com tanto trabalho produzisse “uvas de verdade”, mas ela produziu “uvas selvagens” (Is 5,4). Na parábola de Jesus, mais de que de uva, se fala de “vinhateiros” ou seja daqueles a quem a vinha tinha sido entregue. A sorte dos enviados pelo dono da vinha para cobrar os frutos devidos foi triste e chegou ao ponto que os vinhateiros decidiram matar nada menos que o filho do dono, o herdeiro, para poder ficar definitivamente com a vinha e não ser mais cobrados pelo arrendamento. Para os ouvintes da parábola o mais certo que o dono da vinha deveria fazer com aqueles vinhateiros assassinos seria um castigo cruel. No entanto, Jesus comenta a própria parábola com uma citação do Salmo 118,22 onde se diz que a pedra descartada pelos construtores se tornará a pedra angular de uma nova construção, evidentemente entregue a outros construtores. Não se fala mais da vinha, mas do Reino de Deus oferecido agora a um povo novo que “produzirá frutos” (Mt 21,43).

Se queremos atualizar a parábola de Jesus para nós hoje podemos pensar que não tenha nada ou muito pouco para nos dizer. Jesus já foi morto na cruz naquele tempo e nós não corremos mais o perigo de repetir aquele acontecimento. No entanto, não é difícil entender que tem muitas maneira de “matar” Jesus; basta, por exemplo continuar a excluí-lo da nossa vida, deixando-o fora mesmo ou colocando-o como enfeite ou suporte para as nossas ideias e os nossos projetos. Hoje entendemos que, ao longo da história, até guerras foram feitas usando ou abusando do nome do Senhor. Outros tempo, dizemos, mas se não tomamos cuidado a tentação de domesticar o Evangelho é sempre muito grande. É o antigo pecado: querer ser nós os donos da situação e não aceitar a nossa condição de criaturas. Sobretudo não aceitar de ter recebido como dom de Deus totalmente gratuito a vida e o planeta Terra no qual temporariamente moramos. Deus é “o dono” sim, mas nos entregou toda a responsabilidade daquilo que recebemos. É demais entender que ele nos cobra paz e fraternidade, partilha e dignidade para todos? Isto corresponde a dizer que não queremos um Deus que nos ama sempre e que nunca desistiu e nem desiste de nos procurar de tantas maneiras. Ele enviou o seu próprio Filho na carne humana para que fosse ouvido e seguido. Contam que S. Francisco concluiu o seu encontro com o Saladim, lá na Terra Santa, com estas palavras: – Ó rei, o amor não é amado. O Amor neste mundo é sempre crucificado. Não julgamos, então, aqueles vinhateiros. Olhamos a Maria com confiança e gratidão. Se pela recusa do amor de Deus vem o mal e a morte, quando nos deixamos amar por ele e praticamos confiantes a sua Palavra, frutos maravilhosos aparecem. Maria “cheia de graça” obediente aceitou ser amada e, sempre por amor, ofereceu com o Pai celestial aquele, também seu Filho, na cruz. Tudo porque o próprio Deus que é Amor, não pode deixar de amar nem aqueles que o rejeitam e escarnecem ainda hoje. Aprendamos com Maria a acolher o amor de Deus, a imitá-lo, a transmiti-lo, a partilhá-lo. Somente praticando o bem seremos “missionários da vida e da fé” como Nossa Senhora sempre nos lembra e ensina.