Dom Vital Corbellini
Bispo da Diocese de Marabá (PA)

Tertuliano e Orígnes, Padres da Igreja dos séculos II e III, viveram no mesmo período da Igreja antiga, o primeiro no Ocidente e o segundo no Oriente, tendo pontos conjuntos, importantes em relação aos pensamentos sociais e também eucarísticos. Tertuliano era do Norte da África. Em Roma formou-se no Direito romano, e depois de convertido defendeu o cristianismo na sua terra, Cartago colocando na comunidade pontos sociais, evangélicos e eucarísticos. Orígenes era também da África, No Egito, de Alexandria. Ele teve mais presente a Sagrada Escritura sendo também um Educador em Alexandria, levou as pessoas ao conhecimento da Palavra de Deus, a parte social e a eucaristia. Os dois padres colocaram a fé em Cristo Jesus pela eucaristia visava à realidade social, de bem, de amor para com todas as pessoas sobretudos as necessitadas. Em seguida ver-se-á estes pontos.

Os bens recebidos

Na questão social disse Tertuliano, seguindo a Sagrada Escritura, que os bens materiais passam de modo que é preciso ater-se aos bens espirituais (Mt 6,20). Esta ensina a todas as pessoas para que em cada passo da vida não se dê tanto valor aos bens materiais, devido a sua transitoriedade. O próprio Senhor não possuiu nada para a sua sobrevivência. Ele sempre defendeu os pobres e condenou aos que possuíam riquezas(Lc 12,20)[1].

O valor da comunidade

Tertuliano disse ainda na questão social a importância da comunidade para toda a pessoa que segue Cristo e a Igreja. A comunidade era formada por muitas pessoas, que rezavam pelos Imperadores, por seus ministérios e por seus poderes, pelo estado presente do mundo, pela paz e pelo adiamento do fim. A comunidade reunia-se também para ler as Sagradas Escrituras, e a nutrir-se por elas, pela fé, pela esperança, reafirmando a confiança, a disciplina, a caridade[2].

Tudo vem de Deus

Tertuliano disse que tudo vem de Deus, do qual também as pessoas provieram neste mundo. Desta forma é fundamental para a pessoa que segue a Jesus deixar-se levar pelas coisas celestes para assim não agarrar-se demais as coisas terrenas. A Palavra de Deus diz que é preciso dar alguma roupa para quem não a tem (Lc 3,11), ou mesmo o manto e a própria túnica para a pessoa necessitada (Mt 5,40). É preciso doar para não perecer com as coisas. Diferentemente das pessoas gananciosas, Tertuliano diz que é preciso sacrificar o dinheiro pela alma, seja doando de uma forma espontânea, seja suportando pacientemente as perdas[3].

A ceia do Senhor e a fé na Igreja

Seguindo também a Palavra de Deus Tertuliano dizia que a comunidade cristã não comia das coisas sacrificadas aos ídolos, também em honra dos mortos, porque ela era convidada a comer a ceia do Senhor para alimentar-se bem em sua vida[4]. Ele dizia também que a Igreja de Roma ensinou muitas coisas em relação à eucaristia das quais as Igrejas Africanas estavam unidas a ela. Ele tinha presente o Credo apostólico, na qual as pessoas acreditavam em um só Deus e Senhor, Criador do Universo e em Jesus Cristo, nascido da Virgem Maria, Filho de Deus Criador e Aquele que o ressuscitou dos mortos. A Igreja uniu a Lei e os Profetas tendo presentes também os escritos evangélicos e apostólicos para que as pessoas bebam desta fé, amparada pelo Espírito Santo que nutre com a eucaristia a Igreja e também exorta ao martírio, pela doação da vida da pessoa ao Senhor[5].

Cristo é o pão da vida e o cotidiano

Tertuliano disse que na oração do Pai nosso as pessoas pedem ao Pai o pão cotidiano. Cristo é vida e o pão da vida de modo que é pão a sua palavra que desce do céu (Jo 6,35), sendo o seu corpo, pão (Mt 26,26). As pessoas pedem o pão cotidiano, também o pão espiritual para assim não estarem separados do seu corpo[6].

A carne nutre-se do corpo e do sangue de Cristo

Tertuliano colocou a realidade da natureza humana, a carne, que se nutre do corpo e do sangue de Cristo. Esta realidade insignificante recebe junto de Deus uma dignidade grande, em vista da salvação da mesma, a sua ressurreição. Quando a carne é ligada Deus, também a alma vai junto nesta unidade. É sobre a carne que é dada o sinal da cruz para que a alma seja defendida; é sobre a carne que é dada a imposição das mãos, para que a alma seja iluminada pelo Espírito Santo; é a carne que se nutre do corpo e do sangue de Cristo, para que também a alma seja saciada de Deus. Desta forma será também a recompensa final onde as duas substâncias unidas viverão a vida eterna pela sua unidade neste mundo[7].

Uma moral comum

Na questão social disse Orígenes que Deus semeou no coração, nas almas de todos os seres humanos o que ele ensinou pelos profetas, pelo Salvador para que ninguém encontre desculpa no juízo divino, pois todo ser humano tem a exigência da lei inscrita no seu coração[8], o amor a Deus, ao próximo como a si mesmo. Todos são chamados a viver o respeito, o amor de verdade para que Deus seja amado sobre todas as coisas e as pessoas o respeitem, sobretudo nas humildes, simples e pobres.

O Senhor foi enviado às pessoas pecadoras

Ainda no contexto social disse Orígenes que o Senhor foi enviado às pessoas pecadoras e por isso foi criticado pelos fariseus e doutores da lei, as pessoas consideradas puras, mas na realidade eram também pecadoras. O Deus Logos foi enviado como médicos aos pecadores, aos doentes (Mt 9, 12-13) como Mestre dos divinos mistérios às pessoas necessitadas de vida e de evangelização[9].

A eucaristia, sendo bem recebida e a realidade do Senhor

Orígenes afirmou a importância da recepção da eucaristia, o corpo do Senhor. Nada se perdesse, uma vez que a eucaristia era dada nas mãos de modo que nenhuma migalha caísse no chão ao receber o corpo de Cristo[10]. O padre alexandrino também disse a respeito da presença de Cristo sob as espécies eucarísticas. Tendo presente a multiplicação dos pães em Mateus que Jesus após ter curado doentes, os deu para eles, para que recuperada a saúde, tomassem participantes dos pães da benção espiritual (Mt 14,14-21)[11].

O pão e o vinho, a Palavra do Verbo de Deus

Orígenes também dizia que o pão que o Verbo de Deus na carne confessou de ser seu corpo é a palavra que alimenta as almas, palavra que procede dele e pão proveniente do pão celestial que foi posto sobre a mesa. O vinho que o Verbo de Deus confessa de ser seu sangue, é a Palavra que apaga a sede e sacia os corações das pessoas que o tomam, bebida de salvação[12].

Tertuliano e Orígenes foram importantes na Igreja antiga e dão luzes à atualidade por serem pessoas de comunidades vivas que atuaram como protagonistas da Palavra de Deus, seguindo o Evangelho de Jesus Cristo, dando valor aos pensamentos sociais e eucarísticos, porque um não estava desligado do outro. A fé em Cristo nas espécies do pão e do vinho consagrados, na pessoa que os recebia impulsionava-a às obras de caridade com as pessoas necessitadas e pobres na família, na comunidade e na sociedade.

[1] Cfr. Tertulliano. Liber de Patientia, PL 1,1260ss. In: Giordano Frosini. Il pensiero sociale dei Padri. Brescia, Queriniana, 1996, pg. 58.

[2] Cfr. Tertuliano. Apologético, 39-2-3. São Paulo, Paulus, 2021, pg. 150.

[3] Cfr. Tertulliano. Liber de Patientia,..  In:: Idem, pg. 59.

[4] Cfr. Tertulliano. Gli Spettacoli, cap. 13, PL 1, 646B. In: Gerardo di Nola. Monumenta Eucharistica. La Testimonianza dei Padri della Chiesa. Vol. 1, Sec. I-IV. Roma, Edizioni Dehoniane, 1994, pg. 119.

[5] Cfr. Idem, La prescrizione degli eretici, cap. 36, 4-5; A. Kroymann, CSEL 70, 46 70; PL 1,4B. In: Idem, pgs. 120-121.

[6] Cfr. Idem, La Preghiera, cap. 6; PL 1, 1160 A -1161 A. In: Idem, pg. 121.

[7] Cfr. Idem. La risurrezione deei morti, cap. 8, 1-3; Kroymann, CSEL, 47,3, p. 36ss; PL 2, 806°-B. In: Idem, pgs. 130-131.

[8] Orígenes. Contra Celso, Livro Primeiro, 4. São Paulo, Paulus, 2004, pgs. 43-44.

[9] Cfr. Idem, Livro Terceiro, 62, pg. 259.

[10] Cfr. Origene. Omelie sull´Esodo, Omelia 13,3, Baehrens, GCS 29, Origenes Werke 6, 274; PG 12, 391 A-B. In: Idem, pg. 163.

[11] Cfr. Idem. Commento a Matteo, X,25; Klostermann, GCS 40. Origenes Werke 10,34, 13-20; PG 13, 901D-904 A. In: Idem, pg. 170.

[12] Cfr. Idem, Commento a Matteo, X, 85, Mt 26, 26ss: Klostermann, 196ss: PG 13, 1734 A-1735A. In: Idem, pg. 173.