NUNCA VAI SE ARREPENDER

por Dom Pedro José Conti

Bispo da Diocese de Macapá

“Você nunca vai se arrepender de fazer o melhor possível, ser gentil com todos, escutar antes de julgar, refletir antes de falar, fechar os ouvidos às fofocas, ser fiel aos seus princípios, ser bondoso com os inimigos, pedir desculpa quando errou, ser honesto no trabalho, ajudar um necessitado, manter as promessas, enxergar o melhor nas ações dos outros”.

O trecho do evangelho de Marcos do 6º Domingo do Tempo Comum é uma página cheia de surpresas. Chama a nossa atenção a coragem do leproso de aproximar-se de Jesus e a certeza que tinha de ser curado. O homem que ficou bom não conseguiu silenciar sobre o acontecido. Em consequência disso, Jesus foi obrigado a ficar fora da cidade, “em lugares desertos”, mas o povo continuava a procurá-lo, vindo de toda parte.

No tempo de Jesus, os leprosos eram as pessoas mais excluídas de todas. Por causa da gravidade da doença e pelo fato de ser contagiosa, mas também porque, por ser tão vergonhosa, era considerada a maior punição de Deus para aquela pobre pessoa. Doenças e pobreza eram consideradas consequência de alguma falha grave com Deus, como, ao contrário, saúde e prosperidade eram vistas como uma benevolência ou bênção de Deus. Ainda hoje muitos pensam deste jeito, infelizmente. Por isso a aproximação do leproso a Jesus e o seu pedido revelam o desafio de alguém que não se conforma com aquela condenação social e religiosa. Ao curar o leproso e a tocar nele, Jesus quebra o muro da exclusão e, sobretudo, resgata a dignidade da pessoa humana em qualquer situação de miséria possa se encontrar. Mais uma vez o evangelho nos lembra que o amor de Deus começa com os seus filhos mais sofredores e afastados por uma sociedade – e religião também? – que privilegia os abastados, os certinhos, os que se autodefinem “perfeitos”. “Não são os que tem saúde que precisa do médico, mas os doentes. Não vim chamar justos, mas pecadores” (Mc 2,17) assim está escrito. Jesus ordena ao leproso, agora sadio, de se apresentar ao sacerdote para que fosse conferida a cura dele e de não divulgar o fato. Neste caso o homem desobedece. Não consegue conter a alegria de ter voltado a viver junto aos demais ou, simplesmente, ele louva e agradece a Deus gritando pelo benefício recebido, com total gratuidade, sem merecimento algum. A gratidão é um sentimento pouco valorizado, menos, em geral, quando nós mesmos reclamamos de não ver adequadamente reconhecido o bem que  fazemos. Usamos medidas diferentes. Jesus não precisa de manifestações exteriores, lhe basta a alegria do coração de quem renasceu à vida e, talvez, aprendeu também a doar sempre o melhor de si. Além disso, a divulgação podia gerar um equivoco muito grande: que as pessoas o procurassem somente para serem curadas das doenças corporais e não para acolher a novidade inteira do Reino de Deus por ele anunciado. Nada de novo; todos nós cobramos de Deus a saúde e quando a recuperamos esquecemos daquela outra doença pior que é o mal e o pecado do qual nem sempre pedimos com igual insistência e fé a libertação. Última situação; por ter “tocado” no leproso Jesus infringiu as regras, é considerado perigoso e, portanto, deve ficar afastado, fora da cidade. Não levam em conta o bem que fez. Talvez uma antecipação da condenação de Jesus aos gritos do povo a Pilatos: “Fora! Fora! Crucifica” (Jo 19,15).  Muitos, porém, continuavam a procurá-lo onde ele ficava, “em lugares desertos”. Assim foi a vida de Jesus, acolhida e desprezo, busca e exclusão. É bom entender que não será muito diferente também para os cristãos, seus discípulos. Jesus não desistiu da sua missão, não voltou atrás e nem se arrependeu, entregou a sua vida nas mão do Pai confiante sempre na vitória do amor sobre o mal e da vida sobre a morte. Não devemos nos arrepender do bem que fazemos. Afinal não carregaremos nada deste mundo a não ser a certeza de ter usado da melhor maneira possível dos dons que recebemos da bondade de Deus. Ele saberá nos julgar, com a sua misericórdia, também sobre aquilo que nem nós lembraremos mais. Arrependidos do mal feito sim, mas nunca do bem!

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