QUARESMA E CAMPANHA DA FRATERNIDADE 1

por Dom Pedro José Conti

Bispo da Diocese de Macapá

Todo ano a Quarta Feira de Cinzas marca o início do Tempo Litúrgico que chamamos de Quaresma. Será uma caminhada de quarenta dias acompanhando Jesus rumo à sua Páscoa de Paixão, Morte e Ressurreição. Como cristãos somos todos convidados a intensificar aquelas ações que no evangelho daquele dia são apontadas como “obras de justiça”: a esmola, a oração e o jejum (Mt 6,1-6.16-18). Elas, cumpridas no escondimento e na humildade podem transformar o coração humano para torná-lo generoso e receber assim a verdadeira recompensa que só o Divino Pai pode dar. Evidentemente estas práticas devem ser atualizadas aos dias de hoje conforme a vida que conduzimos. Por isso faz 60 anos que a Igreja Católica no Brasil propõe, no Tempo da Quaresma, a Campanha da Fraternidade como compromisso concreto de reflexão e conversão. O tema escolhido para o 2024 é: “Fraternidade e amizade social” fazendo eco à Carta Encíclica do papa Francisco “Fratelli Tutti” (Todos Irmãos) sobre este mesmo assunto. Os temas das Campanhas são escolhidos pelos bispos do Brasil e abordam questões que, segundo os pastores, devem ser bem entendidas e esclarecidas à luz da Palavra de Deus e da vivência da fé cristã. Se queremos mudar algo da nossa vida e da sociedade precisamos ter os conhecimentos necessários e o rumo por onde andar e agir.

Nos primeiros dois Domingos da Quaresma encontramos dois momentos da vida de Jesus apresentados nos evangelhos: as tentações no deserto e a Transfiguração. O evangelho de Marcos, que estamos lendo este ano, é muito sóbrio a respeito das tentações. Simplesmente diz: “E ele ficou no deserto durante quarenta dias, e aí foi tentado por Satanás” (Mc 1,12-15). Não temos nenhuma exemplificação e nenhum embate. Depois disso, porém, Jesus foi para a Galileia e começou a pregar o “Evangelho de Deus”.  Ele teve mais clareza da sua missão: entendeu o que devia dizer e fazer porque “o tempo já se completou e o Reino de Deus está próximo”. No início, as multidões acorriam, mas ao aproximar-se de Jerusalém, aos poucos, apareceram cada vez mais incompreensões, dificuldades e disputas. Mais ou menos no meio do evangelho de Marcos encontramos assim o primeiro anúncio da Paixão (Mc 8,31) até chegar ao desfecho quando “abandonando-o, todos fugiram” (Mc 14,30). A “grande tentação” que devia ser vencida e para a qual Jesus se preparou no deserto e nas orações ao longo da sua vida toda foi aquela de desistir e não ir até o fim com a sua missão. Algo muito humano pelo medo, mas, ao mesmo tempo, muito divino pela obediência fiel ao Pai.

Não é fácil ser perseverantes e comprometidos com os valores do Evangelho, sobretudo quando achamos que não vale a pena e que nunca vamos ver resultados. Melhor desistir de tantos sonhos e ideais de justiça, fraternidade e paz. Esta será sempre uma grande tentação: ficar olhando – e criticando – os outros sem nos comprometer. A “amizade social”, tema da Campanha da Fraternidade deste ano, é um verdadeiro desafio para esta nossa humanidade que vive tempos de guerra entre nações, grupos armados, e entre indivíduos através da competitividade exacerbada, o ódio, a rejeição do outro. O Texto Base da CF chama tudo isso de “síndrome de Caim” fazendo referência aquelas primeiras páginas do Gênesis. Caim decidiu em seu coração que Abel devia desaparecer e a forma mais certa para que isso acontecesse era matá-lo. O irmão foi cancelado da face da terra. Mas Deus quis saber e perguntou a Caim: “Onde está o teu irmão?” A resposta foi a mais fria possível, reveladora de uma total indiferença: “Não sei. Acaso sou o guarda do meu irmão?” (Gn 4,8-9). Quantos de nós nunca mataram ninguém, mas também em nada se sentem responsáveis dos irmãos, do “bem comum” para que todos possam ter uma vida mais digna e humana. Corremos atrás de privilégios e caímos na obsessão do nosso bem- estar individual ou de grupo. É de novo a grande tentação. Vamos desistir de acreditar na amizade social ou resgatamos de vez este “projeto” que também é o sonho de Deus, Pai nosso e de todos?  

Artigos Anteriores

OS NOMES DE DEUS

por Dom Pedro José ContiBispo da Diocese de MacapáConta-se que os monges do Tibet, nas montanhas da Ásia, procuravam desde séculos reunir em um grosso código todos os nomes com que os homens, pelo mundo inteiro, tivessem designado Deus. Tratava-se de aproximadamente...

UMA VIAGEM NO ESCURO

por Dom Pedro José Conti Bispo da Diocese de MacapáUm pequeno avião avançava em meio à noite. De repente, caíram os sistemas de comunicação, a orientação da rota e o painel de controle apagou-se. O avião voava às cegas. Os pilotos tentaram inutilmente concertar o...

NO CORAÇÃO DA IGREJA… EU SEREI O AMOR

por Dom Pedro José Conti Bispo da Diocese de MacapáEstas são palavras de Santa Teresa do Menino Jesus e da Santa Face, mais conhecida como Santa Teresinha. Nos primeiros dias após o Domingo de Páscoa recebemos, em Macapá, as relíquias desta Santa, uma das mais...

CREDO PASCAL

por Dom Pedro José Conti Bispo da Diocese de MacapáCreio em Deus libertador de todo o que oprime.Creio em Jesus Cristo, irmão nosso,solidário com os sofredores.Creio no vento do Amor,Espírito que transforma homens e mulheresem artistas do Reino.Creio na comunhão dos...

“ENTÃO TODOS O ABANDONARAM E FUGIRAM” (Mc 14,50)

por Dom Pedro José Conti Bispo da Diocese de MacapáChegamos à semana central do Ano Litúrgico e decisiva para a nossa fé. Se nos dias que precedem o Natal somos distraídos pelas compras e a correria de final de ano, a Semana Santa pode passar despercebida simplesmente...

COM SÃO JOSÉ PROCURAMOS JESUS, PARA ENCONTRA-LO NOS IRMÃOS E IRMÃS

por Dom Pedro José Conti Bispo da Diocese de MacapáNa próxima terça feira, após o Quinto Domingo da Quaresma, celebraremos a Festa de S. José, o padroeiro escolhido para Macapá e para toda a nossa Diocese. Além do tema da Campanha da Fraternidade deste ano...

ESTE HOMEM CONHECE O PASTOR

por Dom Pedro José Conti Bispo da Diocese de MacapáAo final de um jantar em um castelo inglês, um famoso ator entretinha os hóspedes declamando textos de Shakespeare. Disse que, a pedido, estava disposto a declamar outro textos. Um tímido padre que estava lá sugeriu...

O REFLEXO

por Dom Pedro José Conti Bispo da Diocese de MacapáUma mulher foi até a fonte do seu vilarejo. Era um pequeno espelho de água limpa e tinha arvores ao redor. Quando ela colocou o seu pote para pegar a água, viu um fruto colorido que parecia dizer para ela: - Me pegue!...

QUARESMA E CAMPANHA DA FRATERNNIDADE 2

por Dom Pedro José Conti Bispo da Diocese de MacapáA página evangélica da Transfiguração do Senhor (Mc 9,2-8), que encontramos no Segundo Domingo da Quaresma, está bem no centro do escrito de Marcos. Além do acontecimento extraordinário deixamo-nos conduzir pela...

NUNCA VAI SE ARREPENDER

por Dom Pedro José Conti Bispo da Diocese de Macapá“Você nunca vai se arrepender de fazer o melhor possível, ser gentil com todos, escutar antes de julgar, refletir antes de falar, fechar os ouvidos às fofocas, ser fiel aos seus princípios, ser bondoso com os...

BOMBEIRO DE VERDADE

por Dom Pedro José Conti Bispo da Diocese de Macapá- A doença de seu filho não tem cura. Não há mais nada a ser feito. Disse o médico à mãe do menino. Ela sabia das condições do seu filho. Por isso aproximando-se dele, lhe perguntou qual era o seu maior sonho. Ele...

NÃO É FÁCIL

Artigo Semanal de Dom Pedro José Conti, Bispo da Diocese de Macapá.

OS TRÊS BEIJOS

Artigo Semanal de Dom Pedro José Conti, bispo da Diocese de Macapá.

OS DOIS BURRINHOS

Artigo Semanal de Dom Pedro José Conti, bispo da Diocese de Macapá.

FALAR À TOA

Artigo semanal de Dom Pedro José Conti, Bispo da Diocese de Macapá

O TREM SILENCIOSO

Artigo semanal de Dom Pedro José Conti, Bispo da Diocese de Macapá

O NOVO MISSAL

Artigo Semanal de Dom Pedro José Conti, Bispo da Diocese de Macapá.