OS DOIS BURRINHOS

por Dom Pedro José Conti

Bispo da Diocese de Macapá

No dia de Natal também dois burrinhos chegaram à gruta de Belém. Estavam magros e cansados. As suas costas estavam feridas por causa dos duros golpes de bastão e dos pesados sacos de farinha de trigo que o patrão os obrigava a carregar todo dia. Tinham ouvido os pastores falarem da chegada do Rei dos Reis e eles também se animaram e correram para lá. Ficaram um momento a contemplar a Criança recém-nascida. A adoraram e fizeram orações como todos. Quando saíram, o terrível patrão estava à espera deles. Partiram de volta cada um com a sua carga pesada na garupa. – Não serve para nada – disse um deles – Rezei ao Messias que me tirasse o peso das costas, mas ele não o fez. – Eu, ao contrário, – respondeu o outro, trotando com certo vigor – lhe pedi que me desse a força para carregá-lo.

Estamos acostumados, neste tempo de Natal, a nos desejar paz e alegria uns aos outros. Todos caprichamos em encontrar as palavras mais bonitas para expressar os sentimentos mais altos e valiosos. É muito bom, porque, ao menos por alguns dias, todos concordamos que a nossa convivência humana poderia ser melhor. Devemos aproveitar bem destes momentos, para que o Natal não se transforme numa formalidade quase obrigatória de cumprimentos e troca de presentes. Cabe a cada um de nós ser sinceros e honestos com nós mesmos e com os demais. Temos a oportunidade de pedir desculpa se fizemos algo errado e ofendemos alguém. Podemos abraçar de novo quem nos virou as costas ou nós mesmos excluímos das nossas conversas. É sempre possível lembrar momentos bons e esquecer para sempre situações constrangedoras.

É Natal e com o Menino Jesus que nasce tudo parece recomeçar. Cabe a cada um de nós decidir o que será diferente ou se, muito em breve, tudo voltará como antes. Retomaremos a nossa rotina de família, de trabalho, de luta pela sobrevivência, de disputas pelo poder, de espertezas para derrubar os outros e afirmar as nossas pequenas superioridades. Cabe a nós mudarmos as coisas, as relações e os sentimentos. Foi isso que Jesus veio nos ensinar. Não resolveu todos os problemas, não quis nos obrigar a sermos bons se não queremos, mas ele começou algo novo, tão diferente que foram poucos o que o compreenderam. Quando curava aos sábados, as autoridades o acusavam de colocar o ser humano doente e excluído no lugar de Deus. Quando perdoava os pecados em nome de um Pai misericordioso e convidava a mudar de vida, foi considerado perigoso porque acabava com o medo do castigo de Deus. Quando proclamava felizes os pequenos e os pobres e convidava a olhar a beleza das flores dos campos, foi chamado de louco e sonhador. Foi crucificado porque anunciava um Reino de Amor que não cabia em nenhum esquema, em nenhuma ideologia e nem na religião do Templo. Mas ele começou. Foi algo novo que continua sempre novo ainda hoje. É o novo que incomoda, que mexe na nossa indiferença, no nosso comodismo e bem-estar, no nosso bom-senso, equilíbrio e prudência. Jesus foi exagerado em tudo, na pobreza, no amor até o fim, no perdão a quem o matava. Ele só começou, cabe a nós cristãos continuarmos a missão dele. Ainda esperamos que seja ele a resolver os problemas que nós criamos, a acabar com as guerras que nós iniciamos, a refazer o jardim da criação que nós destruímos. Rezamos muito para que ele faça o que nós não temos coragem ou vontade de fazer. Reclamamos e achamos que Deus deveria intervir. Ele já veio e nos mostrou que é possível fazer diferente, que é sempre possível recomeçar, na humildade, no reconhecer que precisamos de ajuda, de luz, de esperança, que precisamos de um Deus mais humano que caminhe conosco e nós prontos a seguir os seus passos. Agora a responsabilidade é nossa. É o peso da história que a humanidade está escrevendo, mas não estamos sozinhos, não estamos sem rumo, sem projeto, sem fé. Neste Natal pedimos ao Menino Jesus a força de fazer a nossa parte, de colaborar com a nossa carga de amor e de paz. Sem desistir. Será difícil, mas não impossível. Feliz Natal para todos e todas!

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