VII JORNADA MUNDIAL DOS POBRES: «Nunca afastes de algum pobre o teu olhar» (Tb 4,7)

por Dom Antônio de Assis Ribeiro

Bispo Auxiliar na Arquidiocese de Belém do Pará

Neste ano 2023, a Igreja celebra a VII Jornada Mundial dos Pobres. É sempre uma ocasião oportuna para a nossa reflexão sobre a dignidade humana e a promoção da cultura da solidariedade. Cada ano o Papa Francisco nos apresenta um tema para ser aprofundado trazendo em sua mensagem muitas inspirações e estímulos para a ação concreta em nossas comunidades, paróquias e instituições nos mais variados contextos pastorais e institucionais. O tema deste ano nos convida a refletir sobre o mal da indiferença. Recordemos, sinteticamente, as ideias principais desta mensagem.

  1. A celebração do Dia Mundial dos Pobres é sinal fecundo da misericórdia do Pai na vida das comunidades que progressivamente está se radiando na vida pastoral da Igreja, fazendo-a descobrir cada vez mais o conteúdo central do Evangelho. O compromisso de acolhimento dos pobres é o ponto de partida. A recomendação de Tobite a seu filho Tobias “Nunca afastes de algum pobre o teu olhar» (Tb 4,7) serve também para a Igreja.
  2. Essa frase está dentro de um contexto familiar. O velho Tobite, sabendo que seu filho empreenderia uma longa viagem, temendo não mais vê-lo, deixa-lhe o seu «testamento espiritual». Essas palavras são confirmadas pelo testemunho de fé, sensibilidade e bondade de Tobite. Tobias é convidado, não só a não ser indiferente, mas também a praticar boas obras, promover a justiça, dar esmolas conforme suas posses, evitar todos os dias os caminhos da injustiça (cf. Tb 4,5-7).
  3. O Papa Francisco nos convida a alimentar a nossa vida espiritual para que sejamos sensíveis e capazes de promover a justiça com gestos concretos. Na base de tudo está a importância da família que educa e testemunha a solidariedade. Pais sensíveis e solidários educam seus filhos para a compaixão. A fonte da força da coragem, perseverança e sensibilidade para com o próximo, por parte de Tobite, estava na sua fidelidade à Lei de Deus. A Palavra de Deus nos educa a “ir ao encontro de todo o pobre e de todo o tipo de pobreza, sacudindo de nós mesmos a indiferença e a naturalidade com que defendemos um bem-estar ilusório”.
  4. “Vivemos um momento histórico que não favorece a atenção aos mais pobres”. Hoje, imersos no meio de um mundo com tanta dispersão e barulho, somos tentados a não ouvir e nem perceber os clamores dos pobres e das muitas formas de pobreza.  “A realidade virtual sobrepõe-se à vida real”; a pressa, companheira diária da vida, impede de parar, socorrer e cuidar do outro. Assim, acabamos por delegar a outros a tarefa da solidariedade; mas “oferecer dinheiro para que outros pratiquem a caridade é um gesto generoso; envolver-se pessoalmente é a vocação de todo o cristão”.
  5. Todavia, demos graças a Deus, porque há tantos homens e mulheres que vivem a dedicação aos pobres e excluídos e partilha com eles; pessoas de todas as idades e condições sociais que praticam a hospitalidade e se empenham junto daqueles que se encontram em situações de marginalização e sofrimento. São pessoas simples, sensíveis aos mais pobres, mas capazes de acolher, escutar, dialogar, compreender, aconselhar estimulando processos de mudança.
  6. Neste ano celebramos os 60º anos da Encíclica Pacem in terris, é urgente retomar as palavras do Santo Papa João XXIII quando escrevia: «O ser humano tem direito à existência, à integridade física, aos recursos correspondentes a um digno padrão de vida: tais são especialmente a nutrição, o vestuário, a moradia, o repouso, a assistência sanitária, os serviços sociais indispensáveis; a pessoa tem também o direito de ser amparada em caso de doença, de invalidez, de viuvez, de velhice, de desemprego forçado, e em qualquer outro caso de privação dos meios de sustento por circunstâncias independentes da sua vontade» (PT, 11).
  7. Constatamos, infelizmente, ainda hoje muitas formas de pobreza. Por exemplo, as populações que vivem em cenários de guerra, as crianças privadas dum presente sereno e dum futuro digno, a desordem ética no mundo do trabalho.
  8. Outros males, atingem o mundo juvenil. “Quantas vidas frustradas e até suicídios de jovens, iludidos por uma cultura que os leva a sentirem-se «inacabados» e «falidos». Ajudemo-los a reagir… É fácil cair na retórica estatística quando se fala dos pobres; mas os pobres são pessoas, têm rosto, uma história, coração e alma. “São irmãos e irmãs com os seus valores e defeitos, como todos, e é importante estabelecer uma relação pessoal com cada um deles. O Livro de Tobias ensina-nos a ser concretos no nosso agir com e pelos pobres”.
  9. “Que a nossa solicitude pelos pobres seja sempre marcada pelo realismo evangélico”. Para isso é preciso: coração aberto, atenção às necessidades concretas do outro, “discernimento, sob a guia do Espírito Santo, para distinguir as verdadeiras exigências dos irmãos do que constitui as nossas aspirações”. «Somos chamados a descobrir Cristo neles” (Evangelii Gaudium, 198).
  10. Este ano completam-se 150 anos do nascimento de Santa Teresa do Menino Jesus. Numa página da sua “História de uma alma”, deixou escrito: «Compreendo agora que a caridade perfeita consiste em suportar os defeitos dos outros, em não se escandalizar com as suas fraquezas, em edificar-se com os mais pequenos atos de virtude que se lhes vir praticar; mas compreendi, sobretudo, que a caridade não deve ficar encerrada no fundo do coração” (Manuscrito C, 12rº: História de uma alma, Avessadas 2005, 255-256). Nesta casa comum, o mundo, todos têm direito de serem iluminados pela caridade, ninguém pode ser privado dela.

PARA A REFLEXÃO PESSOAL:

  1. Como você percebe a “cultura da indiferença” em nossa sociedade?
  2. Qual é a importância da família para a promoção da cultura da solidariedade?
  3. Por que tantas vezes, nos desculpamos de fazer algo pelos mais pobres, apelando para nossa falta de dinheiro? E por que muitos pobres se dedicam ao voluntariado?

Artigos Anteriores

ENCONTRO DE GERAÇÕES: III DIA MUNDIAL DOS AVÓS E DOS IDOSOS

Dom Antonio de Assis Ribeiro, SDB Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém  Introdução O IV Domingo de julho foi instituído pelo papa Francisco como o Dia Mundial dos Avós e dos Idosos, motivado pela celebração do dia de Sant’Ana e São Joaquim, os avós de Jesus, no dia...

A CATEQUESE E A DOUTRINA SOCIAL DA IGREJA (Parte 1)

Dom Antonio de Assis Ribeiro, SDB Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém Não são poucos os párocos que acusam o afastamento dos jovens logo após a crisma. Parece que a celebração da crisma é uma meta a ser alcançada e, daí basta, entra-se em férias da Igreja. Há um...

“MARIA LEVANTOU-SE E PARTIU APRESSADAMENTE”

Dom Antonio de Assis Ribeiro, SDB Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém A Jornada Mundial da Juventude (JMJ) deste ano vai acontecer em Lisboa de 01-06 de agosto. Milhões de jovens de diversas religiões, mas sobretudo católicos, estarão reunidos durante uma semana...

A LIDERANÇA DO BOM PASTOR (final)

Dom Antonio de Assis Ribeiro, SDB Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém Introdução Na Bíblia há uma abundância de referências ao líder como pastor do seu rebanho. Eram considerados pastores todos aqueles que tinham responsabilidades sobre os outros, de modo...

A ESPIRITUALIDADE DO CORAÇÃO

Dom Antonio de Assis Ribeiro, SDB Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém É costume no mês de junho na Igreja Católica, se fazer uma especial memória do Sagrado Coração de Jesus e do Imaculado Coração de Maria. Vivendo numa cultura muito marcada pela insensibilidade,...

O ESTILO DE LIDERANÇA DE JESUS CRISTO (Parte 19)

Dom Antonio de Assis Ribeiro, SDB Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém Continuemos nossa reflexão sobre o estilo da liderança de Jesus. Na próxima edição concluiremos esta série de textos com a parábola do Bom Pastor. Jesus Cristo é o líder por excelência. Por...

O ESTILO DA LIDERANÇA DE JESUS CRISTO (Parte 18)

Dom Antonio de Assis Ribeiro, SDB Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém Introdução É clássica a afirmação que diz que Jesus é modelo de todos os líderes; que Jesus é o líder perfeito; que Jesus é o mestre da liderança; que Jesus é referência na arte de liderar...

A DIMENSÃO PASTORAL DAS FESTAS JUNINAS

Dom Antonio de Assis Ribeiro Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém  Introdução O mês de junho, de norte a sul do Brasil, é caracterizado pelas festas folclóricas, mas com uma forte roupagem religiosa. Por isso, nas aglomerações festivas de rua e nas instituições...

A LIDERANÇA NO TESTAMENTO ÉTICO-PASTORAL DE SÃO PAULO (Parte 17)

Dom Antonio de Assis Ribeiro, SDB Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém  Introdução Antes de concluir esta série de reflexões sobre liderança pastoral, quero lhe convidar a fazer uma leitura orante do testamento ético e pastoral de Paulo. Esse texto se encontra em...

AMOR E VERDADE NA COMUNICAÇÃO

Dom Antonio de Assis Ribeiro Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém Todos os anos a Igreja Católica dedica uma jornada de reflexão sobre as Comunicações Sociais que acontece no IV domingo do mês de maio, e tem um tema específico cada ano comentado numa mensagem do...

PECADOS CAPITAIS DA LIDERANÇA (Parte 16)

Dom Antonio de Assis Ribeiro, SDB Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém Introdução Há vícios que inviabilizam plenamente a possibilidade de uma liderança efetiva e eficaz, tornando-a estéril, amarga, opressora, injusta e assim o líder, às claras se torna “persona...

LÍDER: SEMEADOR DE ESPERANÇA E OTIMISMO (Parte 15)

Dom Antonio de Assis Ribeiro, SDB Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém LÍDER: SEMEADOR DE ESPERANÇA E OTIMISMO (Parte 15) Introdução: O autêntico líder não é aquele que simplesmente manda, mas sobretudo, é quem alimenta esperança e nutre o otimismo nos seus...

LIDERANÇA E SENSIBILIDADE HISTÓRICA (Parte 14)

Dom Antonio de Assis Ribeiro, SDB Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém Introdução Em muitas ocasiões tenho encontrado, em diversos contextos pastorais, líderes messiânicos, aqueles que manifestam através de suas atitudes que chegaram ilusoriamente para resolver...

ZILDA ARNS: HEROÍNA DA PÁTRIA

Dom Antônio de Assis Ribeiro, SDB Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém   No dia 20 de abril foi divulgado que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a Lei 14.552, que colocou o nome da Dra. Zilda Arns Neumann, médica pediatra, sanitarista e fundadora...

LIDERANÇA E ESPIRITUALIDADE (Parte 12)

Dom Antônio de Assis Ribeiro, SDB Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém Introdução A exigente missão de liderança proporciona, muitas vezes ao líder, o enfrentamento de sérios desafios e problemas. Se ele não tiver uma forte estrutura espiritual, nessas...

 TERNURA E FIRMEZA NA LIDERANÇA (Parte 11)

Dom Antônio de Assis Ribeiro Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém Introdução “O bom pastor dá a vida por suas ovelhas. O mercenário, que não é pastor, a quem não pertencem as ovelhas, quando vê o lobo chegar, abandona as ovelhas e sai correndo. Então o lobo ataca e...

A LIDERANÇA ÉTICA (Parte 10)

por Dom Antônio de Assis Ribeiro Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém Introdução Uma das mais importantes exigências que recai sobre um líder é aquela que diz respeito a sua dimensão ética. Quando Jesus disse aos seus apóstolos: “entre vocês, não deve ser assim....

APROFUNDAMENTO DO SENTIDO DA CELEBRAÇÃO DA PÁSCOA

Dom Antônio de Assis Ribeiro Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém Na Bíblia a Páscoa aparece pela primeira vez no capítulo doze do livro do Êxodo, dentro do contexto de vida nova, como memória da libertação da escravidão no Egito (cf. Êxodo 1-3). A Páscoa judaica...

LIDERANÇA, INQUIETUDE E VISÃO EMPREENDEDORA (Parte 9)

Dom Antônio de Assis Ribeiro Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém Introdução O líder tem a missão de cuidar das pessoas, estimulá-las, animá-las, promovê-las, envolvê-las, corresponsabilizá-las na missão fomentando a busca de respostas a desafios e problemas....

LIDERANÇA e SINODALIDADE (Parte 8)

Dom Antônio de Assis Ribeiro Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém Introdução Os líderes da Igreja, em todos os níveis, têm como missão comum a promoção do Reino de Deus. A missão de evangelizar da Igreja tem como meta essa única finalidade; portanto, todos os...